Redução do IRC une ex-ministros das Finanças de PS e CDS

Alteração estrutural da economia portuguesa vai exigir um forte aumento do investimento, que passa pela redução dos impostos, defendem João Leão e António Bagão Félix.

“A população ativa, se não for compensada com a emigração, vai estar em forte redução nos próximos 20 anos”, alerta João Leão, com grande impacto económico e orçamental. Contrariá-lo vai exigir, entre outras medidas, um forte crescimento da produtividade, defende António Bagão Félix. O ECO juntou os dois ex-ministros das Finanças para um debate, o ECOfin, em parceria com a Yunit Consulting. E ambos defenderam a descida do IRC cobrado às empresas.

O PSD recupera no programa económico para as eleições legislativas a descida do IRC, que promete descer progressivamente até aos 15%. Pedro Nuno Santos propõe baixar as tributações autónomas, que incidem sobre os veículos das empresas. Caminhos que os dois ex-ministros das Finanças aplaudem, em particular a descida do imposto sobre o lucro das empresas, com incentivos ao desenvolvimento económico do interior.

“O nosso IRC, então se o considerarmos com as derramas, é pouco competitivo. Na Europa, os países de leste têm taxas de imposto sobre lucros das sociedades bastante mais competitivos. Portanto, creio que é desejável uma descida dessa taxa. Se é para 15% ou 17%, não quero quantificar, mas essa descida é positiva“, considera António Bagão Félix.

O PSD defende que se elimine, de forma gradual, a progressividade do imposto, uma vez que a taxa aumenta em função dos lucros. Um caminho com que o antigo governante do CDS concorda. “Eu preferia que fosse uma taxa fixa, com alguma bonificação em função de políticas regionais. E não tanto variar em função do montante dos lucros”, afirma.

João Leão concorda. “Acho que faz sentido alguma redução do IRC e ter alguma preocupação, como referido, pela dimensão regional”. O antecessor de Fernando Medina nas Finanças está preocupado sobretudo com a possibilidade de uma redução demográfica e o desafio de sustentabilidade que vai representar para muitas regiões.

Portugal é o país em que é maior a diferença entre a qualificação das pessoas que se reformam, que têm os níveis de qualificação mais baixos da Europa, e as que se formam, que são das mais qualificadas na Europa.

João Leão

Ex-ministro das Finanças

“Portugal é o país em que é maior a diferença entre a qualificação das pessoas que se reformam, que têm os níveis de qualificação mais baixos da Europa, e as que se formam, que são das mais qualificadas na Europa”, assinala João Leão. O que obriga a “alterar a estrutura produtiva e a capacidade produtiva da economia para conseguir ser atrativa. E, para isso, é preciso, nesta fase, o impulso do investimento“, nomeadamente do investimento privado, “que precisa de continuar a crescer para ajudar esta mudança estrutural”.

A redução do IRS também é unânime. “Eu fiz uma conta para 2.700 euros [brutos], que tem uma taxa marginal de 43,5%. Ou seja, o Estado, em abstrato, considera fiscalmente ricas pessoas que são classe média. Importa de facto quebrar com este ciclo de um imposto que de facto é abusivo”, afirma António Bagão Félix.

Os escalões dificultam o elevador social. Qualquer ganho por mérito, por produtividade, muitas vezes suscita o aumento da taxa marginal a aplicar, porque os saltos são umas escadinhas muito pequeninas.

António Bagão Félix

Antigo ministro das Finanças

O PSD propõe a redução das taxas do imposto até ao oitavo escalão. O antigo ministro das Finanças e da Administração Pública no Governo de Pedro Santana Lopes defende a redução dos escalões de IRS. “Nós temos nove escalões. Se considerarmos a taxa adicional de solidariedade são 11. Os escalões dificultam o elevador social. Qualquer ganho por mérito, por produtividade, muitas vezes suscita o aumento da taxa marginal a aplicar, porque os saltos são umas escadinhas muito pequeninas”, diz.

Para António Bagão Félix, a taxa liberatória de 28% aplicada aos rendimentos das poupanças também devia ser revista – “não distingue o especulador, o pequeno aforrador e o investidor institucional, é tudo igual” –, assim como a despesa fiscal. “Será que os 16 mil milhões de dedução, redução de taxas ou de não tributação em determinadas circunstâncias se justificam todos? Aí pode estar incluída e subjacente muita injustiça fiscal e, consequentemente, social”, defende.

João Leão também apoia o alívio do IRS, até porque “Portugal tem o desafio de arranjar formas de ser atrativo para os jovens qualificados se manterem no país”. “É positivo que ambos os lados tenham propostas dirigidas aos jovens. Acho que ainda podem ser reforçadas“, refere. Neste objetivo, junta ainda medidas para incentivar a oferta de habitação pública e privada.

A produtividade como antídoto ao inverno demográfico

A sustentabilidade do sistema de pensões face ao envelhecimento da população e o impacto orçamental é uma preocupação partilhada pelos dois ex-titulares da pasta das Finanças. “Entre pensões e saúde, 50% da despesa do Estado é dedicada aos mais velhos, e bem, mas é extremamente pesado”, assinala o antigo ministro das Finanças de António Costa.

Neste momento, as pensões públicas têm um adversário, que é a demografia. A esse adversário tem que compensar com o aliado que é a economia, a criação de riqueza. Se a produtividade crescer mais do que a deterioração do rácio de dependência resultante da demografia, o equilíbrio é possível

António Bagão Félix

Antigo ministro das Finanças

António Bagão Félix considera que Portugal “deve orgulhar-se das reformas paramétricas dos sistemas públicos de pensões. O ajustamento da idade da reforma, a questão dos prazos de garantia, tudo isso está mais evoluído do que na maior parte dos países europeus”, refere.

Para o também antigo ministro da Segurança Social, a resposta à pressão demográfica está no crescimento da economia. “A verdadeira reforma da Segurança Social é a reforma da produtividade. Ou seja, neste momento as pensões públicas têm um adversário, que é a demografia. A esse adversário tem que compensar com o aliado que é a economia, a criação de riqueza. Se a produtividade crescer mais do que a deterioração do rácio de dependência resultante da demografia, o equilíbrio é possível”, considera.

“Nós temos a taxa de emprego em níveis bastante baixos, perto dos 6%. O grande desafio é que a população ativa, se não for compensada com a imigração, vai estar em forte redução nos próximos 20 anos”, alerta João Leão. O ex-ministro questiona mesmo a previsão da Aliança Democrática (AD) para a evolução do mercado de trabalho. O cenário da AD, que prevê um crescimento do emprego de 1,5% ao ano, só é possível de concretizar se tivermos uma entrada de imigrantes acima de 100.000 por ano. São números bastante elevados”, aponta.

O futuro membro português do Tribunal de Contas Europeu deixa várias questões: “Será que a sociedade quer esta imigração toda? Conseguimos absorver? E será que os imigrantes querem vir? Como é que se consegue, no atual contexto, atrair tantos imigrantes com as dificuldades de habitação que já temos, por exemplo?”

  • Diogo Simões
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