O Novo Banco e a importância dos órgãos de fiscalização

É nos conflitos de interesses e nas transacções entre partes relacionadas que estão em geral os maiores problemas de governo societário em Portugal.

As últimas notícias envolvendo o Novo Banco e o Fundo de Resolução deveriam suscitar uma discussão alargada sobre o governo das sociedades comerciais em Portugal, para além de tudo o resto que alegadamente haverá ali para discutir. O governo societário representa um domínio no qual o País está ainda atrasado, mas em relação ao qual as exigências são cada vez maiores. É, de resto, uma preocupação que já não se limita às empresas cotadas em bolsa.

Na sigla ESG, que representa a nova ideia de responsabilidade social das empresas, o G representa a palavra “Governance”. Ora, as empresas que hoje não cumprem com as melhores práticas de governo societário arriscam a sua reputação. Mas, sobretudo, arriscam a sua funcionalidade, deixando de acolher mecanismos de auditoria e de contraditório essenciais ao seu bom funcionamento.

Em Portugal, o código de governo das sociedades do Instituto Português de Corporate Governance (IPCG), que é de adesão voluntária e assenta na regra de “comply or explain”, constitui a referência. Este código considera os seguintes eixos principais: relação da sociedade com investidores e informação; diversidade na composição e funcionamento dos órgãos da sociedade; relação entre órgãos da sociedade; conflitos de interesses, e; transacções com partes relacionadas.

O código do IPCG faz ainda um conjunto de recomendações dirigidas aos detentores de participações societárias e aos membros de órgãos sociais, bem como recomendações sobre avaliação de desempenho, remunerações, nomeações, gestão de risco e informação financeira.

Na temática do governo societário, a importância dos órgãos de fiscalização é cada vez maior. Neste domínio, existem várias figuras a destacar. Em primeiro lugar, a figura do administrador não executivo que, de acordo com o código do IPCG, exerce “uma função fiscalizadora e de desafio à administração executiva para a plena realização do fim social da sociedade”. Em segundo lugar, os órgãos de fiscalização propriamente ditos, como as comissões de auditoria (que são ocupadas por administradores não executivos), os conselhos fiscais, ou ainda os conselhos gerais e/ou de supervisão. Em terceiro lugar, os auditores externos, na figura dos revisores oficiais de contas para questões de integridade contabilística, ou outros auditores para fins de natureza diversa. Todos exercem funções de fiscalização, que não se limitam aos aspectos formais da lei.

A estrutura de fiscalização depende da complexidade organizacional e dos sistemas de incentivos. Neste aspecto, há alterações legais que poderiam ser contempladas. Uma primeira diz respeito à reformulação do Código das Sociedades Comerciais (CSC), que continua a não fazer grande diferença entre administradores executivos e não executivos, e que deveria reforçar o papel dos administradores não executivos em linha com o código do IPCG. Outras alterações têm a ver com a eliminação de excepções em matéria de revisão legal de contas, por um lado, e a implementação efectiva do artigo 35º do CSC, por outro. Sobre as contas das empresas, recorde-se que os conselhos fiscais e os revisores oficiais de contas, enquanto auditores independentes, são fundamentais na defesa dos interesses dos investidores, dos trabalhadores, dos credores, incluindo o Estado, e, por conseguinte, dos das empresas.

Mas é nos conflitos de interesses e nas transacções entre partes relacionadas que estão em geral os maiores problemas de governo societário. As abordagens dos órgãos de fiscalização passam pela prevenção e pela remediação. A prevenção exige conhecimento prévio dos potenciais conflitos de interesses e partes relacionadas. A remediação implica a existência de regras que definam a responsabilidade e a forma de sanar conflitos. A primeira abordagem é naturalmente preferível à segunda, sendo que as ferramentas hoje disponíveis – declarações individuais de interesses, informações empresariais simplificadas, registos de beneficiários finais, bases de dados comerciais, e regulamentos internos das próprias empresas – favorecem uma cada vez maior capacidade de prevenção. Como diz o ditado, mais vale prevenir do que remediar.

Nota: Por opção própria, o autor não escreve segundo o novo acordo ortográfico.

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