O Novo Normal desta semana, assinado por Filipe Santos Costa, antecipa os cenários do Brexit, negociado ou não.
“Brexit significa Brexit”, dizia Theresa May em 2016, quando nem May nem ninguém sabia o que isso significaria. A ex-primeira-ministra sabia o que não iria acontecer depois da vitória do leave: “não haverá tentativas de permanecer na UE, nem tentativas de reintegrar a União pela porta dos fundos, nem um segundo referendo.” Mas não sabia o que iria acontecer. Passados quatro anos, Boris Johnson, o seu sucessor continua sem saber. A UE também. Este domingo talvez se saiba.
Termina este domingo o último deadline para um acordo entre a União e o Reino Unido para um Brexit negociado. Os prazos podem sempre derrapar, e as negociações ser prolongadas outra vez. Mas a perspetiva de um acordo não é grande. A vontade de adiar mais também não. Uma decisão “firme” deve mesmo ser tomada este fim de semana. Boris Johnson já assumiu que “há uma forte possibilidade” de não haver acordo. Ursula von der Leyen disse o mesmo aos líderes dos 27, durante a Cimeira Europeia desta semana.
Este último prolongamento tem tanto a ver com esgotar possibilidades como com o jogo político, para que nenhum dos lados seja acusado de romper o processo. Como escrevia esta semana o Le Figaro, citando fontes diplomáticas europeias, “é como quando estamos perante um doente terminal. Ninguém quer ter a responsabilidade de desligar a máquina”. Mas o tempo está a acabar, e Dominic Raab, o ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, já admitiu que dificilmente haverá novo prolongamento das negociações se a UE não ceder substancialmente nas suas posições. A UE não vê razões para tal. Como diria Macron, les jeux sont faits.
Não é só o tempo que está a acabar, é também a paciência europeia. Não passou despercebido, na quarta-feira, o tom cortante de Ursula von der Leyen quando recebeu Johnson em Bruxelas para mais uma tentativa de salvar as negociações. Um jantar de peixe e legumes, apelidado pela imprensa britânica como a “última ceia”, que começou com a Sra. Europa a ditar as regras:
– Mantenha a distância! – disse Ursula, quando Boris tentou aproximar-se mais do que devia para a foto da praxe.
Fizeram as fotos sem máscara, mas antes a presidente da Comissão Europeia deixou o aviso:
– A seguir tem de voltar a colocar [a máscara]. Tem de voltar a colocá-la imediatamente!
– Você controla isto com rédea curta, Ursula, e muito bem… – respondeu Johnson.
As três questões por resolver
A conversa, disseram fontes diplomáticas, foi “franca”, “animada” e “interessante” – eufemismos para um diálogo que terá sido de cortar à faca. Como escreveu o Financial Times, o jantar de quarta-feira testou ao limite a máxima de que, no Brexit, nunca nenhuma das partes se levanta da mesa. A tentação foi grande. Mas ninguém se levantou. Também ninguém cedeu um milímetro nas três grandes questões que estão por resolver (e que o FT analisa aqui com detalhe):
- Pescas: na negociação sobre os termos em que as frotas pesqueiras europeias podem continuar a aceder aos mares britânicos, Londres exige autonomia de decisão sobre condições de acesso e liberdade para definir os totais admissíveis de pesca nas suas águas territoriais. Todos os anos as frotas europeias que operam em águas britânicas fazem capturas de pesca no valor de €650 milhões – a questão é saber quanto desse valor será “devolvido” aos pescadores britânicos. A proposta de Londres é manter por três anos o acesso à zona entre as 12 e 200 milhas náuticas (mas com quotas mais reduzidas), e impedir o acesso de embarcações não britânicas à zona entre as 6 e as 12 milhas náuticas – o que afetará sobretudo franceses e belgas. Passados esses três anos, Londres quer renegociações anuais – o que a UE recusa.
- Concorrência: esta é questão mais decisiva para o futuro das relações entre a UE e a Grã Bretanha, e aquela em que Johnson joga a hipótese de conseguir o que prometeu no referendo: ter regras próprias para as empresas e economia britânicas, libertar-se do diktat de Bruxelas mas, em simultâneo, poder aceder ao mercado único. Londres exige liberdade para fixar o quadro regulatório em que poderão operar as suas empresas no futuro, independentemente das regulações que a UE decida para o mercado interno. Bruxelas responde que Downing Street pode fazê-lo, mas isso terá um custo: a imposição de quotas e tarifas sobre os produtos britânicos. Se quiser continuar a aceder ao mercado único europeu sem limites e tarifas aduaneiras, o Reino Unido terá de aplicar às suas empresas as mesmas regras sobre ajuda estatal, condições laborais e normas ambientais que são impostas às empresas sediadas na UE. Para Bruxelas, essa é a condição indispensável para “nivelar o campo de jogo” económico (level playing field é a expressão inglesa para este terreno comum, que não beneficie nenhum dos lados). O contrário, diz a UE, seria aceitar um entorse à concorrência. Dito de outra forma: a condição da UE é que tanto as atuais regras como as que venham a ser impostas aos agentes económicos dentro do mercado único sejam acompanhadas por Londres com regras semelhantes. Caso contrário, serão aplicadas sanções. Para Johnson, isso é inaceitável, pois significa a UE continuar a ditar as suas leis económicas ao Reino Unido.
- Resolução de disputas: quais serão os termos de “governação” do acordo que venha a ser alcançado? Qual a legislação aplicável e quais as instâncias judiciais com competência de supervisão e resolução de conflitos? Trata-se de um ponto sensível e atual, pois Londres já tentou violar os termos do acordo de saída da União assinado em outubro de 2019. A proposta de lei de mercado interno com que Johnson avançou já este ano viola o Direito Internacional e as disposições do protocolo de saída da UE relativas à Irlanda do Norte – e o governo britânico assumiu essa violação. Bruxelas avançou com um procedimento contra o Reino Unido, que acabou por recuar esta semana, deixando cair as normas polémicas, numa tentativa de sinalizar boa vontade negocial nesta reta final do Brexit…
Em todos os pontos Londres invoca a defesa da “soberania” para voltar a fazer as suas leis e controlar as suas fronteiras. Johnson fez campanha pelo leave com o slogan “take back control” – devolver aos britânicos a decisão sobre os seus assuntos. Mas para Bruxelas, Londres não pode ao mesmo tempo comer o bolo e continuar a tê-lo: se quer manter o acesso ao mercado dos 27, deve aceitar normas de competição justa entre as empresas de ambos os lados do Canal da Mancha; caso contrário, o RU receberá o mesmo tratamento de qualquer outro parceiro comercial, ao abrigo das normas da Organização Mundial de Comércio.
Mesmo antes de Johnson ter preparado o país, na quinta-feira, para a “forte possibilidade” de saída desordenada, já havia vários sinais de que esse será o desfecho. Por um lado, o nervosismo dos investidores e a instabilidade de libra, dois factos notórios na última semana. Por outro, dentro do Executivo britânico todos os departamentos governamentais foram avisados para a necessidade de prepararem discurso político para os dois cenários (acordo e não acordo). A equipa de Downing Street passou os últimos dias a escrever argumentários defendendo que o melhor é o no deal, e que o melhor é a existência de um acordo – qualquer que seja o desfecho, os discursos estão prontos e o spin político também.
Por fim, foi sintomática a decisão da Comissão Europeia de divulgar o plano de contingência para o no deal. A prioridade imediata de Bruxelas, não havendo acordo, é assegurar a ininterrupção das ligações aéreas e rodoviárias, a segurança aérea e a manutenção do acesso dos barcos pesqueiros da UE às águas britânicas, e vice-versa. Se a Comissão quis, com a divulgação desse plano, acentuar a pressão para uma cedência britânica, estes responderam na mesma moeda, ameaçando não aceitar as regras de transição sugeridas pela UE.
Estamos nisto: Bruxelas avisa que, se não houver acordo, e se não houver acordo sobre o que fazer na ausência de acordo, será o caos – os aviões britânicos podem simplesmente ser impedidos de aterrar em aeroportos da União, e a circulação de pessoas e bens será simplesmente suspensa a partir de 1 de janeiro. Para prevenir esse cenário de doomsday, a Comissão propõe legislação temporária que permita, nos próximos seis meses, que os aviões possam aterrar, as ligações rodoviárias não sejam cortadas, e o acesso das frotas de pescas continue. Em contrapartida, Londres teria de assegurar reciprocidade. O que ainda não aconteceu.
Reino Unido é o mais penalizado
Lendo por estes dias a imprensa britânica, é notório que ninguém tem a certeza sobre o que vai na cabeça de Boris Johnson – a questão é se o próprio terá as ideias arrumadas. Como notava o Financial Times, o fascínio de Johnson pela figura de Churchill – e em particular pelos momentos em que o antigo primeiro-ministro lutou sozinho pelo que entendia ser o bem do Reino Unido – pode tentá-lo a imaginar-se um Churchill dos tempos modernos, em defesa da sua amada “soberania”.
O eleitorado, esse, parece ter hoje ideias um pouco diferentes das que tinha em 2016, quando o leave venceu por pouca margem. A última sondagem, publicada em novembro, indicava que menos de 40% dos eleitores são favoráveis à saída na União. Por outro lado, os indecisos, que estavam na casa dos 20% no referendo de há quatro anos, são hoje menos de 10%.
Mesmo que os negociadores conseguissem tirar da cartola, na 25ª hora, um improvável “acordo”, seria um acordo de mínimos. Johnson tem vendido a ideia de que um acordo semelhante ao que existe entre a UE e a Austrália seria uma vitória, pois garantiria a recuperação da “soberania” inglesa. Mas esse não é um acordo de livre comércio, e Malcolm Turnbull, ex-primeiro-ministro australiano, explicou na BBC que o acordo com a Austrália é simplesmente… mau para a Austrália. As barreiras na agricultura “são muito grandes”, e há muitas “fricções” na área dos serviços. Se for isso que espera o RU, será “uma grande desilusão”. “A relação da Austrália com a UE não é aquilo que a Grã Bretanha quererá do ponto de vista comercial.” Ficou o aviso.
Neste momento, Brexit means hard Brexit. Chegados a este ponto, a futura relação entre as duas partes pode prever mais ou menos tarifas aduaneiras, mas garantidamente não haverá acordo sobre serviços. Ora, os serviços significam 80% da economia do Reino Unido, e são o setor em que o país tem superávite na relação com a UE (quase €20 mil milhões de superávite em 2019, largamente superados por um défice de 105 mil milhões nas trocas de bens).
O divórcio implicará também regulações financeiras distintas dos dois lados, com prejuízo para a praça financeira londrina. Aliás, o futuro da City como um dos dínamos financeiros do mundo está em dúvida. Os acordos que permitiam a Londres servir clientes sediados no continente (o chamado passporting) passaram à história, e na melhor das hipóteses poderá haver um processo de “equivalência”, que permita prolongar esse serviço enquanto a UE considerar que as regras britânicas são tão exigentes como as comunitárias – mas essa “equivalência” poderá ser retirada a qualquer momento.
Neste cenário de imprevisibilidade, a praça londrina já perdeu milhares de postos de trabalho e mais de mil biliões de libras para centros financeiros concorrentes sediados na UE. Em todo o caso, nota a The Economist, “os prejuízos têm sido menores do que se temia”. Isso deve-se ao facto de muitas companhias terem optado por esperar para ver como seria o processo de separação – o no deal pode ser deal breaker… (vale a pena ler este trabalho, também da Economist, sobre o impacto do Brexit na City.)
O impacto económico do divórcio está estudado, e varia entre o mau (com acordo) e o péssimo (sem acordo). Basta recordar que a UE é o principal parceiro do Reino Unido, representando 47% das suas trocas comerciais em 2019. A previsão do governo britânico apontava para uma quebra de 5% do PIB nos próximos 15 anos, por comparação com o que aconteceria se o país permanecesse na UE. Isto, havendo acordo – sem ele, o impacto cresce para 8%.
O Office of Budget Responsibility (OBR), uma entidade independente cujas estimativas costumam ser incorporadas nas previsões do Governo, reviu há duas semanas as previsões de impacto do Brexit, admitindo a probabilidade de no deal. O OBR previa que o Brexit provocasse uma quebra do PIB a médio prazo na ordem dos 4%, desde que houvesse um acordo de comércio; sem acordo, o organismo acrescentou mais dois pontos percentuais a essa perda. Com as consequências previsíveis: aumento do desemprego (mais 1 ponto percentual em caso de no deal), subida dos preços (mais 1,5 pontos percentuais), quebra das receitas fiscais e mais custos com segurança social e outras medidas de apoio social e laboral. Logo, subida da dívida pública. O OBR estima que uma saída sem acordo obrigue o Governo inglês a um endividamento extra na ordem dos dez mil milhões de euros por ano em 2021 e 2022, apenas para responder às necessidades provocadas pelo Brexit.
Más notícias que acrescem à profunda recessão que a economia britânica enfrenta por causa da pandemia. “Esta não é apenas a maior queda da economia em 300 anos, como é o pior momento possível para o primeiro-ministro afundar o Reino Unido numa batalha de última hora com a UE”, escrevia esta semana o The Guardian, num texto de análise com o título “A pior queda da economia britânica em 300 anos não é o melhor ponto de partida para as conversas do Brexit”.
Pode sempre piorar
A verdade é que pode sempre piorar. Sem acordo, o Reino Unido pode enfrentar consequências imediatas como:
- Falta de produtos alimentares. A hipótese foi admitida pelo próprio Governo em julho, num documento sobre o “pior cenário razoável” em caso de saída desordenada. Agora, o Executivo nega que esse risco exista – mas não é difícil imaginar tal a acontecer, se os camiões que transportam bens alimentares para o Reino Unido começarem a ficar retidos na fronteira, seja por interrupção da circulação, seja para cumprirem obrigações alfandegárias que serão reintroduzidas. 30% de toda a comida consumida na Grã Bretanha chega da UE, e a cadeia de supermercados Tesco tem estado a açambarcar produtos alimentares oriundos do continente, para prevenir uma interrupção de fornecimentos. “Estamos a tentar garantir que armazenamos tanto quanto podemos de produtos não perecíveis nos nossos armazéns e nos nossos fornecedores”, confirmou o chairman do gigante do retalho, John Allan.A entrada de produtos frescos no Reino Unido pode passar a demorar mais dois a quatro dias, o que, nalguns casos, inviabiliza a sua importação. Um desses fornecedores é a portuguesa Vitacress, que exporta anualmente 250 toneladas de vegetais a granel para saladas, para além de ervas aromáticas. Em declarações ao Jornal de Negócios, num artigo sobre como as exportadoras portuguesas se estão a preparar para o no deal, o diretor-geral da Vitacress, Carlos Vicente, fala numa “provável disrupção significativa nos portos e fronteiras terrestres”, que pode fazer subir de 40 para 96 horas o período de transporte para o RU. “Uma vez que vendemos produtos frescos altamente perecíveis, o risco de perda total da mercadoria é real. Temos vindo a avaliar todas as ligações marítimas a partir dos portos de Portugal, Espanha e França como alternativas ao atual transporte rodoviário, bem como a hipótese do transporte aéreo, que assegura a rapidez na entrega mas a custos quase proibitivos. A solução a implementar envolverá provavelmente uma combinação das várias rotas disponíveis.” (Pode ver aqui um excelente trabalho do The Guardian sobre as importações britânicas de produtos agrícolas e alimentares, incluindo de Portugal.)
- Aumentos de preços. O patrão da Tesco também previu que “se sairmos sem acordo haverá tarifas, que poderão ser substanciais sobre alguns alimentos” – e apontou para um aumento na ordem dos 5%. Uma previsão que o Governo considerou “alarmista” das declarações do CEO da Tesco. Mas ontem o British Retail Consortium (BRC) avisou que os supermercados e os seus clientes terão de suportar cerca de três mil milhões de libras em tarifas aduaneiras se o RU sair da UE sem acordo comercial. Pelos cálculos da organização, a tarifa média será superior a 20%.
- Confrontos sociais. O mesmo cenário traçado em julho pelo Governo britânico admite que a perturbação causada pelo divórcio com a UE possa provocar agitação social. Um dos grupos de maior risco são os camionistas. A perspetiva é de longas filas de camiões no Sul de Inglaterra, que querem chegar ao continente, e no norte de França, rumo às ilhas britânicas, com burocracia renovada, exigências de documentação que não era pedida há mais de 40 anos, e produtos a deteriorar-se nos contentores.O cenário não é brilhante, mais ainda se se confirmar outra possibilidade admitida pelo Executivo de Londres: falhas no abastecimento de combustíveis. As dificuldades já começaram, devido ao efeito combinado do período do natal, das restrições impostas pela pandemia, e da corrida aos abastecimentos provocada pela proximidade de dia 31. Nos últimos dias, têm-se sucedido as imagens de longas filas de camiões em Dover, para a travessia do Canal. “É assim que as coisas serão?”, questionava o Daily Mail. Que este tabloide tenha defendido ferozmente o Brexit é só mais uma ironia desta história…
E Portugal?
Este é um divórcio em que todos perdem. “O Brexit significa que ambos os lados perdem, mas o Reino Unido perde consideravelmente mais”, diz Lisandra Flach, directora Centro para a Economia Internacional do Instituto de Estudos Económicos de Munique. Um estudo desta instituição, divulgado esta semana, mostra essa assimetria. Desde logo, porque o RU é muito mais dependente das trocas comerciais com os 27, do que o contrário. “Em todos os países europeus apenas uma pequena quantidade de produtos é altamente dependente de importações do Reino Unido. Quer isto dizer que o aumento do custo comercial devido ao Brexit terá um impacto muito menor em empresas dos 27 Estados membros por comparação com as suas congéneres do Reino Unido.”
Mas todos serão afetados. Portugal também. De acordo com outro estudo recente, promovido pela Euler Hermes, líder mundial em seguro de crédito, a saída sem acordo comercial poderá custar a Portugal €433 milhões por ano em exportações. Se o cenário fosse de soft Brexit, o impacto seria de €218 milhões por ano em exportações. O mesmo estudo avalia as perdas globais para a União Europeia em até €33 mil milhões anuais. Os países mais afetados no continente serão:
- Alemanha (€8,2 mil milhões)
- Holanda (€4,8 mil milhões)
- França (€3,6 mil milhões)
- Itália (€2,6 mil milhões)
- Espanha (€2,1 mil milhões)
No caso de Portugal as categorias de produto mais afetadas pela saída sem acordo serão:
- Equipamentos de transporte (perdas anuais de €109,2 milhões);
- Maquinaria e equipamento elétrico (€66,4 milhões);
- Têxteis (€57,1 milhões)
Portugal costuma surgir na segunda linha dos países da UE mais afetados pelo Brexit. Mas o impacto será significativo, como antecipava o estudo publicado em 2018 pela CIP, e coordenado por Augusto Mateus (disponível na íntegra aqui). “Os efeitos podem ser muito significativos, tendo em conta que o Reino Unido é o 4º mercado de destino das exportações portuguesas de bens e o primeiro das exportações de serviços”, frisava esse documento, que previa, em termos globais:
- Reduções de exportações portuguesas para o RU entre -1,1% e -4,5%;
- Reduções de fluxos de investimento direto estrangeiro dirigidos a Portugal entre -0.5% e -1,9%;
- Reduções de remessas de emigrantes entre -0,8% a -3,2%;
A médio-longo prazo, o estudo apontava “um risco forte para as exportações de bens e serviços portuguesas” no pós-Brexit, com “reduções potenciais das exportações globais entre cerca de 15% e 26%, dependendo do tipo de relacionamento comercial futuro que vier a ser estabelecido”. Neste caso, no deal equivale a pior cenário.
Os produtos portugueses com maior risco associado ao Brexit eram:
- produtos informáticos, eletrónicos e óticos
- equipamento elétrico
- veículos automóveis, reboques e semirreboques.
- Com risco médio-alto surgiam produtos alimentares, bebidas, tabaco, têxteis e artigos de vestuário, couro e afins, papel e cartão, produtos farmacêuticos, borracha e matérias plásticas, produtos minerais não metálicos, metais de base, produtos metálicos transformados, máquinas e equipamentos, e mobiliário.
Porém, o mesmo estudo nota que alguns dos produtos cuja exportação para o Reino Unido pode ficar em risco vêem abrir-se oportunidades de crescimento no mercado europeu, graças à previsível perda de posição concorrencial dos produtores britânicos. Os casos mais evidentes são a indústria automóvel e os produtos farmacêuticos.
Enquanto muitos fazem contas em que todos perdem muito ou alguma coisa, há quem procure respostas para uma pergunta que ganha contornos quase existenciais: “como é que acabámos aqui?”. Também há quem se dedique a questões mais práticas. Um leitor do Financial Times escrevia esta semana uma divertida carta ao jornal com as contas do impacto do Brexit no preço do vinho vendido na Grã Bretanha (que é todo importado, de países como França, Itália, ou Portugal). As contas, escreve ele, são suficientes para deixar qualquer um sóbrio. Ou, “em alternativa, podem fazer com que uma pessoa passe a beber”.
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“Brexit significa Brexit”… e prejuízo, incerteza e caos
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