A Web Summit não é a esponja dos nossos problemas
O Omo é que lavava mais branco, a criação do senhor Paddy Cosgrave não serve para branquear a realidade.
Eu sou favorável aos grandes eventos em Portugal e entendo há muito, e já o escrevi no ECO, que o turismo é o nosso ouro negro, logo, a Web Summit é uma organização que devemos acolher bem e estimular para que cá continue. Todos sabemos que tem custos, mas, esses, são amplamente compensados pela promoção internacional do nosso País e pelo estímulo que aporta à nossa economia.
Porém, a Web Summit não é a Ilha da Fantasia (agora até a podem rever na RTP Memória), onde tudo acaba bem e o toque de Midas não acontece para todos os empreendedores que apostam nessa conferência. Sabemos também que a taxa de start-ups que se transforma em sucesso é baixíssima, abaixo dos 10 por cento. O sonho e a ambição fazem mover o mundo, no entanto, é bom que todos tenham os pés bem assentes no chão e não entrem em “trips” tecnológicas que podem terminar numa reabilitação pesarosa.
O que é irritante é o clima em torno do evento. Valha a verdade que pouco importa a qualquer português o que pensa um jovem estrangeiro sobre Portugal quando só o contacta por umas horas. E, assim, as horas que se perdem com microfones à frente das suas bocas são tão estúpidas como o tempo dado a opiniões de adeptos de futebol à porta dos estádios, que só servem para encher chouriços com um monte de imbecilidades e lugares-comuns.
Estes poucos dias de invasão não podem ser uma dose de qualquer pastilha de euforia que abafa os problemas reais que enfrentamos. Nem temos de quase pedir desculpa para continuar a viver a nossa vida e as nossas cidades, enquanto um bando de deslumbrados circula todo o dia com o seu cartão do evento pendurado ao pescoço como se pertencessem a um qualquer círculo de eleitos ou seita de Charles Manson de smartphone em punho.
Os deuses adoram ironia à custa de vidas humanas e no meio do clímax do evento tecnológico, somos assaltados por uma doença do século passado que já provocou dois mortos. E, depois, os corpos dessas vítimas de Legionella ainda são retirados do velório pois não tinha sido feita a autópsia, é inacreditável de tão ridículo. Ainda subsistem dúvidas sobre o que aconteceu em Tancos, desaparece e aparece armamento sem qualquer explicação, sem responsabilidades devidamente apuradas. E temos em mãos uma árdua tarefa, quase só ao alcance de um Marquês de Pombal dos tempos modernos, que é a reconstrução e reordenação de uma importante faixa do nosso território, assassinada às mãos de uma criminosa indústria dos fogos que se alimenta da tragédia humana e de perdas praticamente irrecuperáveis.
A vida continua, devemos desenvolver e fazer crescer as nossas aptidões, estar em constante aprendizagem e estarmos abertos ao novo e a Web Summit serve para isso. Mas não é a esponja dos problemas de um País. O Omo é que lavava mais branco, a criação do senhor Paddy Cosgrave não serve para branquear a realidade. Que aproveitemos o evento sem o deslumbramento de parolos nem olvidando que Portugal segue dentro de momentos.
Nota: o autor escreve segundo a antiga ortografia
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