Para um novo modelo económico europeu

  • Florence Mangin
  • 3 Fevereiro 2022

A Presidência Francesa da UE tem a ambição de construir as bases de um novo modelo económico europeu. Para uma Europa mais autónoma e capaz de jogar em condições de igualdade com a China e EUA.

Numa altura em que as economias europeias passaram por uma das piores crises desde 1929, nós, europeus, podemos orgulhar-nos da maneira como enfrentámos esse desafio, em particular durante a Presidência Portuguesa da União Europeia (PPUE). Ao coordenar as políticas públicas nacionais e ao implementar instrumentos a nível europeu, para responder às emergências e apoiar a recuperação, protegemos as nossas economias contra o desemprego em massa e iniciámos uma rápida retoma económica.

A crise sanitária também conduziu a uma tomada de consciência. Nós, europeus, fomos confrontados com as nossas fraquezas e dependências de forma concreta. É perante esta constatação que a Presidência Francesa da União Europeia (PFUE) tem a ambição de construir as bases de um novo modelo económico europeu. Para uma Europa mais autónoma, independente, capaz de jogar em condições de igualdade com a China e os Estados Unidos. Mas também uma Europa do crescimento sustentável e justo, que promova os seus valores e o seu modelo. O papel do PFUE é, além de mais e muito em particular, uma questão de método. A nossa responsabilidade é estabelecer um diálogo regular, profundo e atento com todos os Estados-membros, tendo em conta as suas expectativas e preocupações.

Para construir este novo modelo económico europeu comum, devemos primeiro reforçar a autonomia europeia. Para isso, temos um instrumento notável: os Projetos Importantes de Interesse Europeu Comum (IPCEI). Além da denominação, é de sublinhar que são empregos qualificados, fábricas e valor económico em toda a UE.

Em termos concretos, queremos acelerar os investimentos em quatro setores estratégicos: hidrogénio, eletrónica, saúde, cloud. Isso significa acelerar a I&D para sermos pioneiros em inovações disruptivas, bem como relocalizar as cadeias de valor na Europa. Portugal e as suas empresas têm inteiramente aí o seu lugar, o imenso sucesso da indústria de bicicletas é um símbolo forte da capacidade do país para aproveitar tais oportunidades.

Contudo, para produzir precisamos de ter acesso aos componentes básicos. É por essa razão que a PFUE centrou a reunião dos ministros da Indústria europeus, no dia 1 de fevereiro em Lens, no tema dos abastecimentos de matérias-primas da UE: importações, economia circular, aceitabilidade social e ambiental da extração na UE. Com a sua indústria automóvel e as suas reservas de lítio, essencial para a produção de baterias elétricas, Portugal está no centro desta questão.

A nossa autonomia exige igualmente tornar a Europa numa potência digital, continuando a criar unicórnios, não mais à escala nacional, mas à escala europeia. Queremos construir um ecossistema capaz de financiar os atores digitais mais inovadores. Este é o objetivo da iniciativa Scale-up Europe, lançada em 2021 pelo Presidente da República, e da conferência prevista em Paris nos dias 7 e 8 de fevereiro para “construir a soberania digital da Europa”. Também aqui, Portugal tem um papel a desempenhar. Além do seu dinámico ecossistema de start-ups, o país tomou a iniciativa da criação da European Startup Nations Alliance para acelerar o desenvolvimento de start-ups e scale-ups europeias.

Definir os contornos da concorrência leal é outro pilar da nossa autonomia. Concorrência leal que não é sinónimo de modo algum de protecionismo: seria um erro económico, um travão ao nosso crescimento e um golpe ao poder de compra dos europeus. Mas sejamos realistas: a Europa está a investir fortemente na transição ecológica e França, tal como Portugal, tem grandes ambições para a uma economia responsável (tributação justa, diretiva sobre o salário mínimo, igualdade salarial entre homens e mulheres). Se, ao mesmo tempo, a UE importar a partir de países com padrões climáticos e sociais mais baixos, será uma dupla derrota: mais gases com efeito de estufa e menos empregos. Daí a prioridade que damos ao mecanismo de ajuste de carbono nas fronteiras. Daí o nosso compromisso com a tributação mínima das multinacionais.

Por fim, a dupla transição ecológica e digital irá exigir investimentos consideráveis, tanto públicos como privados. Teremos de conciliar a sustentabilidade do crescimento e o financiamento dos investimentos necessários. Estes dois objetivos não são contraditórios, mas, pelo contrário, reforçam-se mutuamente. Hoje, o debate já não tem a ver com a ultrapassada divisão entre as cigarras do Sul e as formigas do Norte, e está claro que aqueles que costumavam ser chamados de “frugais” estão a apostar no investimento. É em conjunto que encontraremos o equilíbrio certo, através do diálogo, da discussão, do compromisso. A implementação do Next Generation EU (750 mil milhões de euros) é, neste aspeto e nestes últimos meses, um dos sucessos notáveis ​​dos europeus e da PPUE.

  • Florence Mangin
  • Embaixadora de França em Portugal

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