Museu do Mundo

A estabilidade política é uma pausa hipócrita enquanto os exércitos políticos se posicionam para o conflito. Distraídos e alienados, os portugueses são as flores de estufa em vésperas de tempestade.

Entre o oásis e o país dos outros, o Governo falha mas ainda não é um fracasso. A política portuguesa entra numa nova fase em que o princípio da incerteza é a regra e é a lei. Uma fase de estabilidade que em Portugal se confunde com a estagnação domina o espírito político da época.

A estabilidade para o PS resume-se ao PS no poder. Logo a estabilidade política é uma pausa numa guerra sem fim entre projectos políticos alternativos, mas convergentes numa vaga ideia de democracia. Para o PCP a estabilidade perde-se no passado soviético e tudo o que se assiste em Portugal é um retrocesso civilizacional nas conquistas dos trabalhadores. Para o PCP a democracia liberal é a afirmação pseudo-democrática das forças do capital. A estabilidade para o Bloco é a Revolução, a supressão definitiva e violenta das estruturas de dominação ao serviço de uma classe burguesa que pratica exclusivamente a forma política do exctrativismo económico. O Mundo bloquista é uma planície de igualdade com todos os sinais da erradicação da pobreza absoluta. O Bloco representa uma espécie de “net zero” da pobreza pela acção da redistribuição e da confiscação.

O zero absoluto é a estabilidade absoluta, o ponto de congelação do movimento em política. E em política o movimento é o princípio de tudo – o princípio da justiça e o princípio da injustiça. Erradicar o movimento em política é amputar a Humanidade com os seus erros e fracassos. A sociedade perfeita é uma sociedade estática. Portugal sente-se bem numa sociedade estática onde só a palavra política parece ter movimento, mas um movimento que não tem consequência.

A estabilidade para o CDS é um oratório da política do passado. Ordem, respeito, bons-costumes, um discurso legalista que apenas serve para produzir uma falsa confiança que não sobrevive ao confronto com o Mundo moderno. O passado é um país distante e diferente, um lugar onde ninguém gostaria de viver, como uma cela decorada como uma sala de um Palácio do Tempo para se evitar o choque da realidade. Para a Iniciativa Liberal a estabilidade é um planeta sem impostos, uma rua comercial em pleno século XIX onde circulam produtos e programas de todo o Mundo. Cosmopolita nas intenções, provinciana nas declarações, a “Intervenção” Liberal é uma ideia de produção de riqueza que chega com anos de atraso. Numa visão optimista, os Liberais são as soluções dos governos de Margaret Thatcher numa época em que Thatcher é memória que ninguém pretende recordar. Os Liberais são vítimas de um jet-lag teórico e prático, histórico e histérico. Mas Portugal é assim, infinitamente anacrónico.

A suprema estabilidade para o PAN é a religião da Natureza, a supressão poluente da presença e da actividade humana. É o regresso ao paraíso perdido, a felicidade do Estado de Natureza perfeito, sem tensões, sem conflitos, a harmonia final entre a Humanidade perfeita e a Natureza absoluta. O panteísmo do PAN é uma espécie de Elevador da Glória. O Livre é a estabilidade da Esquerda vanguardista pós-moderna e ecologista que observa na democracia liberal a matriz de uma solução política obsoleta. Para o partido Livre o futuro é a liberdade, a igualdade, a solidariedade, o socialismo, a ecologia e o europeísmo. A estabilidade é assim uma shopping list de valores políticos. Com a papoila como símbolo, existe uma referência quase freudiana aos campos de batalha no final da Primeira Guerra Mundial onde a papoila foi a primeira flor a nascer no meio da devastação da Civilização e do Mundo.

A estabilidade para o Chega é a destruição da estabilidade. A Direita Radical em ascensão na Europa representa o ressurgimento organizado de uma vertente política “neo-reaccionária”. Dirigem-se aos instintos pré-políticos e tribalistas, exploram o ressentimento e uma classe operária esquecida pela Esquerda Pós-Marxista e ignorada pela Esquerda Pós-Moderna das Guerras Culturais e Políticas Identitárias. A estabilidade será sempre a resultante da autoridade política e da uniformização étnica. Este é o novo autoritarismo que se ergue pela Europa e pelo Mundo. O processo político para o Chega é a versão estridente de um death metal Cripto-Revolucionário. O Projecto Revolução morre à Esquerda substanciado pelos fracassos do passado, pelas oportunidades perdidas, pela Desumanidade de sempre. O que se ergue na Europa e no Mundo é o reverso actualizado de um Discurso do Ódio. O Discurso do Ódio não é compatível com uma ideia de democracia nem com uma ideia de globalização nem com uma organização das Relações Internacionais baseada na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Nesta visão política exclusivista a estabilidade é uma derivação do Estado-Nação.

A estabilidade política é uma pausa hipócrita enquanto os exércitos políticos se posicionam para o conflito. Distraídos e alienados, os portugueses são as flores de estufa em vésperas de tempestade.

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