O fim de um mito e de um modelo económico errado
As políticas do PS deram duas décadas de estagnação económica, apesar de um brutal endividamento público e privado e um valor muito elevado de fundos comunitários.
Desde 1995, Portugal tem sido governado quase interruptamente pelo Partido Socialista. Entre 1995 e 2020, num total de 25 anos, o PS governou 18 anos e o PSD geriu o país durante 7 anos. Sendo que os 7 anos do PSD foram sempre em emergência financeira. Primeiro, entre 2002 e início de 2005, quando Portugal teve a abertura do primeiro Procedimento dos Défices Excessivos devido ao défice de 2001 e, depois, entre meados de 2011 e final de 2015, com um memorando da Troika que durou entre maio de 2011 e maio de 2014.
Isto serve de introdução para dizer que as performances económicas de Portugal nas últimas duas décadas, desde a sua entrada no Euro, resultam, em grande medida, das políticas económicas seguidas por governos do Partido Socialista (Guterres, Sócrates e Costa).
Entre 2000 e 2019, a economia Portuguesa cresceu, em termos reais acumulados, cerca de 10%. Isso dá uma média de crescimento anual real do PIB abaixo de 0.5%. O PIB per capita cresceu cerca de 8% em termos acumulados no mesmo período, o que dá um crescimento médio real da riqueza por habitante ainda inferior.
Mas a dívida externa, que até 1995 era próxima de zero, atingiu um valor acima dos 100% em 2010, antes do pedido de resgate financeiro. A dívida pública, que rondava os 50% no final da década de 90, passou para 110% no momento do resgate da Troika. E com o que estava fora do perímetro das contas públicas, mas que foi preciso incorporar (empresas como a CP, Refer, RTP, Metro de Lisboa e do Porto, Estradas de Portugal, etc), a dívida pública passou para 130% do PIB. E não se contabilizou as PPPs e uma série de outros instrumentos, que continuaram fora do perímetro. Caso contrário, a divida pública tinha chegado facilmente aos 150%.
Em termos nominais, a dívida pública valia em 1995 cerca de 55 mil milhões de euros, já em 2019 passou para cerca de 250 mil milhões de euros. Ou seja, mais 200 mil milhões de euros de dívida pública (os tais mais 70 p.p. do PIB, ao passar de 50% para 120% do PIB entre 1995 e 2019).
Neste mesmo período, entre 2000 e 2019, em cima do brutal endividamento do Estado e da economia, continuámos a receber fundos comunitários. Foram três quadros comunitários, com um total em torno dos 70-80 mil milhões de euros de fundos.
Ou seja, duas décadas de estagnação económica, apesar de um brutal endividamento público e privado e um valor muito elevado de fundos comunitários. Ou seja, tivemos quase 300 mil milhões de euros disponíveis, entre dívida pública e fundos comunitários. E se somarmos os cerca de 20 mil milhões de euros de privatizações, sobretudo na segunda metade dos anos 90, chegamos mesmo a esse valor de 300 mil milhões de euros, e a economia estagnada ao longo de 20 anos.
Mas desenganem-se aqueles que acham que nos últimos 4 anos invertemos a situação, porque conseguimos crescer um pouco. A tabela 1 (abaixo) mostra quanto cresceu Portugal versus os países do sul e do leste Europeu. Pegando no PIB de 2015 (que assume uma base 100), vemos que Portugal só cresceu mais que Itália e Grécia nestes últimos 4 anos.
Houve uma ilusão que foi sendo vendida aos Portugueses. Uma pequena bonança, fruto de uma conjuntura externa muito favorável, de uma política monetária muito expansionista e de reformas feitas no período 2011-2015, que infelizmente foram desperdiçadas.
PIB em 2019 com base 100 em 2015
E a prova que foram desperdiçadas está na tabela 2. Esta tabela mostra o PIB em 2020 (usando as mais recentes previsões económicas da Comissão Europeia), tendo como base o ano de 2015 (base 100 = PIB 2015).
O que vemos é que Portugal perde este ano o pouco crescimento económico que teve nos últimos 4 anos. Voltamos ao PIB real de 2015. Mais grave ainda é que na prática voltamos ao PIB real de 2000. Ou seja, duas décadas perdidas. Mas nessas duas décadas, os últimos 4 anos foram os mais favoráveis. E foram completamente desperdiçados.
Note-se que só a Itália e a Espanha, muito mais afetadas pela pandemia, e a Grécia, com uma situação de finanças públicas mais difícil (nomeadamente a divida pública) e também muito dependente do turismo, é que veem o seu PIB cair abaixo do valor de 2015.
PIB em 2020 com base 100 em 2015
A aposta dos últimos 4 anos mostrou-se totalmente errada. Uma economia cujo crescimento se baseou no turismo, imobiliário e serviços conexos. Contas públicas que atingiram um excedente nominal graças à política monetária do BCE (quebra na despesa com juros e aumento dos dividendos e IRC do Banco de Portugal), a um aumento da carga fiscal, a uma redução do investimento público e a cortes nos serviços públicos.
Eu alertei. Passei estes últimos 4 anos a avisar que tudo aquilo era frágil, conjuntural e sem sustentação. O resultado está à vista. Uma economia frágil, que não aguenta um embate recessivo.
Naturalmente que ninguém poderia adivinhar a chegada do novo coronavírus, assim como só poucos anteciparam a choque do subprime. Mas a solidez de uma economia revela-se em situações de crise. Portugal tinha uma estrutura muito frágil em 2008, como tem agora. Não fora a atuação do BCE e Portugal estaria de novo com uma crise de acesso ao financiamento.
Post-scriptum: Esta coluna regressa, salvo algum imponderável, em setembro. Um bom verão, dentro das dificuldades que atravessamos é o que desejo a todos os leitores.
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