Revisores de Contas preocupados com abertura das sociedades a investidores externos
"A legislação neste momento diz que a maioria do capital das sociedades de ROC deve ser detida por profissionais da área. Esta proposta de lei vem numa deriva ultraliberal", alerta a Ordem.
A Ordem dos Revisores Oficiais de Contas (ROC) está preocupada com a possibilidade, prevista pela revisão do Código de Valores Mobiliários, da abertura do capital das sociedades a investidores que não sejam do setor, disse o bastonário, no parlamento.
Numa audição na Comissão de Orçamento e Finanças, sobre a alteração legislativa, Fernando Virgílio Macedo alertou para os perigos de deixar que as sociedades de ROC sejam detidas maioritariamente por investidores que não sejam profissionais da área.
“A legislação neste momento diz que a maioria do capital das sociedades de ROC deve ser detida por profissionais da área. Esta proposta de lei vem numa deriva ultraliberal e diz que a maioria de capital pode ser de investidores de outro tipo”, indicou.
A revisão do Código de Valores Mobiliários (CMV) abre esta possibilidade, ainda que determinando que a maioria dos direitos de voto devem estar sempre nas mãos dos revisores.
“Um fundo de investimento faz um investimento numa sociedade de ROC e contratam depois essa sociedade, que faz a certificação de contas de investimentos destes fundos. É um desvirtuar da nossa profissão”, salientou.
“Achamos que é uma situação extremamente perigosa nesta lei, permitir que se encare ter uma participação numa sociedade de ROC como qualquer atividade” salientou, sublinhando a importância da “defesa do interesse público” e da “fiabilidade da informação financeira”.
“É uma profissão ‘sui generis’”, indicou, salientando que não pode ser encarada como “uma atividade comercial normal”.
Outra das questões a que a Ordem está atenta é à rotação de auditores, que pretende impedir que fiquem muito tempo com uma empresa.
“Deverá haver, mas só ao nível dos responsáveis do trabalho e não de toda a equipa”, defendeu o bastonário, salientando que “vai prejudicar empresas mais pequenas” com menos pessoal.
“Isto faz com que empresas de média dimensão que tenham acesso a trabalhos em grandes empresas, que requerem a meios humanos, depois não consigam fazer a rotação”, alertou, salientando ainda que “pode ser pouco produtiva porque perde-se ‘know-how’ [conhecimento]”.
Para o bastonário, também não faz sentido que seja a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) a determinar a idoneidade dos revisores e auditores. “A ordem é implacável no sentido de fazer um controlo rigoroso na idoneidade dos ROC”, garantiu, salientando que os profissionais não estão confortáveis com a possibilidade de “a CMVM determinar quais são os idóneos” e poder “retirar a idoneidade com base numa simples contraordenação”.
Por fim, os ROC querem manter o seu atual código de ética em vez de adotar o emitido pela Federação Internacional de Contabilistas através da ‘International Ethics Standards Board for Accountants’, garantindo que o código que usam já é inspirado neste, mas com especificidades para o mercado nacional.
A proposta de revisão do Código dos Valores Mobiliários, que o Governo classificou como a “mais significativa dos últimos 20 anos” foi aprovada em 9 de julho na generalidade, com os votos favoráveis do PS e da Iniciativa Liberal.
A iniciativa mereceu o voto contra do BE, PCP, PEV e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira e a abstenção dos restantes partidos e da deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
No preâmbulo do diploma aprovado em Conselho de Ministros em 13 de maio, o Governo refere que esta revisão “prossegue os objetivos de simplificação, de redução de encargos e de previsibilidade do supervisor”, visando reforçar a competitividade e o desenvolvimento do mercado de capitais, tornando-o mais acessível à entrada de novas empresas.
Entre as várias medidas previstas de simplificação e de redução de custos de contexto inclui-se a alteração do nível das participações qualificadas, eliminando-se o limiar de 2% para a obrigação da comunicação ao mercado, passando este para 5%.
A proposta de revisão do código prevê ainda a instituição do designado voto plural, permitindo a clarificação entre os direitos de voto e os direitos económicos.
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