
California’s Portugal Startup Love, uma colaboração crescente
Portugal não tem de ser uma cópia de mais nada. Pode ser, está a ser, um ecossistema com identidade própria, mas aberto ao mundo.
Em junho, a RedBridge Lisbon organizou em São Francisco o evento “California’s Portugal Startup Love”, no clube privado de investidores e empreendedores SHACK15. Contou com mais de 140 participantes, com um propósito muito claro: dar visibilidade ao ecossistema português junto da comunidade de inovação da Califórnia, cada vez mais atenta ao que se passa deste lado do Atlântico. E o resultado superou todas as expectativas.
Este evento foi parte de uma semana de atividades e encontros, onde estiveram presentes fundadores portugueses, membros da diáspora, parceiros académicos, investidores e mentores internacionais. Tivemos connosco a Empowered Startups, uma empresa canadiana que desenvolve programas de incubação com universidades em vários pontos do país, como Leiria e Coimbra, e que pôde testemunhar o valor dos projetos que nascem da investigação e se transformam em startups, muitas vezes em articulação com investidores estrangeiros. Foi também uma oportunidade para apresentar fundadores portugueses a membros da nossa rede internacional, criar pontes para futuras colaborações e proporcionar momentos de mentoria e aprendizagem com referências globais.
Portugal aparece cada vez mais como uma alternativa preferencial, pela qualidade de vida, segurança, custo relativo, mas também por algo mais difícil de quantificar: uma cultura de colaboração, partilha e entreajuda que é, nas palavras de vários empreendedores e investidores com quem falei, “semelhante à de Silicon Valley nos seus primeiros tempos”.
No fundo, o que ficou patente foi a empatia e curiosidade genuína da comunidade californiana por Portugal. E essa curiosidade está a crescer por várias razões. Por um lado, o atual contexto político e social nos EUA está a levar muitos americanos, em especial na Califórnia, a procurar alternativas: seja para viver, diversificar investimentos ou criar novos negócios noutros ambientes. Segundo dados da Embaixada dos EUA e da AIMA, em 2017 havia 2.888 cidadãos norte-americanos registados em Portugal. Em 2024, esse número já ultrapassava os 20.000 — mais precisamente, 20.959 —, sendo que só em 2023 foram regularizados 4.800 novos residentes.
Portugal aparece cada vez mais como uma alternativa preferencial, pela qualidade de vida, segurança, custo relativo, mas também por algo mais difícil de quantificar: uma cultura de colaboração, partilha e entreajuda que é, nas palavras de vários empreendedores e investidores com quem falei, “semelhante à de Silicon Valley nos seus primeiros tempos”. E a verdade é que reconheço e partilho a ideia de que há traços culturais no ecossistema português que despertam empatia entre quem viveu os tempos fundadores do vale californiano. A abertura à colaboração, a capacidade de mobilizar talento em torno de missões comuns. Estes são ativos valiosos e raros. Talvez por isso, muitos encontrem em Portugal uma espécie de saudade antecipada – não de um lugar onde já estiveram, mas de um espírito que reconhecem e desejam reencontrar. Um espírito de comunidade, propósito e reinvenção que, para muitos, já não sentem no mesmo grau no seu próprio ecossistema.
Portugal é também cada vez mais visto como uma porta de entrada para a Europa. E isso torna ainda mais relevante a Estratégia Europeia para Startups e Scaleups, recentemente apresentada. Medidas como o Regime Europeu 28º, que permitirá operar sob um conjunto único de regras nos vários países da UE, ou a European Business Wallet, que facilita o acesso digital a licenças e certificações em qualquer Estado-Membro, são exatamente o tipo de ferramentas que os empreendedores internacionais procuram quando pensam em escalar para a Europa. Juntam-se ainda iniciativas como os vistos rápidos para fundadores e talento altamente qualificado, o diferimento de impostos sobre stock options e a simplificação da Blue Card — todas pensadas para atrair talento e remover fricções à mobilidade empreendedora.
Mas há um ponto que continua a emergir de todas estas conversas e que, para mim, é talvez o mais importante. Sempre que falo com fundadores ou investidores com experiência nos dois lados do Atlântico, ouço a mesma equação: para criar um ecossistema vibrante, são precisos três ingredientes: talento, dinheiro e mindset. Sobre o talento, não há dúvidas: Portugal tem-no em abundância. Temos universidades de excelência, centros de investigação altamente produtivos, talento técnico e criativo reconhecido globalmente. Sobre o capital, há uma convicção partilhada: o dinheiro segue a oportunidade. Se o talento for bem aproveitado, o financiamento acabará por aparecer, seja europeu, americano ou de outras geografias. O verdadeiro desafio é o mindset. E é aqui que mais podemos, e devemos, evoluir.
Os empreendedores californianos que conhecemos partilham com orgulho as suas histórias de várias “vidas”: empresas que falharam, dívidas superadas, novos começos. Essas experiências são parte da sua identidade, não são marcas de desconfiança, são marcas de resiliência.
O que falta, muitas vezes, é encarar o risco com naturalidade, perceber que a ambição não deve ser penalizada, que o falhanço pode, e deve, ser encarado como uma aprendizagem valiosa. Precisamos de apoiar quem quer escalar, celebrar quem consegue e dar espaço a quem precisa de tentar mais de uma vez. Os empreendedores californianos que conhecemos partilham com orgulho as suas histórias de várias “vidas”: empresas que falharam, dívidas superadas, novos começos. Essas experiências são parte da sua identidade, não são marcas de desconfiança, são marcas de resiliência.
Este tipo de mentalidade — mais aberta, mais corajosa e menos punitiva — pode ser um dos maiores ativos que Portugal pode absorver através desta ponte com a Califórnia. A boa notícia é que estamos no momento certo para o fazer. Temos talento, temos visibilidade crescente, temos medidas estruturais a ser lançadas na Europa e temos a atenção de quem já percorreu este caminho noutros ecossistemas. Falta apenas sabermos aproveitá-la com visão e continuidade.
Portugal não tem de ser uma cópia de mais nada. Pode ser, está a ser, um ecossistema com identidade própria, mas aberto ao mundo. E esse equilíbrio é talvez a melhor fórmula para um futuro sustentável, competitivo e verdadeiramente inovador.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
California’s Portugal Startup Love, uma colaboração crescente
{{ noCommentsLabel }}