Portugal pediu para gastar mais em defesa. O que é a cláusula de escape e como funciona?

- Ânia Ataíde
- 17:12
Portugal anunciou que pediu a Bruxelas a ativação da cláusula nacional de escape para investimentos em defesa. Na prática, o que significa e que flexibilização permite ao país?
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O que é a cláusula de escape nacional?
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Qual a diferença entre a cláusula nacional de escape e a geral?
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Por que é que Portugal ativou a cláusula de escape?
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Na prática, o que permite a ativação da cláusula?
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Isto significa que Portugal prevê ter um défice superior a 3%?
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Como é que a Comissão justifica a necessidade de flexibilização das regras?
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Com esta ativação, Portugal e os outros Estado-membros não terão de pagar a despesa em defesa?
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Que despesa com defesa está abrangida?
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Que passos se seguem?
Portugal pediu para gastar mais em defesa. O que é a cláusula de escape e como funciona?

- Ânia Ataíde
- 17:12
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O que é a cláusula de escape nacional?
As regras orçamentais europeias têm previstas duas cláusulas de salvaguarda: a geral e a nacional. Ambas permitem aos Estados-membros desvios temporários aos limites de défice e dívida previstos no Tratado:
– 3% para a relação entre o défice orçamental programado ou verificado e o Produto Interno Bruto a preços de mercado;
– 60% para a relação entre a dívida pública e o Produto Interno Bruto (PIB) a preços de mercado.
Introduzidas após a crise financeira, embora designadas tecnicamente como de “derrogação” ou de “escape” surgem por vezes referidas como “de salvaguarda”.
Proxima Pergunta: Qual a diferença entre a cláusula nacional de escape e a geral?
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Qual a diferença entre a cláusula nacional de escape e a geral?
Ambas permitem uma maior flexibilização no cumprimento das regras orçamentais de Bruxelas e têm de ser coordenadas com o executivo comunitário.
A ativação da cláusula geral de escape é recomendada pela Comissão Europeia, sendo uma regra igual e geral para todos os Estados-membros que os autoriza a desviarem-se da trajetória para as contas públicas em caso de recessão grave na Zona Euro ou na União. Recentemente foi utilizada durante a crise pandémica.
Já a cláusula nacional de escape é pedida pelos Estados-membros, sendo assim específica para cada país, e permite um desvio do cumprimento das regras, em circunstâncias excecionais. A legislação estipula estas circunstâncias como “eventos exógenos imprevisíveis e fora do controlo do Estado-membro, que tenham um impacto significativo nas finanças públicas” e “exijam medidas orçamentais anticíclicas”, desde que “tal desvio não comprometa a sustentabilidade orçamental a médio prazo”.
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Por que é que Portugal ativou a cláusula de escape?
Portugal anunciou esta quarta-feira, 23 de abril, que irá pedir à Comissão Europeia a ativação deste mecanismo, uma decisão “consensualizada” pelo Governo em gestão com o PS, o maior partido da oposição.
A decisão surge após a Comissão Europeia ter proposto aos Estados-membros a flexibilização das regras orçamentais para o aumento do investimento em defesa durante quatro anos, a partir deste ano.
O executivo comunitário apelou a que todos os países ativassem a cláusula de escape até ao final de abril, mesmo os que não correm atualmente riscos de incumprimento dos limites de défice. O objetivo é que, deste modo, os Estados-membros libertem financiamento público e mobilizem verbas adicionais para investimento em defesa de até 1,5% do PIB para cada ano de ativação, sem estigmas.
Proxima Pergunta: Na prática, o que permite a ativação da cláusula?
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Na prática, o que permite a ativação da cláusula?
A ativação da cláusula de salvaguarda nacional permite aos Estados-membros desviarem-se das trajetórias de despesa líquida estabelecidas nos seus planos de médio prazo ou da trajetória corretiva ao abrigo do Procedimento por Défice Excessivo, quando tal se dever a um aumento das despesas em defesa.
Deste modo, as despesas relacionadas com esta até ao limite de 1,5% do PIB não serão contabilizadas na avaliação do cumprimento do valor de referência para o défice (3%).
Os montantes exatos são determinados quando os dados sobre a sua execução estiverem disponíveis, a fim de garantir que a flexibilidade adicional seja utilizada apenas para o fim a que se destina. Os países evitam também assim ter de rever os planos nacionais já aprovados.
Proxima Pergunta: Isto significa que Portugal prevê ter um défice superior a 3%?
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Isto significa que Portugal prevê ter um défice superior a 3%?
Portugal registou um excedente orçamental de 0,7% do PIB em 2024 e o Governo conta ter um saldo positivo de 0,3% este ano e de 0,1% no próximo. Apesar de instituições económicas como o Banco de Portugal e o Conselho das Finanças Públicas preverem um défice de 1% do PIB no próximo ano, mesmo se o cenário se concretizar, o país não estará em risco de entrar em Procedimento por Défice Excessivo (PDE).
Em entrevista recentemente ao ECO, o ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, salientou que a ativação da cláusula “dá maior margem de execução de despesa em defesa, mas não tem necessariamente que ser usada”.
Bruxelas tem destacado que a ativação do mecanismo “é particularmente relevante para os Estados-membros com dívida superior a 60% do PIB, para os quais existem limitações à consideração de fatores relevantes na avaliação do cumprimento do critério do défice”.
Proxima Pergunta: Como é que a Comissão justifica a necessidade de flexibilização das regras?
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Como é que a Comissão justifica a necessidade de flexibilização das regras?
O executivo comunitário liderado por Ursula von der Leyen considera que “a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia e a sua ameaça à segurança europeia constituem circunstâncias excecionais fora do controlo dos Estados-membros” e “com um impacto significativo” nas suas finanças públicas, nomeadamente “através do aumento incorrido e/ou planeado nas despesas de defesa”.
“Dado que todos os Estados-membros são afetados por esta situação excecional e, com vista a maximizar o impacto na prontidão de defesa da UE e na capacidade de produção da indústria de defesa, todos os Estados-membros são convidados a utilizar a flexibilidade de forma coordenada”, argumenta.
No entanto, além da margem adicional para as despesas de defesa, as regras orçamentais europeias continuarão a funcionar normalmente. Ou seja, desvios com despesa com outras áreas continuarão a ser registados na conta de controlo dos Estados.
Proxima Pergunta: Com esta ativação, Portugal e os outros Estado-membros não terão de pagar a despesa em defesa?
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Com esta ativação, Portugal e os outros Estado-membros não terão de pagar a despesa em defesa?
A ativação permite apenas que quando Bruxelas avalia as contas nacionais não contabilize a despesa total com defesa (incluindo quer o investimento, quer as despesas correntes) na sua análise, incluindo a financiada através do Programa SAFE, com empréstimos a taxas de juros mais favoráveis.
A despesa em que Portugal incorrer para aumentar o investimento em defesa continuará a contar para a dívida pública e terá de ser paga, mais cedo ou mais tarde.
Proxima Pergunta: Que despesa com defesa está abrangida?
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Que despesa com defesa está abrangida?
A análise de Bruxelas assenta nas estatísticas do Eurostat baseadas no Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais e irá utilizar as estatísticas compiladas ao abrigo da “divisão 02 – Defesa da COFOG”, um conceito próximo do agregado utilizado pela NATO.
Esta definição abrange o aumento das capacidades de defesa dos Estados-membros, seja através da implementação de novos equipamentos e infraestruturas militares, seja através do aumento do efetivo militar e da melhoria da sua formação.
A Comissão Europeia permite também que no caso de contratos para equipamento militar serem assinados durante o período de ativação da cláusula, mas a entrega ser posterior ao fim dos quatro anos da cláusula, a flexibilidade deverá também aplicar-se também, desde que os contratos correspondentes tenham sido assinados durante o período de ativação da cláusula e com base em relatórios precisos dos Estados-membros em causa.
A flexibilidade permitirá um desvio do caminho de despesas acordado equivalente ao aumento das despesas de defesa (incluindo investimentos e despesas correntes) desde 2021.
Proxima Pergunta: Que passos se seguem?
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Que passos se seguem?
A Comissão Europeia irá agora avaliar e validar os pedidos submetidos pelos países, emitindo recomendações ao Conselho, que tem depois quatro semanas para dar ‘luz verde’ à ativação da cláusula por maioria qualificada. Nessas recomendações, o Conselho deve especificar um prazo para o desvio da trajetória de despesa líquida.
Quando o prazo para o desvio for atingido e se as circunstâncias excecionais persistirem, o Conselho pode prorrogar por até um ano o período durante o qual cada Estado-membro pode desviar-se da trajetória de despesa líquida definida pelo Conselho. No entanto, pode autorizar essa prorrogação mais de uma vez.