Tancos passou a ser um problema de regime

Basta a dúvida lançada sob juramento para o ministro ter que ir a tribunal. Mas se Azeredo soube, é possível acreditar que ele não avisou o primeiro-ministro? E Costa, poderia não ter avisado Marcelo?

Tancos foi um crime contra o Estado, porque foi ao Estado que roubaram armas. Depois descobrimos que Tancos foi um duplo crime contra o Estado, porque houve agentes militares envolvidos, pelo menos, na recuperação das armas, feita em segredo e numa luta de militares contra a PJ. Agora há uma denúncia de que foi um triplo crime contra o Estado, com o ministro da Defesa a ser informado do encobrimento por um major envolvido no esquema. O ministro rejeita, o primeiro-ministro segura-o. Mas a dúvida que se lança é de uma gravidade extrema.

Esta é uma denúncia muito grave porque é um depoimento em tribunal, sob juramento, feito com detalhe e envolvendo terceiros: o que Vasco Brazão diz é que entregou “um memorando com a explicação de toda a operação ao chefe de gabinete de Azeredo Lopes, acrescentando que o chefe de gabinete contactou telefonicamente o ministro, à frente dos dois militares da PJM, para o informar da situação”. De acordo com o depoimento, revelado pelo Expresso, o chefe de gabinete e o ministro “não teceram comentários sobre aquela informação nova, limitando-se a registar o caso”.

Basta este testemunho para que o tribunal tenha que chamar o ministro, pelo menos na condição de testemunha – mas seguramente já sob suspeita. E um ministro sob suspeita de um tribunal é, evidentemente, um ministro sob suspeita política. E pergunto eu: um ministro sob suspeita pode ficar no Governo?

Mas a mera dúvida obriga-nos a levantar outras dúvidas: se o ministro da Defesa foi avisado, é possível acreditar que ele não avisou o primeiro-ministro? E se o primeiro-ministro foi avisado, tratando-se de um crime contra o Estado cometido por agentes do Estado, ele podia não avisar o Presidente da República (que é responsável máximo pelas Forças Armadas)?

É por tudo isto que o Ministério Público tem em mãos, agora, muito mais do que a investigação e julgamento de um crime contra o Estado. Tem em mãos um verdadeiro problema de regime, que não pode ficar sem respostas.

P.S. 2: O ministro Azeredo Lopes diz que não “fala pelo chefe de gabinete”, que ainda no ano passado deixou o cargo. Esse chefe de gabinete, um general, foi indicado pelo Exército para adjunto do Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas para a área do Planeamento e Coordenação. Ficou, portanto, em casa.

P.S. 1: Face a tudo isto, dá calafrios lembrar o que disse esta semana o chefe de Estado Maior do Exército, que estava em funções aquando do roubo e ainda lá permanece, com a bênção do Governo e de Marcelo: “Estou tranquilo”. E nós, estaremos?

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