Como não programar um investimento aeroportuário

Urge que o Governo emende a mão e avance para uma avaliação ambiental estratégica, com estudo de outras opções.

O aeroporto do Montijo arrisca-se tornar em mais um bom exemplo do que não fazer em políticas públicas. Sem esconder a urgência financeira da época, a perda de poder negocial neste assunto tão particular, que foi determinada pela fórmula encontrada para a concessão da ANA, tem sido agravada pelo comportamento do atual governo, demasiado aplicado a focar-se numa solução não comparada.

É um terrível sinal o que é dado pela assinatura de um qualquer acordo entre Estado e Vinci quanto ainda se espera o resultado do estudo de impacto ambiental que pode até determinar a sua inviabilidade. O que numa das áreas ambientalmente mais sensíveis de Portugal, não é um cenário a excluir.

A urgência do investimento é clara e inegável. Há 15 anos uns cometeram o erro da megalomania e outros o erro do miserabilismo. Uns não tinham como pagar uma obra faraónica e os outros não previram o crescimento acelerado do tráfego. Hoje urge intervir e nem é possível ter o Porto a ajudar Lisboa, pois o seu aeroporto está fisicamente longe demais e acessibilidades ferroviárias rápidas não existem entre ambos. Não há dúvidas, portanto, de que é preciso avançar. Mas para onde e como?

O Montijo é vantajoso fundamentalmente para a concessionária, que tem a responsabilidade de desenvolver todas as infraestruturas associadas ao movimento aéreo e que ali não precisa de mais do que adaptar uma pista existente, por oposição à construção do zero que outra localização eventualmente pressuporia. Só para fazer vagar esta pista, o Estado gastará mais de 200 milhões a relocalizar as operações da Força Aérea, fora o aumento dos custos de operação daí para a frente.

Políticas públicas deste género não podem excluir análises comparativas de diferentes opções nem a sua integração e interação com outras políticas de desenvolvimento territorial em curso ou em projeto, como por exemplo os eventuais desenvolvimentos da rede ferroviária entre Lisboa e o Porto ou a necessidade de erguer uma terceira travessia do Tejo em Lisboa. Fazê-lo é perder a hipótese de chegar à eficiência máxima na globalidade do país, por oposição à tentativa de encontrar a eficiência máxima num projeto em particular, como o do aeroporto do Montijo.

A capacidade para eventual expansão do Montijo é apenas teórica, uma vez que a operação deste aeroporto, mesmo na sua versão “apeadeiro”, representa um forte risco ambiental – provavelmente, um inédito risco ambiental no estuário do Tejo. Poderemos estar perante um remendo demasiado provisório, não permitindo sequer reduzir o tráfego na Portela, um objetivo recomendável a prazo e que saiu da agenda.

Nas acessibilidades, já se percebeu, o governo comporta-se como é seu hábito. Vai gerando hipóteses absurdas (como o metro de Lisboa instalado na Vasco da Gama ou os shuttles de catamarãs no Tejo) e mistura a ficção de apenas necessitar de construir uns ramais de acesso rodoviário à A12. Das duas uma: ou o aeroporto se destina a acolher um tráfego ainda menor do que o expectável ou então existe um custo escondido, que são as acessibilidades necessárias para integrar o aeroporto do Montijo com a margem Norte, e que são responsabilidade estatal.

Por fim, urge que o Governo emende a mão e avance para uma avaliação ambiental estratégica, com estudo de outras opções. É impensável que um projeto deste género, a realizar no meio do Estuário do Tejo, possa eventualmente ir para a frente com uma mera análise de impacto ambiental. É verdade que já foi perdido muito tempo, mas essa é uma fatura que temos de passar a quem nos governa (o atual elenco, por exemplo, está há quatro anos a adiar). E para faturas chega-nos essa. A fatura das graves externalidades de um projeto mal programado é bastante pior e duradoura.

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