A Direita da moda

É curioso constatar que a agressividade ideológica normalmente prosseguida pela esquerda radical é hoje propagandeada por muito boa gente dita de direita e “de elevada instrução” nas redes sociais.

Para percebermos a “direita da moda” vale a pena ver a série “The Loudest Voice”. Uma excelente performance de Russell Crowe no papel de Roger Ailes, mentor da Fox News. Obviamente que uma série – ainda que biográfica – pode ter alguns toques de ficção e exagero. No entanto, esta dá-nos uma boa ilustração de como chegámos ao “Trumpismo” inspirador de novas direitas que vão surgindo pelo mundo, inclusive em Portugal. Uma direita que vive do ruído e “gritaria” permanente contra tudo e todos, da difamação, do alarmismo, do justicialismo, de meias verdades ou mesmo de “fake news”, obcecada em ter impacto mediático imediato através do soundbyte fácil e de uma espécie de anti politicamente correto, como se o politicamente correto fosse em si mesmo uma tragédia para a sociedade e o politicamente incorreto o grande fator de desenvolvimento do mundo. Não é nem nunca foi. A história demonstra que extremismos nunca dão bom resultado.

É curioso constatar que a agressividade ideológica normalmente prosseguida pela esquerda radical é hoje propagandeada por muito boa gente dita de direita e “de elevada instrução” nas redes sociais, Whatsapp, Youtube, etc. E quando começamos a ver pessoas supostamente “bem na vida”, com formação superior, a fazerem propaganda a boçalidades, é motivo para ficarmos preocupados.

A direita em Portugal está numa encruzilhada. Bastou a eleição de um deputado eloquente do Chega (partido que mal sabemos o que é, pois só nos deu a conhecer André Ventura) para abanar todo o setor. O CDS, com medo de desaparecer “engolido” pelo radicalismo populista, elegeu um jovem líder, aparentemente, para ressuscitar o lado mais velho e conservador do partido. Uma espécie de estratégia de “ou vai o racha” que é compreensível à luz da realidade atual e que, ainda assim, parece mais moderada que a do Chega. O PSD – dentro da sua diversidade habitual – ao contrário do que talvez fosse expetável, reelegeu Rui Rio e, por ora, conteve-se no centro. No entanto, todos estes partidos revelam medo de nunca mais chegar ao poder se descartarem alianças com esta nova direita por ora de representação diminuta, mas muito ruidosa.

Creio que o pior erro de qualquer partido moderado é defender valores errados e radicalizar-se só por razões “egoísticas” e imediatas de sobrevivência. Os partidos têm mais hipóteses de serem bem sucedidos se forem coerentes com os seus valores do que se andarem, oportunisticamente, atrás de modas ideológicas.

Cada um acredita no que entender. Afinal, ser de direita é ser tolerante, desde logo, com a liberdade de pensamento. Mas eu acredito que a direita progressista não é esta que está na moda. A “minha” direita é a da liberdade, tolerância e diversidade. Acredita nas pessoas, no mérito e na iniciativa privada. Acredita que, regra geral, elas utilizam a liberdade para promoverem o “bem” e desenvolvimento e que, portanto, o Estado deve ser um regulador e um garante de igualdade e coesão social, mas não o motor da economia e “devorador” da riqueza produzida. É intransigente na defesa da Justiça e do Estado de Direito, portanto não julga no “pelourinho” e não idolatra justiceiros que acham que os fins justificam os meios. Prefere lidar com os factos e encarar a realidade em vez de procurar manipulá-la com meias verdades e fake news só para obter resultados políticos. Concorda que a segurança é fator importante das sociedades livres, mas não se deixa cair em histerias securitárias, principalmente num dos países mais pacíficos do mundo como é Portugal. É intolerante com a discriminação e não “carimba” as pessoas em função de raças, opção sexual, religiões ou crenças de qualquer tipo. Entende a diplomacia internacional como a primeira linha da coexistência pacífica das diferentes nações, embora não descartando o uso da força em situações de necessidade e ao abrigo do Direito internacional. Gosta muito mais da globalização do que do protecionismo. É patriótica, não nacionalista. Não nega as alterações climáticas e procura compatibilizar desenvolvimento económico com a necessidade de melhorar os comportamentos ambientais.

Talvez na visão dos promotores da ruidosa “direita da moda” estas características exemplificativas façam de alguém que se acha de direita um perigoso socialista. Seja como for, é importante irmos relembrando estes valores para que a direita democrática mantenha a consciência dos mesmos e não se deixe levar por esta enxurrada de “detritos” ideológicos a que também querem chamar direita.

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