O Culto do Chá

O chá é uma bebida com tradição milenar no Oriente, que é atualmente a segunda mais consumida em todo o mundo, logo a seguir à água. A forma como o chá é preparado e degustado difere muito de local para local, em muitos casos refletindo as tradições e os princípios que informam a cultura dos respetivos povos, como sucede no Oriente, em que o ritual do chá assume um significado mais profundo.

O universo do chá tem-se refinado também no Ocidente, um pouco por toda a parte, e é, atualmente, objeto de interesse de connoisseurs, sendo escolhido, servido e apreciado com perícia e detalhe semelhantes aos que se usam na degustação do vinho. Muitos hotéis de luxo, restaurantes com estrelas Michelin e sofisticados bares vêm surpreendendo a clientela com os mais requintados chás, servidos com a atenção e o cuidado que o sommelier coloca nos vinhos.

Para além do chá propriamente dito, que é uma infusão de folhas ou outras partes da planta camellia sinensis, também outras plantas, flores e frutos proporcionam infusões e tisanas aromáticas, que são apreciadas quer pelas suas propriedades benéficas para a saúde quer pelo seu paladar.

Percorrendo sete cidades em diferentes partes do mundo, registamos umas breves notas sobre as melhores experiências que uma chávena de chá pode proporcionar.

1. Xangai

Mesmo para quem não aprecie particularmente beber chá, a visita a uma tradicional casa de chá chinesa, mais que uma atração turística, é uma experiência quase antropológica sobre a cultura local.

O sítio mais icónico é a Huxinting, em Xangai. É a mais famosa e antiga casa de chá chinesa, no coração da cidade velha de Xangai. O tradicional edifício remonta à Dinastia Ming (1368-1644) e foi transformado em casa de chá em 1855, sendo o acesso feito através de uma ponte em ziguezague sobre o lago que o rodeia, por forma a, supostamente, prevenir a travessia dos espíritos maléficos. A degustação das diferentes variedades de chá, com diferentes aromas e indicações terapêuticas, é acompanhada com ovos de codorniz, doces de gengibre e mini-dumplings.

2. Tóquio

Originário da China, o chá foi introduzido no Japão, no século VIII. A cerimónia do chá – chanoyu – assume uma importância fulcral na cultura tradicional japonesa e caracteriza-se por servir e beber o matcha, um chá verde pulverizado, cuja degustação foi aí introduzida no final do século XII pelos monges budistas. A chanoyu envolve a apreciação do local onde a cerimónia é realizada, o jardim a ele contíguo, os utensílios utilizados para servir o chá e a decoração do ambiente com arranjos florais.

Há muitas maneiras de realizar uma cerimónia de chá: de acordo com a escola a que o anfitrião pertence e em conformidade com a ocasião e a estação, podendo assumir um caráter mais simples ou mais formal, prolongando-se por quatro horas e incluindo já uma refeição.

Em Tóquio, o melhor sítio para experimentar uma cerimónia do chá é nas tradicionais casas de chá – chashitsu – que se encontram nos jardins do Hotel Chinzanso Tokyo, algumas das quais registadas como património cultural intangível.

Outra experiência agradável, menos cerimoniosa, é tomar um chá, acompanhado dos tradicionais doces de feijão – wagashi – na casa de chá Kosoan, uma casa familiar rodeada por um belíssimo jardim, onde o proprietário reside.

3. Londres

O “Afternoon Tea” é uma tradição em Inglaterra, apreciada quer pelos locais quer pelos visitantes e é impensável ir a Londres, sem tomar uma chávena de chá.

Os menus tradicionais consistem geralmente numa seleção de chás como Darjeeling, Assam, Ceilão ou Early Grey, servidos com leite ou uma rodela de limão, acompanhados de pequenos snacks, mini-sanduíches, scones e pastelaria, e até mesmo um taça de champagne.

Uma vez por dia, seis chás servidos apenas para seis pessoas…

O clássico Hotel Ritz vem servindo uma média de 400 chás da tarde e, para além desta tradicional oferta, lançou recentemente o Epicurean Afternoon Tea, proporcionando aos cliente o prazer de degustar seis chás raros e espetaculares, acompanhados de uma seleção de pequenas sandwiches, scones e fina pastelaria. Esta experiência de três horas é apenas servida uma vez ao dia, para não mais de seis pessoas, com toda a etiqueta britânica, na mais fina porcelana e luxuosas pratas, exigindo-se dress code formal àqueles que, ao som do piano, quiserem desfrutar destes prazeres.

Outras excelentes experiências, ainda que menos exclusivas, são oferecidas no Palm Court, localizado no Langham Hotel, no foyer do Hotel Claridges, no The Georgian Restaurant, muito oportuno para quem ande às compras no Harrods, ou até no histórico edifício da St Paul’s Cathedral.

4. Paris

Em Paris, a referência incontornável é a Mariage Frères, uma casa de chá fundada em 1854, que tem um museu no piso superior, refletindo toda a história da origem do chá.

Além disso, tem ainda uma loja com os produtos da marca. Algumas das especialidades exclusivas desta casa são o Marco Polo, uma mistura de chá preto e especiarias, e o delicioso bolo de chá verde.

5. Nova York

Tomar um chá da tarde no Alice’s Tea Cup é como mergulhar no maravilhoso mundo de Alice no País das Maravilhas. Nenhuma outra casa de chá poderá ser mais encantadora para as crianças, que aqui encontram recriado o ambiente mágico dos contos de fadas, através da decoração, da loiça, dos bules e dos restantes acessórios. A marca conta já com três filiais – Chapter I, Chapter II, Chapter III – denominação que reflete a sua inspiração literária. A decoração interior é diferente em cada uma delas, mas em todas está presente a referência às cenas do livro e do filme. Os menus são muito semelhantes e incluem, além de uma extensa lista de deliciosos chás, muitas guloseimas, bolos, sanduíches e pratos principais.

Curiosamente, em Portugal encontram-se algumas das casas de chá mais apreciadas em todo o mudo. O que não é de admirar, face à nossa longa ligação ao Oriente e que explica também que tenha sido a Infanta Portuguesa D. Catarina de Bragança, Rainha de Inglaterra, quem introduziu tal hábito na Grã-Bretanha.

6. Porto

No Edifício Artes em Partes, sito no Porto, na Rua Miguel Bombarda, porta com porta com a maioria das galerias de arte da cidade, a Rota do Chá é uma referência incontornável para os amantes desta bebida, que conta já com largos anos e uma clientela fiel. Pode aqui degustar uma vasta gama de requintados chás e outras tantas infusões, no ambiente zen do interior ou no belíssimo jardim onde mesmo nos dias mais frios é bom relaxar com uma manta e terminar com uma passagem pela loja que tem uma vastíssima oferta de várias origens.

Outro espaço a salientar é a Mùi Concept, da vietnamita Thuy Tien, sito no Centro Comercial Miguel Bombard. Nesta loja loja encontram-se chás de todas as partes do mundo e todo o tipo de artigos associados à cultura e ao ritual do chá, nomeadamente vestuário, adornos e acessórios como bules e copos.

Ainda no Porto, na zona do Aviz, para quem aprecia uma atmosfera clássica, a referência tradicional é o Chá Clube, onde o chá é servido em bules de prata, acompanhado de scones caseiros fumegantes, num registo intimista de inspiração inglesa.

7. Lisboa

Em Lisboa, a encantadora Ó-Chá Tea Room reflecte a paixão das duas sócias, mãe e filha que viveram em Macau, pelo Oriente.

Nesta casa de chá com decoração oriental, poderá desfrutar e adquirir de 72 variedades de chá, branco, verde, amarelo, preto, oolong, roibos e tisanas, acompanhadas de deliciosos scones, bolos caseiros e pão de especiarias.

Mas quem quiser descobrir um pouco mais sobre o chá tem mesmo que visitar a Companhia Portugueza do Chá em Lisboa que é uma marca que se dedica à importação dos mais finos chás e à preparação dos seus próprios blends e que está, sem sombra de dúvida, entre as melhores teashops da Europa.

Em plena Baixa de Lisboa, esta loja presta homenagem a D. Catarina de Bragança, retratada na imagem da marca que seleciona os mais finos chás de todas as origens Índia, Japão, China, Formosa, Ceilão, África, Darjeeling, Vietnam, Coreia, sem esquecer os Açores, entre as mais de 120 referências que oferece.

A loja foi fundada em Dezembro de 2014 por um argentino, Sebastian Filgueiras, que para o efeito fez formação de tea sommelier e de tea blending, tendo já criando um blend à imagem da cidade: o Lisbon Breakfast, que é dos mais procurados.

Sem data marcada está a realização de um outro sonho deste argentino que se instalou em Lisboa, há 16 anos atrás: abrir um salão de chá que promete uma odisseia aos sabores dos mais requintados chás do mundo.

Não só à tarde é apreciado… E alguns preferem-no gelado

Uma última nota interessante é a de que o chá já não está confinado à tarde e é servido com todo o requinte, a par das ementas mais gourmets. São muito os restaurantes que têm uma selecionada carta de refinados e raros chás, como sucede com o Fera, no Hotel Claridge’s, ou o Noma, em Sidney, onde os estrelados Chefes procuraram elevar o standard das bebidas, designadamente dos chás e infusões ao da comida.

O mesmo sucede no Louis XV, em Monte Carlo, onde o prestigiado Alain Ducasse oferece uma refinada seleção de chás e também uma variedade de infusões de diferentes espécies aromáticas, que chegam à mesa num jardim ambulante e no momento são colhidas para o efeito.