O que querem os jotas dos partidos para o Orçamento?
Se alguns não quebram o discurso dos mais experientes, outros arriscam. A Juventude Socialista (JS), por exemplo, é contra os salários da CGD. O ECO ouviu as juventudes dos partidos do Parlamento.
Terminou esta sexta-feira o prazo para a entrega de propostas do Orçamento do Estado para 2017. Com os partidos a afinar as investidas, o ECO foi perceber o que pensam as estruturas mais jovens. E, se alguns não quebram o discurso dos mais experientes, outros arriscam. A Juventude Socialista (JS), por exemplo, é contra os salários da CGD.
O apoio ao Partido Socialista não invalida que existam diferenças em relação à Juventude Socialista. Quem o diz é o atual líder, referindo a polémica que assombra a atual administração da Caixa Geral de Depósitos: “Haverá certamente uma base justificativa razoável para que o vencimento de António Domingues seja aquilo que foi anunciado. Mas a JS discorda desse valor”, argumenta João Torres ao ECO.
A proposta da Juventude Socialista não foi essa e por isso “não a abandonam”, garante. A proposta em questão foi apresentada pela JS no último Congresso do partido e fixa um limite proporcional entre o salário mais elevado e mais baixo dentro de uma entidade ou organização.
Mas não foi a única proposta polémica: a problemática do trabalho sexual e a regulação do consumo e produção de cannabis mereceram também a ação dos socialistas mais jovens.”Costumo dizer que a JS vai um passo à frente. Somos uma força progressista e de esquerda”, afirma João Torres, defendendo que essa é a sua obrigação histórica.
Costumo dizer que a JS vai um passo à frente. Somos uma força progressista e de esquerda.
A Juventude Socialista “tem a sua própria autonomia quer quando se discute o Orçamento do Estado ou toma posições públicas”, explica o atual líder ao ECO. João Torres esclarece que isso não significa que são “uma força da oposição”.
Com a progressiva dependência financeira e económica que a política sofre, o Orçamento do Estado para 2017 é o instrumento que fixa as orientações para o próximo ano, onde se inclui a recapitalização da CGD. Apesar dessa ser uma preocupação, as juventudes partidárias vão a reboque das preocupações dos mais jovens, nomeadamente as duas mais urgentes: o desemprego jovem e o acesso ao Ensino Superior.
Desemprego jovem vira à esquerda: estágios profissionais não são solução
Os números não deixam margem para dúvidas. Entre os jovens (15 a 24 anos), a taxa de desemprego caiu de 27,2% em julho para 26,7% em agosto. Para setembro, projeta-se novo recuo para 26,5%. No total da população a taxa de desemprego ronda os 11%. É, por isso, um tema incontornável. Para o próximo ano, o OE2017 prevê um desinvestimento nos estágios do IEFP, uma política apoiada pela esquerda mas que pode parecer contraditória.
João Torres admite que “haverá de facto uma diminuição dos recursos do Estado e do país para combater o desemprego jovem”. Mas há uma razão invocada pelo também deputado socialista para isso acontecer: “O anterior Governo gastou dois terços dos fundos comunitários que tinha à sua disposição entre 2014 e 2020 unicamente nos anos de 2014 e 2015. Isso manifesta uma atitude de enorme irresponsabilidade por parte do anterior Governo para o futuro de Portugal”, ataca.
Qual é a solução? Combater o desemprego jovem e a precariedade ao mesmo tempo. “Temos de passar de um paradigma em que o Governo apoia sem critério para outro onde os estágios profissionais têm um papel mais esclarecido na sociedade portuguesa e em que o Estado majora os benefícios para as empresas que realmente contratam”, considera o líder da Juventude Socialista.
O debate decorre na concertação social, mas também nos grupos de trabalho criados entre o PS e BE. Mas, para João Torres as propostas futuras devem estabelecer um conjunto de critérios que beneficie, por exemplo, PME.
Estágio profissionais une geringonça jovem
O ataque ao Governo de Passos Coelho e à política relativa aos estágios profissionais une Juventude Socialista, Juventude Comunista Portuguesa (JCP), os Jovens do Bloco e a Ecolojovem (juventude dos Verdes). “Os estágios profissionais eram uma forma de escamotear os dados do desemprego”, argumenta Duarte Alves, um dos membros da direção coletiva da JCP, que não tem presidente ou secretário-geral. O mestre em Economia e Políticas Públicas, de 25 anos, refere que “os jovens desempregados estão fartos de estágios. Nunca são integrados nas empresas”.
A solução passa por uma maior fiscalização que lute contra um “conjunto de práticas que se instalaram nas relações laborais que levam ao desemprego”, além de condições melhores de contratação coletiva, um bastião do PCP. E como se cria mais emprego para os jovens comunistas? “Para isso é necessário investimento público e medidas de aposta na produção nacional, mas são precisos instrumentos para que não continue a destruição do aparelho produtivo”, considera Duarte Alves.
Os jovens desempregados estão fartos de estágios. Nunca são integrados nas empresas.
A estrutura de jovens dos Verdes, a Ecolojovem, também sem líder, segue o mesmo argumento: “Apesar de haver mais licenciados, o desemprego jovem nunca foi tão grande. Os estágios profissionais foram utilizados para mascarar os números do desemprego“, responde Ema Gomes, dirigente nacional da Ecolojovem. A estudante de Engenharia de Proteção Civil, de 24 anos, refere que a solução passa por deixar sair “quem já contribuiu mais de 40 anos para dar espaço aos jovens”. E que a proposta apresentada pelos Verdes de diminuir o IRC nas PME do interior “vai ao encontro do aumento de emprego, o que também está ligado aos jovens”.
O outro pilar do acordo de incidência parlamentar, o Bloco de Esquerda, faz inclusive parte do grupo de trabalho que está a elaborar o Plano Nacional Contra a Precariedade. Apesar de não se considerar uma juventude partidária, os Jovens do Bloco são a estrutura do BE dos mais novos do partido. Tal como na JCP não existe líder, mas sim uma Coordenadora Nacional de Jovens do Bloco de Esquerda com nove membros. Entre eles está Isabel Pires, atualmente deputada bloquista, que afirma que “uma parte do problema do desemprego jovem pode não passar pelo Estado“.
Licenciada em Ciências Política e Relações Internacionais, a bloquista de 26 anos defende que as propostas sobre o desemprego jovem e a precariedade “não têm necessariamente que entrar no Orçamento“, desvalorizando por isso a queda do financiamento aos estágios profissionais. A solução? “É preciso fazer alterações ao Código do Trabalho que favoreçam a contratação coletiva, o que ajuda bastante na segurança de quem entra de novo no mercado de trabalho. Em muitas situações é uma questão de se fazer cumprir o Código”, considera a deputada do grupo parlamentar do Bloco de Esquerda.
Desemprego jovem vira à direita: estágios profissionais resultaram
“Ataque cego, ideológico e de ódio às empresas do nosso pais”. É esta a classificação que o presidente da Juventude Social-Democrata faz ao corte da dotação orçamental para os estágios profissionais. Para Cristóvão Simão Ribeiro essa medida demonstra “a deriva radical deste Governo” e traduz-se num acumular no IEFP de candidaturas pendentes.
Este Governo “não quer saber das dificuldades dos jovens, só se importa com o facto de prejudicar as empresas”, critica o presidente do JSD, realçando a “visão comunista do problema”. “A JSD lutará sempre pelo emprego não precário. Mas a pior precariedade de todas é não ter emprego. Está provado com dados estatísticos que a política anterior beneficiou os jovens”, argumenta Cristóvão Simão Ribeiro.
Não quer saber das dificuldades dos jovens, só se importa com o facto de prejudicar as empresas. É uma visão comunista do problema.
Opinião semelhante tem o líder da Juventude Popular (JP) que defende que “grande parte destes estágios profissionais significavam uma verdadeira integração nos quadros” e que “a entrada no mercado de trabalho é essencial para os jovens se emanciparem de uma máquina estatal e terem a sua própria liberdade”. “Ao cortar, a experiência profissional será drasticamente reduzida e a via de entrada no mercado laboral”, defende Francisco Rodrigues dos Santos, realçando o “grande flagelo” que é o desemprego jovem.
No entanto, o centrista avisa que “o emprego não se gera por decreto”. “É necessário criar políticas que incentivem a iniciativa privada e o mercado livre e sobretudo o investimento para que se gerem postos de trabalho”, defende Francisco Rodrigues dos Santos. Apesar de reconhecer que a precariedade é um assunto mais vincado pelos partidos à esquerda, o trabalho temporário, recibos verdes e estágios não remunerados “são situações inadmissíveis” na sua opinião. “Não vale tudo na relação empregador-trabalhador. O mérito tem de ser o critério essencial. O liberalismo económico deve ter regras e valores”, defende o líder da JP.
Já o mais recente partido a ter assento parlamentar não tem uma estrutura específica para os mais jovens nem é unânime a definição: se mais à direita, se mais à esquerda. No entanto, Bebiana Cunha, uma das jovens dos quadros do partido, refere ao ECO que “o PAN considera mais benéfico o trabalho intergeracional, não havendo distinção etária e onde todos podem contribuir da mesma forma”. E quanto ao desemprego jovem, diz ser positivo a “aproximação das regras dos descontos para a Segurança Social entre os emissores de recibos verdes e os trabalhadores dependentes”.
“Seria muito positivo passar-se para uma menor carga horária laboral, permitindo assim a redistribuição do trabalho e um maior equilíbrio entre o trabalho, a família, o lazer, entre outras. Ademais, seria de se implementar um estudo piloto, ao nível do rendimento básico incondicional”, sinaliza Bebiana Cunha quanto às possíveis propostas que o PAN possa vir a apresentar no futuro.
A influência das juventudes nos partidos
À esquerda, se a Juventude Socialista é mais irreverente na sua posição independente do partido, os Jovens do Bloco, a Ecolojovem e a Juventude Comunista Portuguesa não menos flexíveis a alterar o discurso ensaiado pelo partido.
“A JCP tem muitas propostas que vêm também da nossa atividade diária junto da juventude. Temos momentos em que há essa discussão dentro do partido”, refere Duarte Alves ao ECO. Por sua vez, a Ecolojovem diz “estar sempre presente nas convenções”. “Como somos todos jovens é natural que as nossas propostas sejam para a juventude. Temos pessoas que estão a fazer a ponte entre o partido e a nossa juventude. Existem reuniões e avaliações”, explica a dirigente Ema Gomes.
Já Isabel Pires, BE, afirma que a ligação com o partido é feita através dos membros da Coordenadora Nacional que estão nos órgãos da comissão política do Bloco. É o caso da própria deputada e do deputado mais novo da Assembleia da República, Luís Monteiro. “Tentámos ao máximo fazer a ponte com a Coordenadora e os grupos de jovens que estão organizados no resto do país”, explica Isabel Pires.
Na oposição, Cristóvão Simão Ribeiro, também deputado, explica que a JSD pode apresentar “qualquer medida que entenda que seja necessária para a juventude portuguesa. Nunca foi vetada qualquer tipo de iniciativa”. Quanto às propostas concretas inscritas no Orçamento do Estado para 2017, o líder da Juventude Social-Democrata prefere atacar o global: “Não se trata de medidas avulsas. Toda a estratégia de orientação do OE está errada. Há uma devolução de rendimentos abrupta e artificial por causa dos acordos de governação”. Ou seja: “Mudaria tudo. Está errado dos pés à cabeça”, sentencia ao ECO.
A Juventude Popular não tem representação no grupo parlamentar do CDS, algo que quer mudar. “Infelizmente neste momento não temos nenhum deputado que seja militante da Juventude Popular, mas essa é uma situação que queremos que seja corrigida já na próxima legislatura. Entendemos que temos de ter uma voz no parlamento para veicular o nosso programa para que seja aprovado pela via legislativa”, considera Francisco Rodrigues dos Santos.
O líder da JP refere que, quanto ao OE2017, eliminaria o adicional ao IMI e a vontade do Governo de “taxar tudo o que mexe”. “É um OE sonâmbulo com base num cenário macroeconómico cor-de-rosa de Mário Centeno para o PS. Sem acordar para a realidade continua a mexer na economia de forma errada”, critica o centrista.
Mas Francisco Rodrigues dos Santos elenca propostas: “Uma linha de crédito público de financiamento das propinas do Ensino Superior complementado pelas bolsas de ação social; a dedução fiscal progressiva das despesas com educação, dar prioridade às bolsas de trabalho a jovens com menos rendimentos e criar uma dedução fiscal aos donativo de entidades privadas a instituições de ensino superior público ou a projetos de investigação”.
Editado por Mónica Silvares
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