Paulo Macedo volta a criticar a hipótese de o Novobanco poder ir parar a mãos espanholas. Diz que não há uma obsessão com a liderança mas que é importante a Caixa continuar a ter uma grande dimensão.
O Novobanco vai mudar de mãos em breve e isso pode mudar o xadrez de poder da banca em Portugal, se uma instituição com peso relevante for o comprador. A Caixa Geral de Depósitos não está fora do processo mas também não se compromete, até porque esse é um tema que “passa pelo acionista”, ou seja, o Estado.
Em entrevista ao ECO, Paulo Macedo diz que não há “nenhuma obsessão da liderança”, mas vê “alguma importância de dimensão” e “importância de ter sinergias”. E, “portanto, se há outros bancos que vão ter muito mais sinergias, obviamente isso também nos põe em termos concorrenciais de uma maneira mais desfavorável”, diz. E alerta que mais de 50% da banca nacional poder ficar em mãos espanholas seria “estranho”.
Sobre o negócio da Caixa Geral de Depósitos, o responsável defende que, se não se concretizarem grandes surpresas negativas, o ano vai voltar a correr bem e o Estado a receber generosos dividendos.
Paulo Macedo é um dos finalistas do prémio de melhor CEO nos IRGAwards 2025, iniciativa da Deloitte e que tem o ECO como parceiro, tendo mesmo conquistado essa distinção em 2024.
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Que perspetivas de negócio é que o banco tem para este ano? Sei que o banco está prestes a apresentar resultados.
O ano está a correr de uma forma positiva em termos de negócio, em termos de volume de negócios. Está, como seria de esperar, com efeitos na margem derivados da redução das taxas de juros.
Mas estamos a ver um ano, como acho que já disse isto há dois anos, com menos resultados recorrentes. Mas achamos que vai ser um ano que se vai conseguir – a menos que materializem as piores perspetivas – ter um resultado que vai continuar a ser significativo e que vai possibilitar pagar um dividendo, mais uma vez, expressivo ao Estado e um valor de impostos sobre os lucros expressivos ao Estado.
E também fazer crescer o valor da própria Caixa. Hoje em dia há aí tantas avaliações que avaliam os bancos em nove e dez vezes os resultados ou a 1,4 vezes o price to book, portanto é fazer as contas e ver quanto é que isso daria. Se aplicarem as mesmas metodologias que aos outros, sai ali um intervalo claro.
Há de ser apresentado em breve um novo plano estratégico, não é? Em que ponto está?
O novo plano estratégico está em preparação. Há questões que nós precisamos lidar que não dependem propriamente de um novo Conselho de Administração. Mas, por outro lado, o novo Conselho de Administração da Caixa e o acionista têm de validar o novo plano estratégico.
Portanto, o que lhe posso dizer é que o plano estratégico tem uma grande parte de concepção feita, diria, a 90 e tal por cento. Depois há alternativas que têm que ser afinadas com…
Discutidas com a equipa já composta, não é?
Exatamente.
A Caixa estar estável dá uma estabilidade ao sistema financeiro português enorme. Para o bem e para o mal, a Caixa tem mais de 20% de quota de mercado, em alguns sítios vai a 31, apenas com o crescimento orgânico
E hoje em dia, em 2025, qual é o papel que a Caixa tem no sistema português? O Paulo Macedo tem sempre dito uma frase que já é famosa, que não quer que a Caixa passe a ser uma caixinha. Mas o que é que isto quer dizer? É só uma questão de dimensão, de quota de mercado?
A Caixa tem vários papéis, desempenha vários papéis que eu acho que são muito importantes. Desde logo, a Caixa estar estável dá uma estabilidade ao sistema financeiro português enorme. Para o bem e para o mal, a Caixa tem mais de 20% de quota de mercado, em alguns sítios vai a 31, apenas com o crescimento orgânico nestes últimos anos e, portanto, a estabilidade do sistema financeiro e da Caixa parece-me muitíssimo importante.
Depois há também uma parte que é relevante: os investimentos públicos podem ter retornos e serem, entre aspas, bons negócios para além de terem objetivos macroeconómicos e de estabilidade do país. A Caixa devolve dinheiro aos contribuintes, assegura uma rentabilidade e tem um ativo que vale bastante mais hoje do que o que valia – de acordo com essas contas, que se fazem por aí que não comento, poderá ter um valor de 15 ou 16 biliões, se aplicar os múltiplos que se andam aí a aplicar.
Não é indiferente, por exemplo, quando nós vemos o contributo dos dividendos para o Estado no sistema empresarial público, em que a Caixa tem, digamos, um papel. Por outro lado, também frisar que o que importa é ter uma gestão profissional e com condições também, com meios, e não se a gestão é pública ou se é uma gestão privada.
Por outro lado, a Caixa não ser uma caixinha é importante em termos de dimensão. Porque, por exemplo, a Caixa, no ano que passou, 2024, aumentou os depósitos a prazo. Foi dos primeiros em finais de 2023, princípios de 2024, que fez publicidade nos jornais para mostrar que não tinha vergonha nenhuma de dizer quanto é que pagava.
E, obviamente, temos um peso grande no mercado e os concorrentes veem o que nós fazemos. Por exemplo, este ser o terceiro ano que nós não aumentamos comissões, quer dizer que, em termos reais, as comissões têm baixado. Temos este fator de influenciar.
Depois, enfim, a Caixa tem vários papéis que as pessoas, de vez em quando, esquecem. É a market maker da dívida pública portuguesa. Tem funções únicas como receber depósitos obrigatórios de acordo com a lei. E tem o seu contributo para o Orçamento do Estado para os deputados portugueses decidirem onde é que vão gastar esse dinheiro.
Tudo isso são contributos importantes e, por outro lado, também tem uma cobertura do território português maior que qualquer outro dos quatro grandes bancos portugueses.
Esta questão do retorno do investimento feito na Caixa quebrou um certo mito de que o investimento em empresas públicas é sempre mau?
Pois é, há outros exemplos positivos e não vou ter essa pretensão. Agora, este talvez pela dimensão, é mais visível pelo investimento que se fez. Investiu-se muito dinheiro público e também se investiram mil milhões de dívida privada, não é?
A Caixa pagou toda a dívida privada, já pagou toda. Pagou, através de dividendos, todo o investimento em cash feito na Caixa e, como lhe digo, se este ano correr como nós esperamos, os dividendos para o ano voltarão a ser significativos e serão significativos no futuro, se não acontecer nenhum game changer total.
Mas terá ajudado um bocadinho a desmistificar esta questão?
Acho que sim, até houve algumas questões sobre isso, de pessoas de diferentes partidos que defenderam que uma gestão profissional podia também ter bons resultados noutro tipo de empresas públicas.

Falou na questão dos depósitos, das comissões. É sempre visto que a Caixa deve ter um certo papel equilibrador e influenciador no mercado, nomeadamente nas condições que proporciona. Como é que se consegue conciliar esse papel de quase de regulador, entre aspas, do sistema com uma postura concorrencial que a Caixa tem e que o Dr. Paulo Macedo sempre defendeu abertamente?
Mas nós reguladores é que não somos, já temos quem nos regula, temos muita gente a regular-nos. Agora temos o nosso peso pelo número de clientes, temos três milhões de clientes, portanto, obviamente, as nossas decisões de preço afetam o mercado e quando nós vemos, por exemplo, o valor de comissões cobrado por volume de negócios, a Caixa tem dos mais baixos.
Por exemplo, isentamos imensas transferências de crédito à habitação, isentamos a compra de habitação de certas comissões, em certas circunstâncias, temos isenções para pessoas com certo tipo de rendimentos mínimos. Somos líder de mercado, olhe, no único sítio onde os outros bancos não gostavam de ser líderes de mercado, que é nas contas de serviço mínimos. Na Caixa não nos importamos nada de ser líderes de mercado aqui.
Portanto, temos uma postura clara de que sabemos que o nosso peso tem um efeito no mercado, embora não sejamos reguladores, nem queremos fazer dumping, nem nada. Quando digo que a Caixa tem que estar em concorrência, a Caixa não vai, obviamente, fazer as operações que os outros não querem, isso seria uma total tolice. A instituição quer-se robusta.
A sua pergunta tem inerente aquilo que muitos portugueses pensam: “Ah, a Caixa também para que é que dá um lucro tão grande? Se desse ali um lucro de 100 ou 200 milhões já era bem bom”.
Se desse um lucro de 100 ou 200 milhões queria dizer que tinha uma rentabilidade de 1% ou dois. 1% ou dois era melhor o Estado fazer um depósito a prazo em qualquer sítio. As pessoas têm que ter noção que a Caixa tem resultados significativos, mas também tem capitais próprios muito significativos. É preciso ver essas duas coisas.
Já falou algumas vezes, nomeadamente em apresentação de resultados, da questão do Novobanco. A perda de dimensão relativa, se acontecer, põe de alguma forma em causa esse papel que me esteve a descrever que a Caixa tem? Isto no pressuposto de um grande banco concorrente ficar com o Novobanco.
Volto a dizer-lhe aquilo que já disse. Acho estranho que a banca espanhola fique com 50% do mercado português. É uma coisa que não estou habituado a ver em outros mercados que conheço e, designadamente, europeus. E, portanto, acho que isso tem que ser ponderado.
Agora, a Caixa tem que ter dimensão e tem que criar valor, não é por haver entidades que se aproximem mais da Caixa. Por exemplo, o Santander comprou dois bancos, nas condições em que comprou, que é público, e, portanto, obviamente, subiu as quotas de mercado. E a Caixa continua a sua vida, a concorrer e espero dar luta e disputar clientes.
Não vejo nenhuma obsessão da liderança, mas vejo alguma importância de dimensão e vejo importância de ter sinergias e, portanto, se há outros bancos que vão ter muito mais sinergias, obviamente isso também nos põe em termos concorrenciais de uma maneira mais desfavorável. Agora, o meu foco é preparar a Caixa para o futuro.
A questão do Novobanco, sim ou não para a Caixa, é uma questão, sobretudo, do acionista, ou não?
A eventual questão do Novobanco passa pelo acionista. Mas a Caixa, e o atual Ministro das Finanças já o disse, tem um papel essencial, como deve ter em termos de propositura, em termos de alternativa, em termos de estudos.
Para habilitar precisamente o que é melhor para a Caixa e para poder também ver o que é que são os pilares de uma eventual decisão desse tipo.
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