O vice-presidente do bancada socialista defende que "mesmo os mais céticos" têm de olhar para o "histórico de 2016". Em entrevista ao ECO, garante que a geringonça passará no teste do CDS ao PE e PNR.
Esta quarta-feira são discutidos no Parlamento o Programa de Estabilidade (PE) e o Programa Nacional de Reformas (PNR). Em antecipação, o deputado socialista que mais protagonismo tem ganho nesta legislatura defende a coesão da geringonça: João Paulo Correia está convencido de que uma votação imposta pelo CDS não terá efeito. Confiante de que o histórico de 2016 se vai repetir, o vice-presidente do grupo parlamentar do PS abre caminho a uma inversão na avaliação das agências de rating já no segundo semestre, acompanhada por uma diminuição dos juros da dívida pública.
Para lá chegar, falta terminar a venda do Novo Banco. Num plano menor, o coordenador do PS na Comissão de Orçamento e Finanças (COFMA) diz que o caso Montepio “foi muito especulado pela comunicação social”. O deputado socialista congratula-se pelos problemas resolvidos na banca, mas reconhece que permanece o problema das imparidades: no entanto, há uma medida no PNR que poderá evitar a criação de um banco mau para o malparado, o que tem vindo a ser estudado, tanto por entraves internos como europeus. No horizonte dos Orçamentos de Estado estarão os escalões do IRS, cujo modelo de revisão — é a vontade do PS — não deverá prejudicar nenhum contribuinte.
As metas dos Programas de Estabilidade de anteriores Governos previram várias vezes um Estado português sem défice. Porque devemos acreditar agora que esta meta será cumprida?O país tem hoje uma última e derradeira oportunidade para provar que consegue ter boas contas públicas e conciliá-las com os principais objetivos da governação. O histórico de 2016 é um histórico que goza totalmente a favor do Governo porque todas as perspetivas apontadas foram cumpridas e algumas delas superadas. Essas razões têm de nos levar a acreditar, mesmo aos mais céticos, que vamos conseguir cumprir as metas orçamentais que estão definidas no Programa de Estabilidade 2017-2021. Há uma credibilidade crescente que é reconhecida tanto no plano doméstico como internacional.
Os parceiros do Governo começaram a apertar o cerco relativamente às mexidas no IRS. O que está a ser estudado para a reposição dos escalões?Brevemente será conhecido o relatório do grupo de política fiscal que foi constituído entre o PS e o BE. Esse relatório dará nota do objetivo. O que pudesse dizer agora antecipava o relatório. O horizonte [de divulgação do relatório] será no mandato deste Governo.
A reposição de escalões é um objetivo que está em cima da mesa, considerado prioritário, mas que tem um impacto orçamental considerável. Poderá ser feito a algumas velocidades. O primeiro objetivo do Governo — penso que isso poderá ser consensual do lado da maioria que apoia o Governo –, numa primeira velocidade seria uma redução da carga do IRS para o escalão mais baixo. Mas tem sempre de se ter em linha de conta o impacto orçamental.
Garante que nenhum contribuinte vai ficar a perder?Essa garantia só pode ser dada pelo próprio Governo. O que eu posso dizer é que do nosso lado, do grupo parlamentar do PS, esperamos que assim seja, principalmente os escalões relacionados com a denominada classe média.
No PE está previsto um aumento de 90 milhões de euros em impostos sobre produção e importação. O que justifica esta subida?No debate desta quarta-feira sobre o PE aguardamos, infelizmente, o mesmo PSD que veio ao debate do PE 2016.
Não estamos a falar de novos impostos. Estamos a falar do aumento da atividade económica que leva a uma subida da receita. Só por altura do OE 2018 é que poderemos constatar se há necessidade de agravar algum desse tipo de impostos indiretos como se fez no OE 2016 e OE 2017, sendo que no OE 2017 foram criados novos mecanismos.
Esta quarta-feira há debate sobre o PE e o PNR no Parlamento. A oposição, nomeadamente do PSD, tem sido destrutiva?Sim, vemos um PSD permanentemente do contra. Vê-se neste momento o CDS a tentar descolar dessa postura pessimista e depressiva do PSD face à política e à economia, mas não vemos o PSD a ceder sequer um milímetro da sua estratégia que está à vista de todos que falhou. No debate desta quarta-feira sobre o PE aguardamos, infelizmente, o mesmo PSD que veio ao debate do PE em 2016.
O CDS vai forçar com um projeto de resolução uma votação sobre o PE e PNR. O PS garante o apoio dos seus parceiros?O projeto de resolução que o CDS apresentou aponta para uma análise crítica daquilo que tem sido o trabalho deste Governo. Aponta também para aquilo a que o CDS chama a necessidade de dar continuidade às reformas do anterior Governo. Estamos convencidos que só esta introdução do projeto de resolução do CDS separa qualquer partido desta maioria de esquerda desse projeto.
Uma das armas da oposição tem sido a utilização das comissões parlamentares de inquérito. Na primeira comissão sobre a recapitalização da CGD espera-se agora a decisão dos tribunais sobre a lista de devedores. O PS teme a divulgação dessa lista?Sabemos que a divulgação da vida comercial da Caixa na praça pública irá levar à degradação da confiança entre os clientes e a CGD. Isso levará à deterioração do valor económico da Caixa e terá um impacto negativo no nosso sistema financeiro. Será um choque em cadeia todo ele negativo e com resultados imprevisíveis.
Se essa decisão dependesse de nós, aceitaríamos a divulgação da lista de devedores mas só com aqueles dados que não afetassem a relação comercial entre os clientes e a Caixa, tal como aconteceu em outras CPI’s. Podia ser um modelo em que nós pudéssemos aceder a um determinado crédito incumprido — pressupondo aquilo que está em causa será o crédito malparado –, selecionar aqueles que de facto têm interesse para os grupos parlamentares e não divulgam o cliente em causa.
Tememos pela divulgação e exposição pública da vida comercial da Caixa na praça pública.
Não se trata de não querer saber o cliente em causa. Trata-se que todos os outros clientes da Caixa passem a esperar, e é legítimo que passem a esperar, que de um momento para o outro até podem ser divulgados os créditos que estão em cumprimento. A divulgação completa de todos os dados dos créditos malparados mina a relação de confiança. Respeitaremos a decisão que for tomada e faremos o nosso trabalho na CPI, mas tememos pela divulgação e exposição pública da vida comercial da Caixa na praça pública.
Que conclusões podem estar no relatório da primeira CPI caso não seja revelada a lista de devedores?A audição ao Dr. Paulo Macedo mais a audição ao Dr. Nogueira Leite — que são duas personalidade insuspeitas do espaço político-partidário — deram um contributo decisivo quanto aquilo que são as conclusões a tirar da CPI. O atual presidente da CGD indicou três justificações para o nível de imparidades: o facto de a Caixa ter de reduzir o seu nível de endividamento para poder operar, o facto de a Caixa ano após ano acumular prejuízos e o facto de se impor novas exigências regulatórias, o que levou a CGD a assumir este nível de recapitalização.
Disse ainda que o grau de incumprimento das grandes empresas e dos grandes créditos a investimentos imobiliários que foram dados pela CGD estão em linha com aquilo que aconteceu nos outros bancos. Prova-se assim que não houve nenhuma euforia ou uma política de pouco rigor. E não houve nenhuma política de favorecimento na Caixa Geral de Depósitos face aquilo que aconteceu nos outros bancos. Esta CPI já tem prova e matéria para produzir as suas conclusões.
O Governo congratula-se por ter resolvido os problema da banca, para lá da CGD, mas ainda não se sabe o impacto nas contas públicas da recapitalização do banco público e da venda do Novo Banco. Como irá o Governo lidar com esses possíveis percalços estatísticos?O ideal é que a capitalização da Caixa e a operação de venda do Novo Banco não pesem sobre a contabilização do défice de 2017, mas isso é uma matéria que não depende exclusivamente do Governo.
No âmbito da venda do Novo Banco, o Governo renegociou as condições do empréstimo do Estado ao Fundo de Resolução. O PS consegue garantir que os 3,9 mil milhões de euros serão pagos pelo sistema bancário?A operação de venda do Novo Banco tem que ser avaliada no global, não de forma parcelar. Esta operação não está totalmente concluída, o que acontecerá em finais de julho, portanto temos de aguardar por essa altura para tirarmos conclusões finais. Nós estamos em condições, à data de hoje, de assegurar que assim seja, que serão os bancos a ressarcir o Estado do empréstimo de 3,9 mil milhões de euros.
Continua a existir um problema transversal a todos os bancos: o crédito malparado. A medida do PNR que define um novo modelo fiscal em que os bancos vão poder abater ao IRC 75% das perdas pelo reconhecimento de imparidades vai ser a solução aplicada?A questão do crédito malparado e do veículo poderá assumir um novo figurino que não a constituição de uma entidade que absorva o crédito malparado.
A questão do crédito malparado e do veículo poderá assumir um novo figurino que não a constituição de uma entidade que absorva o crédito malparado, devido aos entraves que se colocam quer no plano nacional quer no plano comunitário (europeu). Mas acima de tudo o que o Governo pretende, e é esse também o nosso [grupo parlamentar do PS] desejo, é que os bancos possam fazer esse registo de imparidades sem haver obstáculos e essa medida do PNR vai ao encontro disso, de estimular e de garantir que as imparidades são registadas não só de acordo com as exigências regulatórias como aquilo que deve ser a política de saúde financeira de uma instituição bancária.
No novo modelo de supervisão bancária que o Governo está a estruturar, o ministro das Finanças assumiu que quer uma maior intervenção do Governo na regulação. Há quem diga que essa intervenção está a faltar no caso do Montepio. Porquê?O caso do Montepio é um caso que foi muito especulado pela comunicação social. Neste momento não temos nada que nos leve a entrar numa linha de preocupação acrescida em relação ao Montepio. Tudo o que se disser é especulativo. Julgo que quer o Banco de Portugal quer o Governo estão a tomar as decisões que são necessárias, partindo do princípio de que não há um problema maior com o banco, que foi isso que nos foi transmitido pelo Governador do Banco de Portugal em audição na COFMA.
A DBRS pronuncia-se sobre o rating da dívida portuguesa esta sexta-feira. Quando espera uma inversão das avaliações feitas pelas agências de rating?A política do BCE não é uma política que esteja de costas voltadas com aquilo que são as grandes necessidades dos países membros.
Quando estiver concluído o processo de venda do Novo Banco, que será o último passo para a consolidação do sistema financeiro. Quando tivermos a viabilização do PE em Bruxelas e conhecidos os resultados da atividade económica de 2017 e o impacto disso nas previsões de entidades como a OCDE, o FMI e o próprio BCE — confirmando-se os dados de revisão em alta do crescimento do PIB e em baixa do défice –, julgo que por altura do início do segundo semestre poderá ser o primeiro momento em que as agências de rating poderão fazer uma reclassificação da notação que dão ao nosso país.
Todos esses fatores levarão a uma descida dos juros da dívida?Não podemos ignorar o impacto positivo da consolidação do sistema financeiro, a redução do défice nada previstos por todas as entidades e o crescimento económico acima do que era esperado. Tudo isso consolida a relação de confiança entre Portugal e os agentes externos. Não tenho dúvidas que isso levará certamente a uma redução dos juros da dívida pública. É evidente que dando por certo de que não haverá nenhum rompimento da política do BCE.
Mas o BCE já disse que o programa de compra de dívida está a diminuir e vai continuar a diminuir até ao final do ano...Nada invalida que ela [a política de quantitative easing] seja retomada. Julgo que se se mantiverem os fatores que conhecemos hoje, estou convencido que levará a uma redução dos juros da dívida.
O que o leva a acreditar que essa política do BCE vai manter-se?O BCE é uma entidade onde os bancos centrais como o Banco de Portugal têm assento e participam. A política do BCE não é uma política que esteja de costas voltadas com aquilo que são as grandes necessidades dos países membros. A política de quantitative easing foi onde o BCE deu uma grande mostra da necessidade de termos um banco central europeu. Numa altura difícil em que foi necessário injetar liquidez nos mercados, o BCE teve um papel decisivo. Julgo que não vai cortar essa política só por questões dogmáticas. Aí o papel dos Estados membros junto do BCE é decisivo e o Governo tem estado em diálogo com o BCE. O Governo tem provado que está em diálogo com as instâncias europeias e que a sua participação nesse diálogo é até acolhida com sucesso.
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João Paulo Correia: Portugal tem “derradeira oportunidade” para provar que cumpre metas orçamentais
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