Eleições em 28 Capítulos

As Eleições são um gatafunho escrito na margem do que pensamos que sabemos. Bem ou mal o Povo da Europa vai votar.

As Eleições Europeias prometem acabar com o consenso fundador da Europa. Com elevada probabilidade, pela primeira vez teremos no Parlamento Europeu uma significativa representação política dos partidos Populistas. É o regresso de uma ideia de Europa banida, humilhada e condenada desde o Pós-Guerra. Reconvertida em estilo hipster, apresenta-se hoje renovada, sublimada por uma visão do Futuro e impulsionada por uma outra ideia de Europa. Neste sentido, o Projecto Europeu tanto poderá sair reforçado como cair derrotado.

A questão reside no facto das duas ideias de Europa não parecerem estar dispostas a entrar num compromisso político. Aliás, a palavra “compromisso” não entra no vocabulário político Populista, pois a Europa vigente repousa no concerto das Nações em compromisso. A Europa Populista, que se opõe à Europa Social-Democrata, não pretende defender e difundir a ideia de que existe um destino partilhado em direcção a um Futuro comum. O que tem vindo a morrer nas ruas da Europa é precisamente a ideia de que é possível e desejável a construção de uma Grande Europa aberta a novas experiências políticas e a novas aventuras demográficas. O que parece estar a renascer na Europa é o confronto entre dois Sistemas, duas visões inimigas que se defrontam pelo monopólio da verdade política. Se esta tendência prevalecer, os conflitos políticos pessoais transformam-se em conflitos políticos nacionais, o Ideal da Europa e a Realidade da Europa separam-se até que a História ou alguma personalidade política de excepção concretize uma nova Reunificação Política.

A dicotomia Esquerda-Direita tem sido ultrapassada pelas Guerras Culturais que atravessam o Continente com a precisão sísmica de uma fissura atlântica. A Europa Social-Democrata é o rosto visível e punível do establishment, distante da população da Europa, burocrática na essência, insensível na política. Nos bairros perdidos entre as Grandes Circulares Externas, nas varandas que se abrem para as ruas desertas, nas planícies de asfalto dos Parques de Estacionamento das Grandes Superfícies Comerciais, as expectativas de uma vida mais próspera acabam na fila de um guichet do Grande Contrato Social.

A Europa Social-Democrata não tem resposta para a pressão migratória, para a questão da segurança, para as minorias dominantes, para o Multiculturalismo compulsivo, para a ascensão do Nacionalismo, para o desemprego, para o horizonte baço de um futuro sem expectativas com um cheque-reforma a rondar o montante da miséria. A Justiça Social torna-se numa profecia misteriosa compilada em euforia por um comité de conselheiros económicos. Neste labirinto político, a promessa da Europa Social-Democrata perde-se na realidade rural de um interior desertificado, perde-se na degradação oxidada das grandes Zonas Pós-Industriais. A promessa da Europa Social-Democrata perde-se na nova geração citadina, activista climática, ciclista militante, vegan vigilante, que opta por estilos de vida alternativos nas novas zonas da cidade em gentrificação. E não adianta referir o Centro-Direita comprometido, por um lado, pela crise financeira, a austeridade e a imagem do “Partido dos Bancos”; por outro lado, condicionado pela pressão crescente da Europa Populista que se multiplica em milhões de “Selfinis” da Lombardia ao Vale do Ruhr.

A Europa Social-Democrata confunde “compromisso” com “uniformidade”. Sendo capaz de ver a Europa, não consegue pressentir a Nação e sentir o Indivíduo. A Europa Social-Democrata consegue ver e inventar as regras sem ter a mínima noção do jogo. Sendo flexível, transporta a meia flexibilidade de quem julga que todos têm de caminhar no sentido definido por Bruxelas. Respeitando na aparência todas as opiniões, a Europa Social-Democrata coloca todas as suas posições e decisões políticas num patamar moral superior. Dependentes da Política, destituídos de um hinterland, entendem a posse de um cargo político como sílabas do Projecto Europeu. A Europa Populista não tem o hábito de jantar com a Oposição. Ruidosa e zangada na sua prática e discurso políticos, reproduz a linguagem do Homem Normal, o rosto de quem cresceu cedo para a vida para despontar medíocre para o anonimato. A Europa Populista representa a nova geração punk, uma geração revoltada no seu Continente, mas humilhada por minorias e sem vestígios de futuro. O Continente Populista alimenta-se do ressentimento e da revolta, defende os Europeus em trajes de vítima e acusa os Estrangeiros em vestes de culpado. A Europa Populista é o choque entre os que Dominam e os que são Dominados.

As Eleições Europeias são processos políticos sobrepostos e estranhamente ligados, uma série pós-moderna e pós-cristã das variações e vicissitudes políticas da Europa. As Eleições Europeias são o retrato mundano e secular que representa o romance político de um Continente. As Eleições são um gatafunho escrito na margem do que pensamos que sabemos. Bem ou mal o Povo da Europa vai votar. Num parêntese vindo do coração e passando pelo cérebro, o que é mais importante: Uma ideia específica da Europa ou o exercício mesmo que errado da Democracia?

Nota: O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico

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