OE23: Ainda a “doutrina” Costa-Centeno

A “doutrina” Costa-Centeno é toda uma lógica de distribuição de benesses com dinheiro que não é do governo, numa prática de tráfico de influências similar à da máfia napolitana.

A última semana foi pródiga em novos documentos “oficiais”. Primeiro foi o acordo de concertação social, muito elogiado em termos políticos, mas pouco concreto em termos de políticas. Depois foi o Orçamento de Estado para 2023, que gerou o burburinho habitual de quem procura avaliar a dimensão das “migalhas” do “bolo”. Esta semana vou focar-me no OE23 e deixo a concertação social para a próxima.

O OE23 continua a “doutrina” Costa-Centeno sobre como fazer austeridade enganando os “papalvos”. Esta “doutrina” foi especialmente desenvolvida a partir de 2016 quando os impostos indirectos cresceram significativamente e o investimento público era anunciado apenas para iludir os parceiros da geringonça, que tinham de votar o orçamento, e os portugueses, que iriam votar nas eleições seguintes.

A sua aplicação aumentou os impostos e cortou o investimento público para um dos níveis mais baixos de sempre, muito menor até do que logo após a falência do país provocada pelos socialistas. Em 2022, a “doutrina” está a manter-se com a fixação dos escalões do IRS e o investimento público a ficar 14%, ou seja, 1.000 milhões €, abaixo do que tinha sido orçamentado.

O grande sucesso desta maravilha da política pública continua a ser aplicado no OE23, mesmo que com cambiantes. Onde antes estavam o investimento público “fingido” e o aumento de impostos indirectos, agora está o investimento público “fingido”, a inflação e o aumento de impostos directos e indirectos.

O aumento de impostos é a variável principal da “doutrina”: os portugueses ficam mais pobres, mas não conseguem perceber que isso é uma consequência das decisões do governo. Para disfarçar, Costa distribui umas migalhas do “bolo” orçamental: as principais medidas ditas “sociais”, que o governo apregoa aos sete ventos, não chegam aos 1.000 M€ e representam menos do que o corte nas pensões que os socialistas estão a realizar e 5 vezes menos do que o que gastaram com a TAP.

Os portugueses estarão significativamente mais pobres em 2023, porque a receita total que o governo prevê retirar à economia privada é de 109 mil M€, mas Costa, com o apoio de comentadores “amestrados”, transfere as “culpas” para a guerra e a inflação nos custos energéticos, e os portugueses continuam a “engolir” a mesma conversa desde 2016.

Mas um exemplo simples torna-o mais claro. O governo anuncia para 2023 uma redução de um escalão do IRS como se estivesse a baixar os impostos, mas o seu efeito de 200 M€ é uma “ervilha” quando comparado com o “melão” que é o aumento dos impostos provocado pela não actualização dos escalões do IRS em 2022. Assim se conseguem títulos de jornais a dizer que o governo baixou o IRS e que o rendimento líquido dos portugueses vai aumentar em 2023, quando na realidade o IRS aumentou e o rendimento líquido dos portugueses diminuiu.

Pior ainda, como o governo não actualizou os escalões do IRS em 2022 e em 2023 irá actualizá-los, mas a taxa de inflação não é ainda conhecida (a previsão do governo de 4% parece optimista uma vez que a guerra não tem fim à vista e os efeitos da política monetária irresponsável ainda não desapareceram), o aumento significativo dos impostos directos juntamente com a subida brutal da receita dos impostos indirectos via crescimento da inflação resulta em que o nível de impostos suportados pelos portugueses é o mais alto de toda a História de Portugal.

Os portugueses estarão significativamente mais pobres em 2023, porque a receita total que o governo prevê retirar à economia privada é de 109 mil M€, mas Costa, com o apoio de comentadores “amestrados”, transfere as “culpas” para a guerra e a inflação nos custos energéticos, e os portugueses continuam a “engolir” a mesma conversa desde 2016.

A verdade é que os portugueses perderam muito poder de compra em 2022 e vão perder mais em 2023, mas continuam a acreditar no que Costa lhes diz. Aqui está mais um exemplo de como os portugueses são os “melhores do mundo”, nas palavras do prof. Marcelo.

Para além de tudo isto, a “doutrina” Costa-Centeno conseguiu transformar o Orçamento de Estado, que deveria servir para apresentar os gastos do ano seguinte, e a forma como serão financiados, num instrumento que é acima de tudo um monumento à falta de transparência, em que a verdade se dilui no meio das ilusões que pontilham as suas páginas.

E para além da propaganda contida nos slides da apresentação feita pelo Ministro das Finanças, o número de páginas do relatório do orçamento de estado mostra também como é que esta ilusão se alimenta. O relatório foi criado para simplificar a sua leitura, tendo em 1998, a primeira vez que foi publicado, 42 páginas. Em 2023 tem 444 páginas, apenas 10 vezes mais. Porquê? Porque a lógica é que quanto mais “palha” tiver, mais difícil se torna para os portugueses perceberem o que lá está.

Em termos práticos, o OE23, e também a concertação social, são como uma distribuição de comida aos pobres e famintos em que o governo anuncia o milagre da multiplicação dos pães com a ilusão de que dá dinheiro a todos os grupos de interesse distribuídos pelas famílias, pelas empresas e até pelo Estado.

No fundo, o primeiro-ministro reforça a impressão que criou desde o início do seu primeiro mandato de que continuamos na mesma “vidinha” de sempre, em que o dinheiro cai do Céu e não custa nada a ninguém, e que os únicos problemas que existem são os que são criados pela conjuntura. De resto, e cito o próprio, “está tudo normal”.

Infelizmente, as reações aos dois documentos não deixam dúvidas. Portugal é cada vez mais uma sociedade “encostada” e “dependente” do Estado, o que é uma tradição de séculos, diga-se a verdade. Onde antes estavam a Nobreza e o Clero, e depois estiveram a Burguesia, os “conselheiros” e as cliques republicanas, está agora a sua versão moderna, os socialistas, uns de matiz mais moderada, outros disfarçados de independentes ou de social-democratas, e outros assumidamente radicais, mas todos à procura das benesses do Estado, ou seja, do dinheiro dos portugueses.

Não é apenas com o ministro Pedro Nuno Santos, que desrespeita a lei que diz que deve ser demitido e continua impunemente no poder, que o primeiro-ministro governa para enganar, não governa para melhorar. A “doutrina” Costa-Centeno é toda uma lógica de distribuição de benesses com dinheiro que não é do governo, numa prática de tráfico de influências similar à da máfia napolitana. É tudo isto que continua com o OE23.

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