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Porque sou um Conservador
Ser conservador significa reconhecer que é necessária uma abordagem realista para garantir que os conflitos não são usados para asfixiar uma ordem pluralista.
Este artigo não pretende tentar reescrever o famoso posfácio de Hayek, mas o período de férias é útil para pensar em coisas para os quais o resto do ano raramente deixa tempo.
Durante o Verão tentei perceber melhor como rotular o pensamento e a prática de vida. Todas as pessoas têm uma mistura de ideias e de convicções que habitualmente não são coerentes entre si. Apenas os fanáticos tentam ser totalmente coerentes, apesar de não o conseguirem e de com essas tentativas provocarem grandes males.
Todos são conservadores quando querem manter o que está bem e mudar o que está mal, e apesar de esta base conservadora ter muitos anos, nunca há a preocupação em defini-la ou em clarificá-la. Mesmo o “meu” Catolicismo teve altos e baixos e nos tempos de juventude andou muito arredado pois as preocupações eram mais mundanas. E hoje ainda o são, pelas condições de vida que temos, mas com a idade fica-se mais sensível a estas questões.
A leitura e o estudo dos últimos anos permitiram alargar os conhecimentos e os horizontes, e reforçaram os pilares onde assentava a base conservadora. Não por necessidade ou por vontade de afirmação pessoal, apenas por curiosidade, a atitude que nos leva a querer conhecer sempre mais, mesmo que muitas vezes o conhecimento de pouco sirva.
As razões de ser um conservador moderado explicam porque não sou libertário, socialista ou liberal, e especialmente de não seguir cegamente ideologias que se podem facilmente transformar em fundamentalismos autoritários e originar desenlaces sangrentos.
Edmund Burke, Michael Oakeshott ou Roger Scruton, as suas ideias e as suas limitações, são disso testemunho e representam uma disposição conservadora moderada que é o que a História e a vida prática aconselham como sendo o mais razoável para conseguir desenvolver Portugal em benefício dos portugueses.
São sete as razões para ser um conservador:
1 – A primazia dos valores morais é a base onde assenta a disposição conservadora, que significa privilegiar a vida e as virtudes como guia para o comportamento, mesmo sabendo que a imperfeição do Homem é uma realidade e não pode ser ignorada.
Um conservador vive em comunidade e é nela e com ela que assume uma relação de confiança com os outros seres humanos e procura o bem comum, no meu caso seguindo os princípios da Democracia Cristã. Há um modelo de perfeição de que os conservadores se tentam aproximar, mas que sabem não conseguir alcançar, e que está em Deus e na religião.
A relação com os outros assenta no respeito mútuo e numa vivência que pode ser de partilha e de compaixão, em que a caritas resulta de valores humanistas que visam, em primeiro lugar, facilitar o acesso universal a uma vida digna. Esta atitude baseia-se em razões morais e não em motivos materialistas ou racionais, ou em direitos abstractos que não podem ser alcançados.
Para um conservador o universalismo religioso sobrepõe-se ao racionalista – defendido por socialismo, libertarianismo e liberalismo – porque não depende só da vontade do homem nem o religioso é hoje tão manipulável como o racional. A consequência do racionalismo universal e do seu relativismo, que pode ser lido como se quiser e por ser subjectivo é mais permeável a um poder dominador, é a substituição de Deus pelo autoritarismo e pelo totalitarismo.
2 – A liberdade de viver, de dizer e de empreender é outra das bases do conservadorismo, mas limitada por valores morais. O sonho existe, mas ser conservador é a procura do que, hoje, é possível e não de ideais utópicos inalcançáveis, e requer responsabilidade com trabalho árduo, autocontrolo e autossuficiência que exigem acção e sacrifício para atingir os propósitos.
A liberdade para o conservador é condição para a prosperidade exercida em comunidades interdependentes e descentralizadas, onde a livre associação entre pessoas facilita a resolução de problemas e a responsabilização valoriza a exigência sobre a complacência.
Inclui a liberdade do negócio – palavra maldita que é apenas a ocupação que se dá à vida – e o mercado livre e a propriedade privada como base de garantia para essa liberdade. E por isso recusa a igualdade de resultados, que não é mais do que a negação da própria liberdade.
Esta liberdade é diferente da socialista, que depende do controlo da sociedade na procura da igualdade e promove a dependência alimentada pelo facilitismo dos subsídios e da indolência, e da liberal e libertária, que a ela colocam poucos ou nenhuns limites. É diferente também porque ser conservador é sobrepor o valor da vida humana à liberdade individual.
3 – A nação soberana capaz de se autogovernar e de traçar o seu próprio caminho de acordo com a sua História, a sua cultura linguística e religiosa, e as suas fronteiras, e capaz de estabelecer uma união entre as diversas comunidades e regiões, providenciar a sua defesa comum e a justiça entre si, e assegurar o bem-estar geral desta e das futuras gerações.
É parte de um mundo de nações interdependentes que cooperam e competem livremente através de tratados, alianças e outras formas que respeitem a independência, dissuadam a agressão externa de poderes autoritários e limitem a influência do internacionalismo liberal ou socialista que procura refazer os outros países à sua própria imagem.
A visão conservadora opõe-se à transferência de soberania para entidades supranacionais – supostamente com grande legitimidade moral, mas que enfraquecem a democracia e o governo representativo, afastam público e eleitores e dão palco a regimes autocráticos. Por isso defendem uma União Europeia de estados soberanos enquanto socialistas e liberais menorizam a autonomia dos governos e os libertários rejeitam a associação.
4 – A família e a comunidade enquanto instituições autónomas e intermédias entre as pessoas e o Estado que asseguram que o poder não está centralizado em poucos, mas descentralizado em muitos, e que assenta na confiança mútua que garante o pluralismo na sociedade e o funcionamento da democracia com maior liberdade para a construção do bem comum.
A vivência em comunidade deve basear-se na interdependência e criar uma barreira em defesa da liberdade, organizando-se em instituições para uma efectiva desconcentração de poder – mercado livre, sufrágio universal, separação de poderes, imprensa independente e livre, Estado de direito, etc. – que proteja as pessoas da coerção centralizada que limita o pluralismo.
E é também pela descentralização na vida política e na sociedade, onde os “pequenos pelotões” – família, igreja, associações e clubes locais – são fulcrais para o florescimento humano no sentido da virtude e da justiça em hábitos de vida particulares, que a nossa comunidade reconhece os problemas quotidianos e dá às pessoas a responsabilidade de fazerem escolhas livres e sensatas.
Por isso, ser conservador significa dar prioridade à família tradicional construída em torno de um vínculo entre homem e mulher e entre pais e filhos, a base civilizacional que permite alcançar as melhores condições de bem-estar e estabilidade que favorecem o nascimento, o crescimento e a educação dos filhos, e revertem o individualismo desenfreado que nos conduz à desintegração familiar, ao declínio do casamento e à desagregação da comunidade.
5 – A tradição de conservar e disfrutar do que é bom e de mudar o que está mal é a essência do ser conservador. As tradições e os costumes são a base da nossa História e da nossa cultura, incluindo-se as técnicas locais, os jogos, as artes, a escrita ou a música, e todas as formas de expressão reconhecidas por uma comunidade ou por um povo.
A visão conservadora está consciente da sua imperfeição por resultarem de interacções humanas, pelo que defende a mudança para melhor sempre que tal seja necessário. Uma mudança incremental ou uma reforma mais ou menos rápida consoante a urgência, que seja justificada e que assente no realismo que reconhece limites à acção e ao pensamento político.
Ao contrário de socialistas e de liberais, recusa a mudança brusca e a revolução baseada em preconceitos idealistas e em utopias perigosas, especialmente se têm a ilusão de que o voluntarismo alicerçado na razão humana pode impor qualquer ideal, e recusa o caos libertário em defesa da estabilidade e da tradição cultural e social.
6 – Um Estado com força para exercer a soberania, mas limitado por restrições morais, religiosas, civis e legais, por valores constitucionais assentes em princípios consensualmente aceites que se destinam a proteger as pessoas, pela separação de poderes, por um sistema judicial independente, por instituições intermédias autónomas e fortes, por partidos políticos concorrentes e por eleições e imprensa livres.
O Estado deve ser pequeno para evitar uma burocracia asfixiante e representar a sociedade de uma forma subsidiária, como na garantia da ordem e da paz – que os libertários recusam. Não faz leis nem deve tentar impor planos racionais em benefício de interesses ou de direitos abstractos – como pretendem socialistas -, o que requer limites ao intervencionismo bem estabelecidos e justificados pelo costume – e não abstractos como querem liberais.
Ser conservador significa defender uma visão humanista e não dogmática da política que distingue sociedade do Estado – ao contrário de socialistas para quem o Estado é o motor da sociedade – e em que o Estado é imparcial e respeita a lei quando serve pessoas e entidades.
7 – A ordem e a estabilidade como uma base realista para lidar com os limites objectivos que causam tensões originadas por diferentes conflitos inerentes ao género humano: espírito e matéria; individual e social; governo e governados; empresas livres e regulação estatal; equidade e eficiência; liberdade e igualdade; estabilidade e mudança, etc.
Ser conservador significa reconhecer que os conflitos nunca podem ser eliminados das nossas vidas e que é necessária uma abordagem realista para gerir as tensões resultantes e para garantir que não são usados para asfixiar uma ordem pluralista. Só idealismos utópicos como o socialismo ou o liberalismo permitem pensar que se podem extinguir da natureza humana.
A existência destas tensões requer que o governo intervenha através de uma política prudente para restaurar a ordem perante a ilegalidade, a imoralidade ou a dissolução do país, ou quando a lei e a justiça tenham sido corrompidas. Nomeadamente, para mitigar ameaças ao interesse nacional, procurar independência em relação a ameaças externas e cultivar as capacidades essenciais para o bem-estar público (e.g. defesa, segurança, alimentação, saúde ou energia).
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