A Luciana Abreu é mais importante que John F. Kennedy

Vivemos num tempo em que qualquer porcaria cativa audiências, em que qualquer polémica estúpida dá falatório.

Seriam 100 anos de vida que John F. Kennedy comemoraria esta semana. Alguém, em Dallas, em 1963, ninguém sabe ainda muito bem quem, apesar das inúmeras especulações e teorias da conspiração, disparou sobre o maior ícone que habitou a Casa Branca e com ele se matou o sonho da «Nova Fronteira» e a esperança do que ele poderia ter sido.

Tantas décadas passadas e tanto fascínio continua a despertar por todas as partes do globo. A sua imagem mudou a comunicação política, especialmente na televisão, a sua família marcou gerações e tendências nas revistas sociais. Fez discursos brilhantes, tinha um carisma impressionante e o seu desaparecimento tornou-o uma lenda

Mas também é certo que tinha um lado obscuro, as suas múltiplas doenças que eram tantas como as amantes de Hollywood que teve, que durante a sua presidência permaneceu ocultado. Da sua liderança, que foi curta, o legado em termos políticos é um vácuo, mas deixou uma galeria fantástica de palavras ditas (como diria Mário Viegas) e de fotos inolvidáveis.

Fernando Pessoa, na “Mensagem”, dizia que «o mito é o nada que é tudo». E da sua acção política na Casa Branca, com verdade, não podemos dizer muito. Apenas percepcionar alguns valores de inclusão social, da construção de uma sociedade justa e uma inata aura de líder que chegava a todos e gerava empatia. Ora, no tempo em que tanto sentimos a ausência de grandes líderes isso é um legado que vale ouro.

Mas durante esta semana, em Portugal, para lá de inúmeros temas sem interesse nenhum, e que constituem o top de uma série de agregadores que as pessoas lêem e muitos nem os considero um produto jornalístico, parece que o tema que gerou mais comentários e capas de revista é o drama familiar de Luciana Abreu.

Eu não tiro nenhum mérito, que tenha, à pessoa em causa, mas sociologicamente é importante observar como tanta gente perde tempo com histórias de faca e alguidar, vive as guerras e ofensas entre estas criaturas, saliva com a mesquinhez e a parolice e dá gás a um tema que nem em rodapé surgirá nos acontecimentos de Maio de 2017 daqui a 100 anos.

Vivemos num tempo em que qualquer porcaria cativa audiências, em que qualquer polémica estúpida dá falatório. É tempo da imprensa, que eu tanto admiro e defendo, ter a capacidade de não ir atrás do fácil e do que não dá trabalho. Compreendo muito bem as dificuldades da mesma, não gosto de ver as redacções a encurtar e a perder cabelos brancos, mas a imprensa deve estar ao serviço do público e não ser apenas seu seguidor sem barreiras de qualidade, sem separar o trigo do joio.

Saúdo o jornal I por na semana passada ter dedicado todos os dias a um tema de John F. Kennedy e gostava, enquanto leitor, que se eliminasse o que não interessa das agendas mediáticas. Há muita coisa para divulgar, para criticar e elogiar. A lenda de Kennedy diz-nos que a sua presidência pretendia um mundo melhor e com mais paz. As polémicas estéreis não prestam para nada, não servem a comunidade, são um entretenimento vão e fugaz. Ao contrário do que parecia em Portugal, num mundo em que queremos viver a Luciana Abreu não é mais importante que John F. Kennedy.

Nota: Por decisão pessoal, o autor não escreve de acordo com o novo acordo ortográfico

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