Governo negoceia com a esquerda englobamento obrigatório de rendimentos no IRS
É uma medida que está no programa do Governo e uma bandeira do PCP. O ECO apurou que o tema está a ser negociado no âmbito do Orçamento do Estado para 2022.
“Caminhar no sentido do englobamento dos diversos tipos de rendimentos em sede de IRS, eliminando as diferenças entre taxas”. Esta frase está escrita no programa com que o Partido Socialista concorreu às eleições de 2019 e foi vertida para o programa de Governo, mas nunca chegou a sair do papel.
Na discussão na especialidade dos orçamentos do Estado para 2020 e 2021, os socialistas chumbaram as propostas do PCP no sentido de tornar o englobamento obrigatório, mas o ECO apurou que o assunto foi ressuscitado nas negociações que estão agora a decorrer com a esquerda para o Orçamento de 2022.
Atualmente, o englobamento é opcional. Os rendimentos de capitais, prediais e as mais-valias podem ser tributados de forma separada, normalmente a uma taxa liberatória de 28%; ou podem ser englobados juntamente com os rendimentos de trabalho, aplicando-se neste último caso as taxas de IRS que variam atualmente dos 14,5% aos 48% (sem contar com o adicional do IRS). Os contribuintes escolhem o que lhes é mais vantajoso. Ao obrigar a englobar os rendimentos de capitais e prediais juntamente com os rendimentos do trabalho, isso poderá corresponder a um agravamento fiscal.
O programa de Governo não explica como será feito esse englobamento. Já o PCP chegou a apresentar à votação uma proposta concreta para obrigar os contribuintes com rendimentos acima de 100 mil euros anuais a englobar os rendimentos prediais e rendimentos de capital. Também o Bloco de Esquerda propôs uma medida semelhante.
Apesar de os socialistas e de o Governo não terem aceitado as propostas feitas pelos comunistas e bloquistas, o Governo nunca chegou a desistir da ideia. Foi isso mesmo que disse o secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, em declarações ao jornal Público, em dezembro de 2020. Garantiu que o programa de Governo “é para cumprir no decorrer de toda a legislatura, no tempo e no modo que seja oportuno”.
Esse tempo parece ter chegado e o tema volta agora a estar em cima da mesa. No programa de Governo, além do tema do englobamento, o Governo também prometeu uma maior progressividade no IRS e em entrevista à TVI, a 6 de setembro, o primeiro-ministro revelou que o Orçamento para 2022 deverá trazer um desdobramento do terceiro e do sexto escalões de IRS.
Mais escalões significa menos impostos a pagar pelos portugueses. Mas se o Governo avançar com o englobamento obrigatório, alguns contribuintes terão um agravamento fiscal em vez de um alívio. Isso mesmo admitiu António Costa aquando do debate do seu programa de Governo em 2019.
Na altura, Cecília Meireles, deputada do CDS, pediu uma garantia ao primeiro-ministro de que nenhum português pagaria mais impostos sobre o rendimento nesta legislatura. António Costa não a deu.
“Em matéria de rendimentos prediais, isentamos a tributação para quem coloque os imóveis em regime de arrendamento acessível ou faça contratos sem precariedade,” começou por recordar. No entanto, “para quem não o faz, e tem o direito a não o fazer, é provável que o englobamento venha a traduzir-se num agravamento de impostos,” admitiu na altura o primeiro-ministro.
Nesta altura, no Terreiro do Paço, o ministro das Finanças, João Leão, anda de calculadora na mão já que ainda esta semana, à agência Lusa, garantia que com a revisão dos escalões do IRS “não haverá aumento da carga fiscal”. Contudo, se o englobamento avançar, alguns irão pagar certamente mais impostos.
Confrontado pelo ECO com as negociações com a esquerda para avançar com o englobamento obrigatório e de alguns contribuintes poderem vir a pagar mais impostos, fonte oficial das Finanças preferiu não comentar.
João Leão já começou a preparar uma narrativa para este cenário. No inicio de setembro, na Grande Entrevista da RTP3, o ministro das Finanças afirmou que de 2015 a 2019, Portugal foi dos países da Europa que mais baixou o IRS em percentagem do PIB: de 7,3% para 6,3%. Na Europa essa percentagem até aumentou, para cerca de 9,6%.
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