Portugal precisa de uma mudança estrutural e sustentável

Portugal tem de melhorar em todos os níveis e assumir um verdadeiro desígnio nacional, em que cada português tenha a vontade de contribuir para e de usufruir dos benefícios do desenvolvimento.

Se há uma verdade indiscutível e consensual é que os recursos são escassos e por isso devem ser usados de forma inteligente. As pessoas, o conhecimento, o investimento, a tecnologia, os recursos naturais, as capacidades de empreender, desenvolver e inovar, devem ser usadas o melhor possível e de uma forma sustentável para disponibilizar à sociedade mais opções em termos de consumo e lazer, e de produtos e serviços.

O uso mais inteligente dos recursos significa que, com menos recursos, e sem esgotar os que existem, sejam disponibilizados mais bens e serviços de que precisamos para as nossas vidas. Penso em todo o tipo de serviços que vão desde a simples entrega de encomendas até ao apoio ao domicílio na saúde e na acção social, ou desde um mero utensílio de cozinha até aos meios digitais ou aos medicamentos mais recentes.

A este fornecimento de bens e serviços de uma forma mais inteligente e bem organizada chama-se ganhos de produtividade e a sua ausência é um dos problemas estruturais mais graves entre os que afectam a sociedade portuguesa.

O gráfico mostra o que se passou nas últimas décadas com o crescimento da produtividade média por trabalhador em Portugal e a tendência de estagnação que é mostrada pela recta ilustra bem o que é necessário fazer, e o mais urgentemente possível: implementar uma mudança estrutural e sustentável que permita organizar melhor a geração e disponibilização de bens e serviços para que mais pessoas a eles tenham acesso. Ou seja, aumentar a produtividade.

A procura de uma aplicação mais inteligente dos recursos à disposição da sociedade portuguesa tornou-se uma necessidade urgente porque quase foi esquecida nas últimas duas décadas. As condições estruturais que conduzem a ganhos de produtividade são o “calcanhar de Aquiles” da sociedade portuguesa e foram largamente ignoradas nos últimos anos. Estiveram sempre presentes nos discursos políticos do governo com o enaltecimento da educação, da formação, da inovação ou do investimento, mas não estiveram no centro da sua acção política como o demonstram os resultados do PISA, a falta de pessoal com formação especializada nas fábricas, a estagnação do modelo de gestão pública, a opção pelo aumento da despesa corrente em prejuízo do investimento e a ausência de reformas indutoras de ganhos de produtividade.

Alguns grupos da população vivem na ilusão de que Portugal é um país desenvolvido e que, por isso, as preocupações com a produtividade deixaram de ser necessárias. Mas muitos dos mais e dos menos jovens que assim pensam dão por adquirido que já temos tudo e ignoram que em Portugal não se disponibilizam em quantidade suficiente muitos dos bens e serviços de que a sociedade necessita. Há ainda muitos portugueses a quem faltam bens essenciais como a habitação, medicamentos ou uma alimentação equilibrada, e serviços tão simples como segurança ou uma consulta num hospital.

Esta realidade da sociedade portuguesa tem pouco a ver com o viajar pelo Mundo, as tecnologias para comunicar mais facilmente ou a limpeza dos oceanos que enchem a imaginação de muitos, mas ilustram bem que é preciso encontrar uma resposta para situações que são muito diferentes e em que os recursos, por serem escassos, são insuficientes para esse fim.

Daqui resulta que a única resposta que pode satisfazer melhor estes diferentes problemas e melhorar o nível de vida da população portuguesa é a de aumentar os recursos disponíveis e usá-los de um modo cada vez mais inteligente.

E se essa resposta não foi dada nos últimos 25 anos, é agora a altura de realizar uma mudança na estrutura produtiva e de recorrer a um novo modelo que assente na melhoria significativa da produtividade e das condições estruturais de funcionamento da sociedade portuguesa.

Para alcançar um maior desenvolvimento é necessário um novo desígnio nacional baseado num modelo de especialização que permita o acesso a novas fontes de crescimento e que assente na realidade de Portugal, uma pequena economia ainda insuficientemente aberta, mas interdependente e integrada num espaço plurinacional.

O novo modelo requer alterações estruturais significativas que se façam sentir a diferentes níveis da capacidade geradora de riqueza e bem estar, e que libertem a pessoas, aumentando o potencial criador de prosperidade e promovendo a aceleração do crescimento da produtividade, aliando a valorização da procura do exterior com a evolução sustentável da procura interna.

Todos os que produzem e disponibilizam bens e serviços aos portugueses, na agricultura e na floresta, nas pescas, na indústria, no comércio e nos variados serviços públicos, privados e sociais, deverão ser libertos do normativo burocrático e incentivados para gerar soluções que desenvolvam Portugal e condições que permitam melhorar a vida dos portugueses, aumentar os seus salários para um nível digno e salvar o Estado social, fortalecendo-o de forma a poder disponibilizar serviços de qualidade à população nacional.

Esta mudança estrutural passa por transformar a estrutura produtiva e o tecido empresarial, reforçando um ambiente de sustentabilidade, renovando as fontes de energia, desenvolvendo novas formas de criação de riqueza, melhorando a tecnologia e as competências digitais e aumentando a mobilidade num território que seja coeso.

É um processo que vai demorar alguns anos e que terá de ultrapassar desafios e dificuldades também estruturais como a redução e o envelhecimento da população, a cultura de subsídio-dependência e a desvalorização da recompensa pelo mérito e pelo esforço, a aceleração da evolução tecnológica e digital, o melhor aproveitamento dos recursos terrestres e marítimos, e a sustentabilidade ambiental por via do reaproveitamento dos recursos e da transição energética e da descarbonização da actividade económica (sem o histerismo com que hoje é abordada).

Mas a ideia fundamental é que o desenvolvimento requer um melhor uso dos recursos e o maior aproveitamento de oportunidades internamente e no exterior, usando as ligações internacionais como mecanismo de selecção.

O novo modelo baseia-se num crescimento económico mais rápido e numa transformação da estrutura produtiva que garanta a sua sustentabilidade ao longo do tempo, corrigindo as deficiências no uso dos recursos em Portugal que explicam a estagnação no crescimento da produtividade:

  • Uso inadequado do mérito, do esforço, das competências e do conhecimento das pessoas, ao privilegiar áreas da sociedade onde os salários são relativamente superiores, mas o nível de produtividade é baixo e tem menor potencial para crescer;
  • Excessiva subsidiação administrativa de actividades e de empresas com pouca vontade de mudar e de inovar, com pouco interesse para os portugueses e com pouca ou nenhuma viabilidade;
  • Investimento público desperdiçado em áreas “protegidas” das escolhas dos portugueses, como obras supérfluas ou investigação de gabinete sem qualquer utilização nem utilidade para as suas preferências;
  • Insuficiente uso de recursos e conhecimento em actividades e empresas capazes de se orientarem para as necessidades da sociedade e de ganhar dimensão para aproveitar ganhos de escala significativos;

Dado que o retorno potencial de reformas que corrijam estas deficiências é muito grande (o que é confirmado por vários estudos realizados na última década), o aumento do crescimento da produtividade média implica alterar os actuais incentivos dados às pessoas para reduzir estas ineficiências.

Só desta forma se pode alterar o paradigma que foi implementado desde o final dos anos 1990, em que o uso exagerado de incentivos públicos inadequados aumentou a má afectação de recursos a nível económico, exacerbando as ineficiências do mau uso dado aos recursos.

Para isso, Portugal tem de melhorar em todos os níveis – sociedade, economia, empresas, recursos humanos, indústria, serviços, agricultura, mar, investimento, poder local, ambiente, energia, transportes ou digitalização – e assumir um verdadeiro desígnio nacional, em que cada português tenha a vontade de contribuir para e de usufruir dos benefícios do desenvolvimento.

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