Eu quero é que eles se fundam
Mais do que nunca dava jeito ter duas forças políticas de dimensão considerável com visões diferentes para o país. Se o PS e o PSD não o conseguem fazer, então que se... fundam.
Dizem que o vírus poderá mudar tudo politicamente. É possível que venha a ser verdade, mas até agora não se viu nada. O que se tem visto até hoje é cada partido usar a pandemia como desculpa para defender as mesmas posições de sempre. O PCP quer proibir despedimentos e um papel mais dominador do estado na economia, tal como sempre quis. O BE quer nacionalizações, tal como sempre quis. Já Rui Rio reforçou a sua vontade de governar com o amigo Costa. Nada mudou. A pandemia apenas serviu de desculpa para cada um justificar desejos antigos.
Muitos aplaudiram o discurso de Rui Rio em que afirmou abdicar de ser oposição e admiraram o seu patriotismo ao pedir aos militantes do seu partido para que não criticassem o governo. Nada mais errado.
- Primeiro, porque só pode abdicar de ser oposição quem alguma vez tenha sido, e Rui Rio nunca o foi.
- Em segundo lugar, porque não é de todo patriótico abdicar de uma das ferramentas essenciais ao bom funcionamento dos governos, o escrutínio, precisamente na altura em que ele é mais necessário.
Com a sua atitude, Rui Rio enfraquece o país e as suas instituições, tornando-nos mais expostos a abusos de poder. O líder do maior partido na oposição nunca deveria ter abdicado desse dever de escrutínio que os eleitores lhe atribuíram. Principalmente numa altura destas.
Abster-se de criticar ou escrutinar publicamente pode ser uma estratégia importante em tempos de guerra contra um inimigo humano. O inimigo humano pode tirar proveito das nossas discussões, divisões e hesitações. Escrutinar numa guerra contra um inimigo humano é dar informações preciosas ao inimigo, colocando em causa a nossa capacidade de o combater. Escrutinar na luta contra um vírus é garantir que o combate é feito com a maior eficiência possível e não abre portas a crises profundas no futuro ou abusos de poder. Mas Rio opta por não escrutinar porque nunca o quis verdadeiramente fazer.
O namoro entre o PS de Costa e o PSD de Rui Rio já é longo. Começou quando ainda Seguro presidia ao PS e Passos Coelho ao PSD e ambos planeavam em almoços pouco secretos tomar o poder nos seus partidos. Seguro foi logo o primeiro a cair. Rio teve mais dificuldades, mas também acabou por chegar lá. Assim que ambos conseguiram derrubar os seus antecessores, o namoro passou a ser ainda mais evidente. Em todo este período de convivência não há um exemplo de uma diferença ideológica relevante ou uma qualquer diferença notória de visões para o país. Ambos se dizem sociais-democratas e apontam a mira ao eleitorado de centro-esquerda. Os elogios mútuos são constantes e a vontade de cooperação também.
Neste cenário talvez seja de ponderar uma fusão entre o PS e o PSD. Parecendo que não, esta opção teria muitas vantagens. Para o PS permitiria atingir maiorias absolutas com mais facilidade, algo que, apesar de dominar o poder nos últimos 25 anos, sempre teve dificuldade em atingir. Para as pessoas do PSD permitir-lhes-ia aceder a cargos de poder fora de períodos de crise, algo que estão há 25 anos sem conseguir. Para o país seria excelente porque, esclarecendo inequivocamente que não há diferenças entre este PSD e este PS, poderia ser aberto espaço eleitoral para alguém que oferecesse mesmo uma visão alternativa para o país.
O país está estagnado há 20 anos e os próximos tempos não se adivinham fáceis. A falta de confronto de visões alternativas poderá piorar ainda mais a situação. Mais do que nunca dava jeito ter duas forças políticas de dimensão considerável com visões diferentes para o país, que discutam e que se escrutinem mutuamente. Se o PS e o PSD não o conseguem fazer na altura mais importante para o país, então que se… fundam.
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