Mercados em máximos com economia em mínimos
Os principais índices acionistas giram em torno dos máximos históricos, não obstante o forte abrandamento dos lucros, a explosão da dívida empresarial e os avisos do FMI.
No passado dia 8, Kristalina Georgieva afirmou que o crescimento do PIB mundial este ano será o mais baixo desde a Grande Crise Financeira. Ainda de acordo com a nova diretora-geral do Fundo Monetário internacional (FMI), a tibieza do crescimento é generalizada no espaço e deverá estender-se, pelo menos, até ao próximo ano.
Os economistas do FMI não estão sozinhos nesta visão mais nublada do horizonte económico. Nos mercados financeiros, por exemplo, são vários os sinais de alerta. A forte depreciação das matérias-primas (gráfico 1), que é a classe de ativos porventura mais reativa à evolução da situação económica mundial, sugere um grau de vulnerabilidade não observado desde a crise. Mensagem semelhante emana da apreciação significativa do ouro, o qual tem, recentemente, vindo a atingir novos máximos na maioria das moedas europeias (gráfico 2).
Por outro lado, a vulnerabilidade dos bancos europeus, plasmada no desempenho negativo dos preços das respetivas ações (gráfico 3), indicia que os efeitos da crise financeira ainda não estão sanados, circunstância que condiciona o normal financiamento da atividade e que, além do mais, encerra um potencial de instabilidade financeira na área do euro.
Outro foco de preocupação advém do aumento dos riscos deflacionistas, como a queda para o valor mais baixo de sempre das expectativas para a inflação implícitas no mercado das taxas de juro bem ilustra (gráfico 4). As dificuldades dos bancos europeus e a possibilidade de retorno a uma conjuntura deflacionista constituem óbvias fontes de fragilidade, dados os elevados níveis de endividamento que ainda se verificam.
À perda de vigor da economia mundial soma-se um enorme grau de incerteza na esfera geopolítica, que vai desde as guerras comerciais com epicentro na Casa Branca até aos – infelizmente costumeiros – conflitos no Médio Oriente. A este respeito, as depreciações sustentadas do renminbi e do euro podem vir a revelar-se explosivas, ao adicionar o espetro das guerras cambiais à já altamente inflamável retórica das guerras comerciais.
Este contexto de quebra do dinamismo da atividade e de maior incerteza global deveria elevar o grau de prudência dos investidores e proporcionar uma reavaliação dos pressupostos muito generosos que subjazem à excessiva valorização dos ativos financeiros de maior risco, como as ações e as obrigações emitidas pelas empresas de maior risco.
Mas o que se passa é o contrário, nomeadamente nos EUA, onde os principais índices acionistas giram em torno dos máximos históricos, não obstante o forte abrandamento dos lucros, a explosão da dívida empresarial e os avisos do FMI quanto à degradação das perspetivas económicas futuras.
As causas que explicam a dessincronização entre os mercados financeiros e a economia são diversas, mas tipicamente resumem-se à ideia de que perante taxas de juro muito baixas e liquidez abundante não existe alternativa ao investimento em ações, o qual, ainda assim, confere uma remuneração distintamente positiva.
Acontece que este argumento só deveria ser tragável para quem ignora a existência de ciclos económicos e desconhece os números negativos. Com efeito, uma parte substancial dos dividendos que as empresas distribuem atualmente desaparecerá se o ciclo virar a sul, como parece estar a ocorrer. Do mesmo modo, a alternativa, aparentemente desastrosa, do investimento em ativos seguros a taxas de juro baixas ou mesmo negativas rapidamente se poderá tornar interessante em caso de uma correção nos mercados que produza retornos acionistas muito negativos.
Na verdade, o que tem permitido uma valorização incessante dos índices acionistas (sobretudo os americanos) é a promessa implícita de que, ao mínimo solavanco nos mercados, a Reserva Federal (Fed) e/ou o BCE intervirão com injeções massivas de liquidez. É perante esta dinâmica, que dura desde o primeiro ano de Alan Greenspan à frente da Fed (1987), que se afigura como provável que a Fed esteja à espera da próxima correção nos mercados acionistas para lançar o quarto programa de compra de dívida e, até quem sabe, o corte das taxas de juro para níveis negativos. Já vimos coisas mais estranhas.
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