“Podemos voltar a testar os mínimos de 2022”

David Afonso, gestor do IMGA Ações Portugal, admite um cenário de recessão. Isso leva-o a adotar uma estratégia mais defensiva para 2023 na gestão do seu fundo de ações nacionais.

A aposta na EDP e na EDP Renováveis no ano passado revelaram-se apostas ganhas por David Afonso, gestor do IMGA Ações Portugal. Apesar de no início do ano não constarem entre as suas “top picks”, as duas empresas foram os títulos que mais renderam aos subscritores do fundo de ações nacionais.

A guerra entre a Rússia e a Ucrânia mudou a abordagem estratégica do fundo e o IMGA Ações Portugal fechou o ano longe da onda vermelha que tomou conta dos mercados acionistas, terminando 2022 com uma valorização de 4,65% e acima dos 2,8% registados pelo principal índice da Euronext Lisboa.

Para este ano, a estratégia seguida pelo gestor começa como acabou, vincadamente defensiva, mantendo a aposta no binómio EDP e com um reforço da posição do setor do retalho, com Jerónimo Martins e Sonae a figurarem entre as três principais posições do fundo.

No pódio da carteira do IMGA Ações Portugal marca ainda lugar a Altri, que David considera ser ainda uma boa aposta para tirar partido dos elevados preços do papel.

No entanto, como antecipa que durante o primeiro semestre do ano as ações possam voltar a testar os mínimos de 2022, David não descarta uma mudança de estratégia do fundo na segunda metade do ano, sobretudo porque uma queda do mercado gera “níveis interessantes para possíveis reforços”.

Estamos a fazer apostas em títulos que esperamos que tenham performances relativas melhores neste contexto desafiante e de elevada inflação.

Em 2022 registaram uma valorização de 4,65%. De acordo com o ranking da APFIPP, foram o segundo melhor fundo de ações nacionais no ano passado. O que correu bem?

O ano passado foi um ano transversalmente negativo para os mercados acionistas e o nosso fundo conseguiu não ser fustigado por essa onda vermelha. Para isso ter acontecido destaco a aposta que fizemos na EDP e na EDP Renováveis.

Quais as razões que o levaram a investir no binómio EDP?

Houve um evento em 2022 que fez com tivéssemos feito esta aposta, que foi a guerra da Rússia com a Ucrânia. Quando iniciámos o ano, estávamos com um perfil muito mais pró-crescimento, muito mais expectante de que as perspetivas de uma nova dinâmica de crescimento pós-Covid se concretizassem, mas a guerra surpreendeu toda a gente e nós tivemos de fazer uma pequena mudança na estratégia do fundo. Mudámos para um perfil mais defensivo e então fomos buscar a EDP e a EDP Renováveis que não tínhamos como “top picks”.

Antes da mudança da estratégia do fundo, quais eram as apostas do fundo para 2022?

Estávamos com mais commodities. Também tínhamos Navigator e Altri, juntamente com as empresas do retalho alimentar. O que fizemos foi reduzir as posições de commodities e passámos o binómio EDP e EDP Renováveis para o topo das posições do fundo.

E o que correu mal em 2022?

A Galp foi o que correu menos bem no ano passado.

Mas a Galp foi o título que mais valorizou em 2022, com uma subida de 48%…

Na altura que mudámos a nossa estratégia também estávamos a perspetivar uma subida do preço do petróleo, que também se veio a verificar, mas como estávamos mais cautelosos em relação à oferta de algumas commodities optámos por nos cingir às alterações da carteira já descritas e não reforçar na Galp.

David Afonso, gestor do IMGA Ações Portugal, em entrevista ao ECO - 12JAN23
David Afonso, gestor do IMGA Ações Portugal, em entrevista ao ECO.Hugo Amaral/ECO

Como está orientada a carteira do fundo para este ano?

Estamos a abordar este início de ano de uma forma mais defensiva. Estamos a considerar que a principal dinâmica que está a afetar os mercados acionistas é a subida das taxas de juro. Historicamente, a subida das taxas de juro está quase sempre associada a uma recessão económica e vejo este risco ainda muito presente.

Que dinâmicas antevê para os mercados nos próximos meses?

Podemos assistir a um aumento da volatilidade e voltar a testar os mínimos de 2022, o que considero serem níveis interessantes para possíveis reforços.

Vê isso a acontecer já no primeiro trimestre?

Diria mais no primeiro semestre. Neste período poderemos tentar encontrar um ponto bom para fazer algum tipo de reforço e até mesmo algum tipo de mudança das nossas preferências. Atualmente estamos a fazer apostas em títulos que esperamos que tenham performances relativas melhores neste contexto desafiante e de elevada inflação. E isso poderá mudar.

Quais são as suas ações preferidas para este ano?

Mantemos a aposta em utilities através do par EDP e EDP Renováveis, temos uma forte aposta no retalho alimentar através de Sonae e Jerónimo Martins, que são ações que normalmente fazem bem em períodos de elevada inflação.

O curto prazo pode ser um pouco mais desafiante. As oportunidades podem de facto surgir no primeiro semestre e, a partir daí, o mercado valorizar mais.

Mesmo num ambiente recessivo como muitos antecipam, considera que a aposta no retalho é uma aposta defensiva?

Em momentos desafiantes acreditamos que o retalho alimentar é o que irá sofrer menos. No caso em particular da Jerónimo Martins, o título tem tido uma dinâmica muito positiva na Polónia com os movimentos migratórios que se têm assistido na Ucrânia e que têm dado um “push” às ações.

Por essa razão o fundo tem uma maior posição na Jerónimo Martins face a Sonae?

São participações muito próximas que variam muito de acordo com as oscilações do mercado. A preferência por a Sonae vai em primeiro lugar pelo retalho alimentar, que é o principal negócio, mas vemos também um “value play” na expectativa de que o valor escondido no título venha a ser desencadeado através de algumas mudanças no portefólio da Sonae.

Como assim?

Consideramos que a nova gestão da Sonae tem arrumado a casa, nomeadamente no encerramento da Worten em Espanha e depois na venda da participação de 25% da Sonae MC. Além disso, o dinheiro que ainda está do lado da Sonae pode ser investido de uma maneira que traga uma rendibilidade muito positiva aos acionistas, quer seja através de novas posições, novos mercados, com reforços em posições que já têm ou até mesmo com uma remuneração extraordinária aos acionistas, que veríamos com muito bom grado.

A carteira de dezembro do fundo mostra também uma sobreponderação da Altri face ao peso que a empresa tem no índice PSI. É atualmente a segunda maior posição do fundo. Porquê?

No pós-pandemia, as disrupções nas cadeias de abastecimento afetaram muito os contentores, particularmente na China, e isso causou muita disrupção nas importações de papel na China que fez com que o preço do papel se mantivesse elevado durante muito tempo. Foi isso que nos fez entrar no título de forma mais vincada no ano passado. Enquanto não tenhamos um sinal mais óbvio de que o ciclo de preços elevados do papel está terminado, achamos que a Altri é uma aposta para se manter.

David Afonso, gestor da IMGA Ações Portugal, em entrevista ao ECO - 12JAN23
David Afonso, gestor da IMGA Ações Portugal, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Mas no passado recente a vossa aposta neste setor recaiu para a Navigator. Porque preferem agora a Altri?

Achamos que esta disrupção das cadeias de abastecimento afeta mais particularmente a pasta e não tanto o papel. O papel também continua com uma tendência mais secular de redução da procura em função da digitalização enquanto na pasta há novos mercados finais como o tissue e o packaging que não entram tanto no negócio da Navigator mas afeta mais o negócio da Altri.

Mesmo havendo uma correção no primeiro semestre, acredita que a Bolsa portuguesa terá um melhor desempenho este ano face a 2022?

O curto prazo pode ser um pouco mais desafiante. As oportunidades podem de facto surgir no primeiro semestre e, a partir daí, o mercado valorizar mais. Mas não ficaria chocado se no final do ano o mercado estivesse na mesma métrica de avaliação.

Que fatores poderiam afetar positivamente os mercados?

No imediato seria haver uma redução mais contundente da taxa de inflação, que permitisse que os bancos centrais não tivessem uma abordagem tão agressiva na subida das taxas de juro e assim evitássemos uma recessão.

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