
Portugal precisa do liberalismo
Deve caber ao partido liberal português um conjunto de responsabilidades estratégicas que vão além da retórica ideológica.
Esta semana nas minhas idas ao Twitter deparei-me com um excerto de uma intervenção de Sérgio Sousa Pinto (SSP) bastante eloquente, em que este membro do Partido Socialista afirma algo como “estamos fartos de pagar imensos impostos para o SNS depois poder pagar dermatologistas dourados…” no meio de todo um conjunto de estamos fartos, fartos, fartos…ora, isto na boca de um membro do PS (partido que esteve no governo em 23 dos últimos 30 anos) mostra o estado atual do Pais.
Como militante de um partido liberal em Portugal, a Iniciativa Liberal (IL), a intervenção de SSP levantou-me a questão: E o que afirma a IL? O que pretende? É tal claro? Depois de um resultado que soube a “poucochinho” é altura de nos questionarmos: qual o papel da IL neste momento do Pais?
A Iniciativa Liberal (IL) encontra-se, na minha opinião, perante desafios e oportunidades significativas num contexto de instabilidade política, crescente fragmentação partidária e desconfiança em relação às instituições democráticas. Tenho a consciência de que a ideologia liberal, se interpretada com profundidade e pragmatismo, pode assumir um papel relevante na consolidação democrática e na modernização do sistema político e económico português. Deve assim caber, portanto, ao partido liberal português um conjunto de responsabilidades estratégicas que vão além da retórica ideológica e se traduzem em ação política eficaz.
a) Defender o Estado de direito e as liberdades individuais
Num país marcado por ciclos de clientelismo e centralismo estatal – um modelo que chamo de “capitalismo de compadrio”, a Iniciativa Liberal deve assumir a defesa firme das liberdades cívicas, da transparência e do funcionamento imparcial das instituições. Isso implica não apenas combater o dirigismo estatal excessivo, mas também promover reformas que fortaleçam a independência do poder judicial, o combate à corrupção, a responsabilização política, mas também uma economia mais concorrencial e um estado funcionalmente muito mais eficiente. Como destaca Sousa Lara (2021), a democracia liberal só se sustenta com uma estrutura institucional sólida que garanta a separação de poderes e a previsibilidade jurídica.
b) Articular liberdade económica com justiça social
O discurso liberal em Portugal não pode ficar limitado à defesa da baixa fiscalidade e da liberdade de escolha. É essencial mostrar como os princípios liberais podem também gerar resultados inclusivos e sustentáveis. Por exemplo, através da promoção do empreendedorismo, da concorrência nos setores protegidos, da desburocratização e de uma educação pública de qualidade centrada no mérito e na liberdade de escolha. Como sugere Hayek (1944), o liberalismo não se opõe ao Estado, mas ao arbítrio — e um Estado que garante igualdade de oportunidades é compatível com os ideais liberais.
c) Assumir uma visão reformista do Estado
O partido liberal português deve apresentar propostas sólidas para a modernização da Administração Pública, da justiça e dos serviços essenciais. Isso inclui reformas estruturais — como a descentralização efetiva, a reforma fiscal e a reestruturação do sistema político — sempre com base em evidência empírica e com foco na eficiência e na “accountability”. A crítica à “máquina do Estado” deve ser acompanhada de uma visão construtiva sobre como torná-la mais funcional, sem recorrer à destruição sem sentido do serviço público (um exemplo paradoxal de como a destruição desta máquina pode ter consequências bem nefastas foi a iniciativa do PS de acabar com o SEF em 2023).
d) Reforçar a cultura política e a pedagogia democrática
Sabemos que o liberalismo em Portugal ainda enfrenta uma forte resistência cultural, fazendo-se confundir, de forma mal-intencionada e com o apoio dos opinadores de ocasião, como uma ideologia eminentemente elitista e que assenta na desregulação selvagem – o papão do neo-liberalismo. Cabe, pois, ao partido liberal investir na pedagogia cívica, explicando de forma clara o valor da liberdade, da responsabilidade individual e do mérito (assente em igualdade de oportunidades) como fundamentos de uma sociedade mais aberta e dinâmica. Isto é especialmente importante num país com fortes tradições estatistas e corporativas.
e) Posicionar-se como força europeísta e democrática
No plano externo, o partido liberal deve assumir-se como defensor claro da integração europeia, não por subserviência institucional, mas por convicção estratégica. O projeto europeu representa o melhor garante da paz, da liberdade e da prosperidade no continente, e Portugal deve manter-se como parceiro ativo e reformista. Nesse sentido, o liberalismo português deve alinhar-se com os partidos liberais europeus que defendem uma Europa mais democrática, eficiente e comprometida com os direitos fundamentais (Zürn, 2018).
Concluindo, o papel da IL em Portugal não pode ser apenas o de “chamar a atenção” para os problemas do Estado ou da economia. Deve ambicionar influenciar a cultura política, promover reformas institucionais duradouras e oferecer uma alternativa consistente aos modelos esgotados de governação. Para isso, o partido liberal deve combinar princípios com pragmatismo, visão com responsabilidade, e firmeza ideológica com abertura ao diálogo democrático, assumindo-se como um partido de ação governativa que transforme o modelo de desenvolvimento económico-social do Pais.
O futuro vais ser mais liberal, cabe a IL fazer parte desse futuro co construindo-o!
Referências
Hayek, F. A. (1944). The Road to Serfdom. University of Chicago Press.
Sousa Lara, A. de. (2021). Ciência Política e Relações Internacionais: Uma Introdução. Almedina.
Zürn, M. (2018). A Theory of Global Governance: Authority, Legitimacy, and Contestation. Oxford University Press.
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