Rupert Symington: “Como CEO não estou a vigiar os meus diretores para ver se põem o pé no sítio errado”

  • ECO
  • 30 Março 2021

Quarta geração de uma família ligada ao vinho do Porto há 129 anos, Rupert Symington, CEO da companhia com o seu apelido, é finalista do EY Entrepreneur of the Year.

Rupert Symington tem 57 anos e nasceu “com o mundo do vinho à volta”. A empresa com o seu apelido lançou raízes no Douro em 1882 e tem passado de geração em geração desde então. “O meu pai levava-me ao porto de Leixões para ver as pipas a serem carregadas”, conta ao ECO. Teria, recorda, uns 5 anos. “As famílias do vinho não se afastam muito da realidade do vinho. Todas as situações envolviam vinho. Havia clientes que ficavam na casa dos meus pais, havia visitas às vinhas. As visitas ao Douro tinham uma magia especial”. Em 2021, o CEO da companhia é um dos cinco finalistas do prémio EY Entrepreneur of The Year.

De Massarelos, onde nasceu, a Gaia, onde a Symington tem a sua sede, há um mundo inteiro que Rupert percorreu até que em 1992 voltou. Depois do infantário na Foz e do colégio britânico até aos 13 anos, cumpriu a tradição da família e foi estudar para um colégio interno na Inglaterra, “para ver um bocadinho da cultura britânica”, conta.

Seguiu-se o curso de Matemática na Universidade de Oxford, onde, pela primeira vez, entrou num concurso de provas de vinho contra a arquirrival Universidade de Cambridge. Acertou, “tinha bebido aquele vinho semanas antes”. Mas não foi essa experiência que o aproximou do negócio da família. Depois da licenciatura, viajou pela América do Sul – México e Peru. No regresso à Europa, “arranjei um emprego na city de Londres, trabalhei cinco anos na bolsa, a fazer análise e balanços”.

Havia de trocar esse trabalho por mais viagens: África, Austrália e EUA. “Fiz um estágio no nosso importador lá. Uma empresa de cinco pessoas, em São Francisco. Foi ali que conheci a minha mulher, que é de lá. Um plus que correu bem”, diz. Cruzou o Atlântico e um MBA do Insead depois, em 1992, “vim trabalhar permanentemente no Porto”, recapitula, no seu português com sotaque britânico e portuense.

Abre-se um parêntesis na conversa. Rupert Symington explica que apesar de ter aprendido português em pequeno e do pai, Ron, também falar, acabou por ter pouco contacto com ela. “Não tive essa imersão na língua”, afirma. E, na empresa, onde partilha responsabilidades com outros membros da família, “os meus primos têm tendência a falar inglês comigo”. E, de resto, tem sido sempre nesse balanço entre português e inglês que se tem desenrolado o trabalho.

Terá sempre estado destinado a dirigir a Symington? Recua de novo no tempo. “O meu pai quando eu tinha por volta dos 18 anos, disse-me: Se tu queres ficar com a minha posição na empresa, tens de iniciar esse percurso“. “Ele queria que fosse a Oxford e depois fazer dois ou três anos em Londres, para ganhar experiência, depois fazer um MBA e voltar”, resume. “Acabei por fazer tudo o que ele queria, mas havia uma cenoura – se eu quiser aceitar o desafio, ele entregava a sua posição. Eu tinha um emprego mas queria também uma posição na empresa”, diz.

Sempre achei que não queria voltar sem ter alguma experiência externa, não queria entrar como empregado, queria entrar como gestor, mas também não entrei diretamente no conselho de administração”, explica.

Num ponto fugiu da tradição: “Passar seis meses na sala de provas. Nunca tive oportunidade de fazer isso, entrei e fiquei logo envolvido num processo de reestruturação da empresa”, refere. A formação de matemática e a experiência como analista valiam mais.

A Symington que herdou do pai cresceu muito. “Na geração do meu pai, ele trabalhava com quatro primos, eram mais hands on, a empresa tinha 40 pessoas. Dividiam a parte comercial por mercados”, refere. O pai de Rupert pegou nos EUA e no extremo Oriente.

Trabalhou cinco anos com o pai, que lhe deu a responsabilidade do mercado americano, que ainda assume. Depois, “fiquei responsável pelo planeamento financeiro da empresa, tudo o que é previsões financeiras, não faço tesouraria do dia dia dia, mas gosto de fazer planos. Em 2006 tivemos oportunidade de comprar um grande concorrente, fiz os modelos de rentabilidade futura.”

Nestas duas décadas lembra outro projeto que pôs de pé: o departamento do Douro Doc, vinhos de mesa do Douro. “Montei um grupo de trabalho, para criar uma divisão nova na empresa. Tive de planear a política comercial, preços por garrafa, fiz a maior parte do planeamento, o business plan”. Atualmente, 480 pessoas trabalham na Symington.

Após a saída do primo Paul, Rupert Symington assumiu a posição de CEO. “Antigamente partilhava essa responsabilidade com os primos Johnny e Paul. Agora é mais tradicional”, explica. Na Symington, “definir responsabilidades” é, segundo Rupert, muito importante. “No momento em que duas pessoas começam a lutar por uma responsabilidade há um problema”. E acrescenta: “Mesmo como CEO não estou a vigiar os meus diretores para ver se põem o pé no sítio errado. Fazem as coisas com muita autonomia, o que é importante é o governance”.

Por outro lado, Rupert acredita que uma companhia familiar tem as suas mais-valias. “Os sócios desentendem-se, mas quando há sangue em comum pessoas têm outro interesse em manter a empresa”. Na Symington, 100% das ações são detidas pela família, mas, como explica o gestor, apenas cinco em onze diretores têm este apelido. “É sempre um erro quando uma família acha que o negócio é a conta bancária da família”, diz. Na empresa, criaram uma série de regras internas que gerem o comportamento, a experiência dos membros da família, o que acontece se uma pessoa não se consegue integrar. “Não é para criar anticorpos mas é para ter uma empresa saudável para o futuro”.

Atualmente, uma mão cheia de membros da quinta geração da família Symington está a trabalhar nas sucursais de distribuição da empresa. “O meu filho está na mesma empresa onde trabalhei há 25 anos”.

“Estamos a planear melhorias na Quinta do Bonfim, um novo restaurante, a primeira adega certificada de sustentabilidade. Estamos a investir no futuro. As coisas vão melhorar. O turista vai voltar e vai ser diferente. Vamos demorar a ter o turista de fim de semana, mas Portugal tem esta reputação de ser seguro e não muito caro, e a enorme vantagem de não se ter de se voar mais de três horas na Europa”.

Rupert Symington

2020 foi um ano “complicadíssimo”, admite Rupert Symington, “mas fechámos o ano com resultados muito bons”. “As previsões pareciam um desastre em abril do ano passado, mas as coisas correram bem”. Em vez dos 98,8 milhões de euros de 2019, faturaram 98,3 milhões. Saíram, crê, beneficiados pelas boas relações com Europa e EUA, mas penalizados nas vendas em lojas francas e tudo o que está relacionado com enoturismo, que caiu 80 ou 90%. “Nos mercados de exportação é verdade que vendemos mais. Gastaram o mesmo dinheiro”. Em Portugal, houve quebras, “o turista é um cliente muito importante.”

Para Rupert, a Symington passou dois testes importantes. Gerou confiança entre os trabalhadores (quem não está em teletrabalho é testado semanalmente) e clientes. Também ultrapassou as dúvidas em relação à logística, um dos seus “receios” há um ano. Só se lembra de um obstáculo que foram incapazes de ultrapassar: “Um fabricante de caixas em Ovar não conseguia entregar porque havia um cordão sanitário”.

Diz-se “cauteloso” em relação a 2021, mas confiante em relação a 2022. “Estamos a planear melhorias na Quinta do Bonfim, um novo restaurante, a primeira adega certificada de sustentabilidade. Estamos a investir no futuro. As coisas vão melhorar. O turista vai voltar e vai ser diferente. Vamos demorar a ter o turista de fim de semana, mas Portugal tem esta reputação de ser seguro e não muito caro, e a enorme vantagem de não se ter de se voar mais de três horas na Europa”.

“Eu faço parte da equipa, não sou eu sozinho que faço estas coisas”

Nesta 8.ª edição do prémio EY Entrepreneur of The Year, Rupert Symington junta-se a outros quatro finalistas – António Oliveira (OLI – Sistemas Sanitários), Carlos Mendes Gonçalves (Mendes Gonçalves), Guy Villax (Hovione) e António Carlos Rodrigues (Casais). “É uma honra para mim e para a nossa empresa ser escolhido”, diz ao ECO. “Eu faço parte da equipa, não sou eu sozinho que faço estas coisas. Sou mais low profile, não tenho grande vontade para esticar o pescoço, mas tudo o que a empresa pode receber em termos de reconhecimento é ótimo”.

Em anteriores edições do prémio foram distinguidos Belmiro de Azevedo (Sonae), Carlos Moreira da Silva (BA Glass), Dionísio Pestana (Grupo Pestana), Carlos e Jorge Martins (Martifer), Manuel Alfredo de Mello (Nutrinveste) e Bento Correia e Miguel Leitmann (Vision-Box) e António Rios de Amorim (Corticeira Amorim).

O prémio EY Entrepreneur of The Year é atribuído desde 1986, e é considerado o mais antigo a nível global. É organizado atualmente em 145 cidades e mais de 60 países. Todos os anos, cerca de 10 mil candidaturas são analisadas. Entre os vencedores estão Michael Dell (Dell Computers), Jeff Bezos (Amazon), Jeff Weiner (LinkedIn) ou Serguei Brin/Larry Page (Google).

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