“CMVM não podia nem devia ter impedido” aumento de capital do BES, diz Carlos Tavares
Mesmo que não fosse contra uma exigência do Banco de Portugal, o ex-presidente da CMVM acredita que impedir a recapitalização teria gerado uma crise de confiança e a liquidação desordenada do banco.
A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) não podia ter impedido o aumento de capital que o Banco Espírito Santo (BES) realizou pouco antes da resolução, segundo o então presidente Carlos Tavares. O atual chairman do Banco Montepio lamenta, ainda assim, que o supervisor dos mercados não tenha tido uma atuação de maior peso no processo.
“A CMVM não podia nem devia ter impedido o aumento de capital. Não tinha nenhuma razão legal para o fazer”, afirmou Carlos Tavares na audição desta quarta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à gestão do Novo Banco. Lembrou que o aumento de capital foi exigido, em 2014, pelo Banco de Portugal para a recapitalização do grupo.
Por isso, a CMVM não podia legalmente impedir. “Se o tivesse feito incorria em prática de ato contrário à lei. Mas mesmo que não fosse assim e a CMVM tivesse feito isso, o que era exigido pelo Banco de Portugal não era cumprido, o que geraria uma crise de confiança imediata, e o banco podia ter entrado em liquidação desordenada, que era o pior que poderia ter acontecido nessa altura“, justificou Tavares.
"Se a CMVM tivesse feito isso [impedir o aumento de capital], o que era exigido pelo Banco de Portugal não era cumprido, o que geraria uma crise de confiança imediata, e o banco podia ter entrado em liquidação desordenada, que era o pior que poderia ter acontecido nessa altura.”
Essa recapitalização “absolutamente necessária” foi pedida pelo supervisor da banca numa altura em que o banco estava já em dificuldades financeiras e tinha como objetivo reforçar os rácios de capital antes dos testes de stress. A operação foi totalmente subscrita porque, apesar dos alertas da CMVM, havia uma tomada firme por investidores institucionais.
Após a aplicação da medida de resolução ao BES, em agosto desse ano, os investidores que participaram no aumento de capital perderam o capital. Tavares considera, no entanto, que a operação não poderia ter sido impedida. Pelo contrário, lamenta que a CMVM não tenha tido maior envolvimento na resolução do BES. “O que mais me penaliza é que não tenha havido intervenção do supervisor e de não termos suspendido a negociação das ações atempadamente“, disse o ex-presidente da CMVM.
CMVM foi “competente, independente e até corajosa”
A audição de Carlos Tavares na CPI chegou a estar agendada para a semana passada, mas o próprio pediu que fosse adiada para que os deputados tivessem acesso a um relatório interno sobre a atuação da CMVM entre 2013 e 2014 em relação ao Grupo Espírito Santo (GES). Segundo o gestor, o documento mostra que “a atuação da CMVM foi muito competente, independente e até corajosa”.
Defendeu que houve troca de informação entre os três supervisores — Autoridade de Supervisão dos Seguros e Fundos de Pensões (ASF), além da CMVM e BdP — no seguimento de um acordo celebrado ainda em 2009. “Não só o BdP transmitiu informações relevantes à CMVM como a CMVM transmitiu ao BdP. Ambos trocaram medidas consequentes dessas trocas de informações. A cooperação entre a CMVM e o BdP existiu e foi bastante eficaz, provavelmente com a exceção das últimas três semanas de vida do BES“, explicou.
Exemplo das ações que resultaram da cooperação foi o agravamento dos requisitos de capital feito pelo Banco de Portugal sobre os produtos do GES que levaram a a desencadear uma série de operações junto da auditora KPMG.
"Enquanto o Banco de Portugal atuou como supervisor, penso que não encontramos problemas significativos com a CMVM. As verdadeiras questões colocaram-se quando o Banco de Portugal começou a atuar como autoridade de resolução. Está num plano diferente e toma as suas determinações.”
“Enquanto o Banco de Portugal atuou como supervisor, penso que não encontramos problemas significativos com a CMVM. As verdadeiras questões colocaram-se quando o Banco de Portugal começou a atuar como autoridade de resolução. Está num plano diferente e toma as suas determinações”, explicou Tavares.
O chairman do Banco Montepio é um dos defensores de que a Autoridade de Resolução deve estar separada do supervisor bancário, uma proposta que chegou a estar em cima da mesa na reforma da supervisão financeira que nunca avançou. “Não mudei de opinião”, respondeu, quando questionado esta quarta-feira pelos deputados sobre este assunto.
(Notícia atualizada às 12h45)
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