De subsídios a tetos máximos nas rendas, de fundos públicos a Parcerias Público-Privadas, os partidos lançam promessas para todos os gostos para combater a crise na habitação e conquistar votos.
“O país atravessa uma grave crise de acesso à habitação, materializada por um crescimento acelerado de preços e rendas desde, pelo menos, o ano de 2017, sem que tenha existido uma atempada e efetiva resposta de políticas públicas”, reconheceu o Governo PSD/CDS, liderado por Luís Montenegro, na recente proposta de Orçamento do Estado para 2025. O problema está identificado, mas as soluções divergem radicalmente entre os espetros políticos.
Apesar do custo financeiro para a compra de casa estar a cair e encontrar-se no nível mais baixo dos últimos dois anos, continuam a ser muitos os portugueses que se vêm obrigados a abandonar o sonho de ter casa própria ou mesmo de conseguirem arrendar uma casa na sua cidade, devido à contínua subida dos preços da habitação e das rendas.
Em 2024, os preços das casas dispararam mais de 9% em Portugal, enquanto na Zona Euro esse aumento foi de apenas 2% e na União Europeia de 3,3%, segundo dados do Eurostat. Mesmo com a implementação de pacotes legislativos, a oferta de casas no território nacional continua a ser insuficiente para atender à procura, transformando a habitação num dos temas mais quentes no debate político por parte dos partidos que concorrem às eleições de 18 de maio.
A redução do IVA da construção para a taxa mínima de 6% surge como um dos raros pontos de convergência entre as diferentes forças políticas, ainda que com contornos diferentes entre partidos.
Os partidos do espetro da direita (AD, Chega e Iniciativa Liberal), por exemplo, apresentam propostas focadas na redução da carga fiscal, incentivos a proprietários e estímulo ao setor privado, sem grande intervenção direta do Estado no mercado. “A intervenção pública com vocação de estabilização deve ser através da subsidiação dos arrendatários que precisam e não do castigo generalizado dos proprietários”, revela o programa eleitoral da AD – Coligação PSD/CDP-PP (AD).
Já os partidos à esquerda (PCP, PS, Bloco de Esquerda e Livre) defendem maior intervenção estatal na construção e regulação de habitação, controlo de preços, limitação da especulação imobiliária e um forte papel do Estado como promotor direto. O PCP propõe, por exemplo, “um forte e permanente investimento em habitação pública, concretizado com a mobilização de fundos públicos, com o valor anual de 1% do PIB”.
A redução do IVA da construção para a taxa mínima de 6% surge como um dos raros pontos de convergência entre as diferentes forças políticas, ainda que com contornos diferentes entre partidos.

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AD: Mercado e PPP como solução
A coligação Aliança Democrática (AD) apresenta um programa que privilegia o papel do mercado, propondo a criação de parcerias público-privadas para construir e reabilitar 59 mil habitações acessíveis até 2029 e alojamento para estudantes, referindo inclusive a “aposta num programa de PPP para a construção e reabilitação em larga escala”, lê-se no programa eleitoral.
Entre as principais propostas está também a redução do IVA das obras de construção e reabilitação para a taxa mínima de 6%, a flexibilização das “limitações de ocupação dos solos” e a criação de um “regime excecional e temporário de eliminação ou redução de custos tributários em obras de construção, ou reabilitação em imóveis destinados à habitação permanente, independentemente da localização em ARU [Áreas de Reabilitação Urbana]”.
No arrendamento, a coligação PSD/CDS pretende estabelecer contratos a longo prazo com fórmulas de atualização das rendas “acessíveis a investidores e a proprietários particulares”, além de propor mecanismos mais rápidos de resolução de litígios em caso de incumprimento, nomeadamente através do reforço e qualificação do Balcão Nacional de Arrendamento, do recurso a meios extrajudiciais e julgados de paz e “ainda mecanismos de tutela urgente para situações excecionais e urgentes.”
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PS: Habitação pública com recursos da Caixa
O Partido Socialista (PS) propõe “criar instrumentos permanentes de financiamento da construção de habitação pública, especialmente dirigida à classe média, jovens, trabalhadores deslocados e estudantes do ensino superior”, através de uma dotação anual financiada por parte dos dividendos da Caixa Geral de Depósitos (CGD).
O objetivo, segundo o programa eleitoral do PS, é “ampliar as soluções já postas em prática pelo Partido Socialista” e garantir uma resposta contínua ao problema, por forma a aumentar o parque habitacional público através do programa “Revive Habitação”, utilizando casas devolutas do Estado.
Reconhecendo que “a construção pública ou a reabilitação de imóveis públicos deve escalar de forma significativa”, o PS aposta no papel das autarquias, que “com recursos, podem construir habitação para a população de rendimentos intermédios”, reforçando a descentralização e adaptando a resposta às necessidades locais.
Pedro Nuno Santos também prometeu que, caso forme Governo, irá “uniformizar o acesso aos apoios ao arrendamento” e que a respetiva base de incidência seja alargada para mais pessoas, deixando claro de que “não há uma bala de prata” e que é preciso “recorrer a todas as respostas possíveis” para enfrentar a crise na habitação.
Além da criação de um Código da Construção, o PS propõe também uma taxa mínima de IVA de 6% “para projetos de habitação a custos controlados, individuais ou coletivos, e a isenção fiscal para as rendas a preços acessíveis”.
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Chega: Abolição de impostos sobre imóveis
O Chega apresenta um programa focado na redução fiscal de uma forma quase transversal, propondo medidas como a “isenção de IMI para a habitação própria e permanente de imóveis cujo valor patrimonial não exceda os 400 mil euros” e “a isenção de IMT e Imposto de Selo para os jovens até aos 40 anos e não aplicar critérios distintos entre os membros do casal quando um destes tem idade superior”, num claro alargamento à medida colocada em prática pelo Governo desde o ano passado.
O partido de André Ventura também defende a revogação do Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis (AIMI) e propõe incentivos fiscais aos senhorios, numa abordagem que privilegia a diminuição da carga fiscal como solução para a crise.
Além disso, o Chega propõe ainda uma “maior fiscalização na atribuição de habitação pública e “uma garantia bancária de 0% de juro no crédito à compra da primeira habitação para jovens pais portugueses, até perfazerem 35 anos.”
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Iniciativa Liberal: Desbloquear o mercado com menos burocracia
O Iniciativa Liberal aposta numa solução centrada na simplificação da legislação e redução da burocracia para aumentar a oferta de habitação, defendendo uma “política habitacional focada no aumento da oferta” e propõe “facilitar a construção para baixar preços”, refere o partido de Rui Rocha no seu programa eleitoral.
Entre as medidas propostas está a redução e simplificação da carga fiscal “valorizando trabalho e investimento”, que inclui a eliminação de burocracias no licenciamento e a simplificação dos processos de construção.
Para fomentar o mercado de arrendamento, o Iniciativa Liberal propõe a criação de incentivos fiscais para os proprietários que coloquem imóveis no mercado de arrendamento, defendendo a previsibilidade e estabilidade legislativa para aumentar a confiança dos investidores, e a reversão das limitações e controlos excessivos sobre rendas.
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PCP: Controlo de preços e investimento público massivo
O Partido Comunista Português (PCP) apresenta um programa intervencionista, propondo um “forte e permanente investimento em habitação pública, concretizado com a mobilização de fundos públicos, com o valor anual de 1% do PIB, canalizado para as necessidades de construção, reabilitação e manutenção a concretizar no quadro de um Programa Nacional de Habitação”.
No seu programa eleitoral, o PCP defende medidas imediatas “para fazer baixar o valor das rendas” através da “fixação de valores máximos das rendas em contratos em vigor e novos contratos, a revogação da ‘Lei dos Despejos’, a estabilidade dos contratos fixando em 10 anos o período mínimo para a sua duração”.
Além disso, o PCP revela que vai propor a revogação da alteração à “Lei dos Solos”, assim como “medidas para travar a especulação imobiliária em zonas de influência de grandes infraestruturas públicas ou investimentos privados.”
Destaca-se ainda a proposta para baixar os valores das prestações dos créditos à habitação por uma intervenção ao nível da redução de spreads e comissões bancárias e ainda “combater a procura especulativa” por via da eliminação “do regime fiscal dos residentes não habituais, limitando a aquisição de habitação por fundos imobiliários e os usos afetos ao turismo.”
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Bloco de Esquerda: Rendas a preços controlados e mais casas públicas
Para responder à crise da habitação, o Bloco de Esquerda propõe um conjunto de medidas centradas no controlo dos preços, no aumento da oferta pública e na proteção dos inquilinos. A principal proposta é a criação de tetos às rendas, estabelecendo valores máximos consoante a localização e características dos imóveis, tanto para novos contratos como para renovações.
O partido de Mariana Mortágua defende ainda dar poder aos inquilinos para denunciarem contratos ilegais, garantindo proteção contra retaliações e simplificar a lei do arrendamento para facilitar a regularização do mercado informal. Propõe a reintrodução de um prazo mínimo de cinco anos para contratos de arrendamento e o reforço dos subsídios ao arrendamento enquanto não se verifica uma descida efetiva das rendas.
Para aumentar a oferta de casas acessíveis, o Bloco de Esquerda mantém o desígnio do seu programa eleitoral para as eleições de 2024, que aponta para que 25% da nova construção seja destinada a arrendamento acessível e propõe a mobilização imediata de edifícios públicos devolutos para habitação a custos controlados. Defende também a proibição da venda de casas a não residentes e uma moratória à construção de novos hotéis em zonas de pressão habitacional até 2030, bem como limites ao Alojamento Local.
No plano fiscal, o Bloco de Esquerda propõe eliminar benefícios fiscais à especulação imobiliária e aos fundos de investimento, alargar a isenção de IMI para habitação própria e reduzir o IMT na compra de casa para habitação permanente.
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Livre: um fundo de 1.000 milhões por ano para habitação pública
As propostas do Livre para a habitação são centradas no reforço do parque público, na regulação do mercado e na proteção dos mais vulneráveis. O programa eleitoral do partido de Rui Tavares propõe a criação de um Fundo para as Políticas para a Habitação Pública, destinado a investir 1.000 milhões de euros anuais “para a habitação pública, com vista a alcançar, a longo prazo, os 600 mil fogos, quer para habitação social como para arrendamento a preços acessíveis”.
Este fundo seria financiado por “sobretaxas aplicadas aos lucros de empresas dos setores da banca, seguros, imobiliário” e pelo aumento da tributação sobre imóveis de elevado valor patrimonial, refere o Livre no programa eleitoral.
Para apoiar o acesso à primeira habitação, o Livre sugere o programa “Ajuda de Casa”, que financiaria até 30% do valor do imóvel, sob a forma de empréstimo de capital próprio, exigindo que “o custo da habitação não ultrapasse o valor médio do metro quadrado aferido pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE) para o município correspondente”, lê-se no programa eleitoral.
O partido defende ainda a revogação da atual garantia do Estado para os jovens na compra da primeira casa, “pelos seus notórios efeitos no aumento dos custos da habitação e pelo limitado efeito no auxílio àqueles que mais dificuldades têm no acesso ao crédito”, e propõe ainda restringir novas licenças para o Alojamento Local, reformular o cálculo do IMI para reduzir a carga fiscal sobre habitação e estabelecer limites para rendas, compatibilizando-as com os rendimentos médios das famílias.
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PAN: da construção pública à inclusão social
Entre as principais medidas do Pessoas–Animais–Natureza (PAN) para resolver a crise na habitação destaca-se o reforço da oferta pública de habitação, com aposta na construção e reabilitação de imóveis para arrendamento acessível, especialmente para jovens, idosos e famílias com baixos rendimentos.
O partido de Inês Sousa Real propõe “reforçar o investimento na construção de habitação pública para arrendamento acessível” e “alargar a oferta de habitação pública, a preços acessíveis, em territórios do interior do país onde existe maior despovoamento”. O PAN quer ainda promover a reabilitação dos bairros municipais e públicos, intervindo não só no edificado, mas também com programas de inclusão social, empregabilidade e acesso a serviços essenciais.
Para combater a discriminação no acesso à habitação, o PAN defende a revisão dos critérios de atribuição de casas públicas, e propõe-se também a criação de incentivos à colocação de imóveis devolutos no mercado de arrendamento, através de apoios financeiros para obras e benefícios fiscais.
Destaque ainda para a criação de “programas piloto de apoio à autoconstrução de habitações” por grupos comunitários, bem como o desenvolvimento de habitação colaborativa e participada, envolvendo os residentes na conceção e gestão dos projetos. O partido defende ainda a necessidade de “reformar o regime jurídico do arrendamento urbano, após ampla consulta pública” e de criar um Fundo de Compensação aos proprietários com contratos de arrendamento socialmente relevantes, mas financeiramente desvantajosos.
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As propostas dos partidos para resolver a crise na habitação
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