Governo rejeita aumentar autonomia financeira da CMVM

Revisão aprovada pelo Governo (que ainda pode ser alvo de alterações no Parlamento) clarifica a alocação de coimas, mas não mexe na liberdade do supervisor sobre taxas de supervisão ou reservas.

O reforço da autonomia financeira era um dos pedidos feitos pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) ao Governo para o novo pacote legislativo aplicável à bolsa. Este já foi entregue pelo Executivo ao Parlamento e não traz alterações no que diz respeito às taxas de supervisão, havendo apenas uma clarificação sobre as receitas com coimas.

“É a revisão mais significativa dos últimos 20 anos, num momento em que será muito importante termos instrumentos para capitalização das empresas portuguesas”. Foi assim que o secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, anunciou a aprovação do novo código de valores mobiliários, a 13 de maio. Na semana seguinte, o documento com 300 páginas chegava ao Parlamento.

Com o objetivo de simplificar a regulação e a harmonizar face às diretrizes europeias, o código acaba com a figura das sociedades abertas, clarifica o regime de participação e votação nas assembleias gerais ou cria os certificados de legitimação. Estes estão entre alguns dos destaques do pacote, que prevê igualmente alterações aos regimes jurídicos de supervisão de auditoria e das ofertas públicas.

É extenso e abrangente o pacote que Governo levou ao Parlamento, mas há algo que defraudou a expetativa da CMVM: o reforço da autonomia financeira. O supervisor liderado por Gabriela Figueiredo Dias enviou, em dezembro de 2019, a sua proposta para a alteração ao Código dos Valores Mobiliários.

A par dos objetivos partilhados de simplificação — a líder da CMVM tem defendido que o atual enquadramento legal que rege a atividade do supervisor é pouco claro, deixando a porta aberta a interpretações –, Gabriela Figueiredo Dias tem alertado também para riscos à autonomia, nomeadamente à independência financeira.

O supervisor financia-se atualmente através das taxas que cobra às entidades que estão abrangidas nas suas áreas. Há dois tipos de taxas, sendo que a CMVM só tem autonomia para definir as taxas por atos. Já as taxas de supervisão, que dizem respeito ao acompanhamento regular da atividade, não são agora da competência da CMVM. Eram estas que podiam mudar, o que não acontece no documento aprovado pelo Governo (que pode ainda ser alvo de mudanças no Parlamento).

Além de mexer nas taxas, o regulador pretendia também que as coimas aplicadas passassem a entrar na CMVM como receitas. Estes valores vão atualmente para o Sistema de Indemnização aos Investidores (SII), que poderia vir a ser capitalizado pelo supervisor, à medida que fosse necessário, ou passar a receber diretamente financiamento do Orçamento do Estado.

Neste caso, há uma clarificação para retirar da esfera do SII as contribuições de entidades que não são cobertas pelo sistema (das quais são exemplos entidades dedicadas ao crowdfunding ou capital de risco). As restantes continuam a reverter para o sistema de indemnização, à exceção das coimas decorrentes de violações ao regime jurídico da supervisão de auditoria, cuja receita é partilhada entre CMVM e Estado.

Por último, a CMVM pretendia ter autorização para mexer nas reservas, um tema que tem gerado conflito com o Governo. Este fundo tinha, no final do ano passado, mais de 26 milhões de euros, mas tanto o ex-ministro Mário Centeno como o sucessor João Leão não autorizam que a CMVM use este dinheiro e levou mesmo ao adiamento de investimentos. Também neste caso nada mudou, pelo que o supervisor deverá continuar sujeito às cativações das Finanças.

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