A imagem de Portugal está em perda

Portugal e as suas cidades estão a cair nos rankings internacionais e o aperto significativo nas regras da imigração pode empurrar-nos ainda mais para baixo.

A imigração tornou-se o alfa e o ómega do país. Dominou o debate do programa do Governo e foi o primeiro grande pacote legislativo aprovado após a tomada de posse.

A predominância do tema tem raízes na política. A reconfiguração do sistema partidário evidenciada nas últimas eleições, com o Chega a passar para segunda força política no Parlamento, não teria acontecido não fosse o país estar a viver “um dos maiores choques demográficos de sempre”, nas palavras da nova ministra da Administração Interna. Não só o número de estrangeiros residentes quadruplicou em sete anos, atingindo 1,6 milhões, como o perfil geográfico da imigração mudou.

Face à urgência de roubar o palco a André Ventura e à sua agenda, o Conselho de Ministros serviu um aperto significativo das regras. A proposta de alteração à Lei da Nacionalidade, que será submetida à Assembleia da República, aumenta o tempo de residência legal para naturalização de cinco para dez anos (sete anos para cidadãos da CPLP). Passam ainda a ser exigidos “conhecimentos de língua, cultura e organização política”, além de uma declaração solene de adesão aos princípios da República. Outra alteração relevante diz respeito ao reagrupamento familiar – a possibilidade de pedir a naturalização para familiares diretos, que passa a ter critérios mais exigentes – , obrigando a pelo menos dois anos de residência em Portugal, exceto se forem filhos.

Não é só estratégia política. A política de portas escancaradas era errada e insustentável. O problema é que mover tanto o pêndulo legislativo também pode trazer dissabores.

A imagem de Portugal junto do talento estrangeiro e, por arrasto a capacidade para o atrair, já conheceu melhores dias. Em 2019, o país conseguiu chegar ao top 3 dos melhores países para expatriados do reputado ranking da InterNations. Na última edição, referente a 2024, Portugal já tinha baixado para a 15.ª posição.

Há seis anos, ninguém nos superava no “sentimento de estar em casa” e éramos terceiros na forma acolhedora como recebíamos os residentes estrangeiros. Essa perceção já está a mudar e ameaça a capacidade de o país acolher o talento de que precisa e que pode atenuar o impacto daquele que sai com a emigração dos jovens qualificados.

O ECO publicou esta semana um trabalho com personalidades do ecossistema de startups e ouviu receios de que este “fechar de portas” dificulte o reforço das equipas e ameace o investimento no país. “O impacto não é só na falta de mão-de-obra, é na própria ‘marca Portugal’, um ativo valiosíssimo na competição global por talento”, afirma Elisa Tarzia, cofundadora da 351 Associação Portuguesa de Startups.

Outro ranking. Na última edição do Global Startup Ecosystem Index, que lista as empresas mais atrativas para o desenvolvimento de startups, Portugal baixou três lugares para a 29.ª posição, Lisboa caiu 24 para a 86.ª e o Porto tombou 20 para a 167.ª. Outro ranking ainda. Lisboa, que chegou a ser a 46.ª cidade com melhor qualidade de vida no Global Livability Index da revista The Economist, em 2020, ficou este ano no 60.º lugar.

Portugal e Lisboa vinham a subir de forma consistente nestes rankings e agora estão a descer de forma acelerada.

Um dos motivos é o agravamento do custo de vida, sobretudo por causa do enorme aumento dos encargos com a habitação. As novas regras de imigração e até os casos de insegurança envolvendo grupos neonazis ou o aumento do discurso de ódio, assinalados pelo Conselho da Europa, também deverão contribuir para baixar a pontuação do país nos inquéritos que servem de base aos referidos relatórios.

Uma tendência que deve merecer uma reflexão por parte de quem tem responsabilidades políticas.

Não dá para ter sol na eira e chuva no nabal, mas o impacto das alterações na Lei da Nacionalidade deve ser monitorizado e, se necessário, voltar a ajustar a legislação.

O Governo promete uma diferenciação para profissionais altamente qualificados, mas não há ainda visibilidade sobre que forma exata irá assumir. Mesmo entre os menos qualificados, será conveniente estar atento à possível falta de mão-de-obra no turismo, restauração ou construção. Quem faria as obras do PRR se não houvesse imigração?

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