A Década e os Espiões de Deus

A perspetiva é sombria para a Nova Década. Entre os Espiões de Deus, a Década ainda é uma aventura política.

Os loucos anos 20 ficam no século XX. Para além de serem uma década no calendário são também uma legenda sobre o Progresso e a Decadência da Humanidade entre duas Guerras Mundiais. Nas vésperas dos anos 20 do século XXI a atmosfera é absorvida pela Civilização do Prazer lado a lado com a magnitude da Grande Catástrofe Climática. O Prazer e o Medo são constantes da Natureza Humana e a Política tem como função maximizar o Prazer e minimizar o Medo – uma regra básica da Economia Política da Felicidade.

Na contemplação dos Grandes Oceanos cobertos de plástico, o Homem da Década sem Nome, que agora termina, entrega-se ao delírio do veganismo enquanto espanta a putrefacção dos pulmões com o sofisticado vaping em substituição do colérico tabaco. Os Direitos da Mulher transformam-se num Dogma Divino na companhia do Terceiro Sexo e das derivações Trans, tudo impulsionado pela construção política de uma reavaliação social do Género, completa e distintamente separado da Biologia do Sexo.

O streaming ocupa as horas do lazer, mais os dias do fazer, mais as horas para ler, mais os dias para conversar, absorve todo o universo antes ocupado pela interacção social e pelo gesto inútil e dramático de uma simples conversa. Nos intervalos do streaming, os smartphones são o Grande Monumento da Época, omnipresentes, omniscientes, sobrepõem ao Mundo Real um Mundo Virtual em actividade permanente, em velocidade ascendente, uma viagem ao último Planeta das Redes Sociais onde todos os segredos são revelados, inventados, feitos e desfeitos, um Mundo Maravilhoso do Wi-Fi em Alta Definição e Superior Densidade.

As Grandes Aventuras são percorridas com o dedo médio que desliza infinitamente sobre o écran. Apesar da voragem da novidade que consome em permanência potência eléctrica, o erotismo que acompanha as Energias Renováveis é a tendência do momento, a solução para o Futuro quando as Grandes Cidades e os Grandes Continentes acendem a escuridão do Espaço.

Enquanto a Década sem Nome se extingue, a Epidemia da Solidão cresce exponencialmente, os Egos Ocos substituem o Grande Mito do Individualismo, as Doenças Mentais tornam-se parte integrante de um estilo de vida e são controladas com medicação química de baixo custo e acesso rápido – a Engenharia Farmacêutica resolve o problema da Ansiedade. A Consciência da Década que passa pretende apenas escapar à prisão da realidade quotidiana, pretende tão-somente um pouco do prazer exuberante do fugitivo triunfante.

Politicamente a curva da Década está marcada pela Austeridade, pelas Migrações, pelo Populismo. Politicamente a curva da Década aponta para a apoteose de um presságio da culpa, para o apex de um sentimento de ódio sobre o próprio, na forma de um Discurso Político Anti-Ocidental.

O Ocidente é a origem, a fonte, a causa do Apocalipse Planetário e como tal moralmente obrigado a encontrar a solução para todos os males que afligem a Humanidade. O discurso político oscila entre o patético e o absurdo, alterna a euforia e a depressão próprias de uma patologia bipolar. Visto por dentro, o Ocidente parece uma enorme Serpente que, depois de dominar a Tecnologia e o Mundo, começa a devorar-se a si mesma, num movimento circular e constante que leva à extinção civilizacional e à inscrição de um ponto no espaço da História – o ponto assinala o local exacto onde o Ocidente concluiu a seu derradeiro e último gesto. Tal como uma Serpente que desaparece quando se alimenta do seu próprio corpo a partir da cauda, tal como a espiral que resulta quando o Passado e o Futuro se combinam para anular o Presente.

Na Nova Década de 20, o Presente parece querer deslocar-se para o Oriente. Profundamente inspirado no legado e na experiência secular do Ocidente, a China, o Dragão que se opõe à Serpente, absorve os ensinamentos de Jeremy Bentham sobre a Grande Prisão Racional, o Panopticon, desenhada para promover a conformidade social, a disciplina individual, a autoridade do Estado. Visível na ascensão económica da China está a herança de uma versão do Capitalismo de Estado criado e expandido pelo Mundo na forma da clássica tradição do Despotismo Iluminado.

A variante Oriental, a visão Marxista, apresenta a potência de um vírus que se propaga a uma velocidade desumana. A China não pretende ser um Modelo Universal, não pretende apresentar um discurso evangélico comum à Humanidade, e neste particular não reproduz a mentalidade Ocidental. O Modelo Chinês não representa uma alternativa à Democracia Liberal.

O propósito fundamental é afirmar e fazer respeitar o poder da China, independentemente das opções políticas das outras Sociedades e do Mundo. A expansão da China no Mundo não tem intenções missionárias, mas exclusivamente o propósito de afirmar uma hegemonia esplendorosa e uma superioridade inquestionável. A China será um Império, mas não terá qualquer missão civilizadora.

A perspetiva é sombria para a Nova Década. Será uma comédia cósmica se os smartphones e as questões de Género decorassem o declínio do Ocidente. Ninguém aplaude as mentiras e todos gostavam de estar do mesmo lado. Mas estes desejos não são deste Mundo. Entre os Espiões de Deus, a Década ainda é uma aventura política.

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