Ramalho e o ramalhete de favores do Novo Banco ao ex-presidente do Benfica

Pela boca morre o peixe. As escutas judiciais a envolver o Benfica deixam António Ramalho numa posição muito difícil.

Não é de hoje que existem relações promíscuas entre o futebol e a banca. E não é de hoje que existem negociatas e créditos de favor entre o ex-presidente do Benfica e o antigo Banco Espírito Santo.

Em outubro de 2014, o jornal Público escrevia que “eram normais” os jantares na sede do BES entre Luís Filipe Vieira e o administrador financeiro do banco, Amílcar Morais Pires. Morais Pires que em 2013 terá aceitado um convite para ir a Londres assistir à final da Liga dos Campeões, com despesas e viagem de jato privado pagas pela Promovalor, empresa de Luís Filipe Vieira (LFV).

O BES colapsou por causa das negociatas de Ricardo Salgado e depois veio o Novo Banco. Mas as negociatas continuaram, mesmo com o banco na esfera pública. A primeira entidade a alertar para isto foi a Comissão Europeia que, em 2018, escreveu que “mesmo depois da fundação do banco de transição, e sob o controlo direto do Banco de Portugal, o Novo Banco parece ter feito muito pouco para remediar práticas de crédito problemáticas”. Bruxelas falava mesmo em “créditos de favor”.

O resto ficámos a saber graças às investigações judiciais e ao trabalho da Comissão de Inquérito ao Novo Banco que destaparam um sem número de negociatas que prejudicaram o erário público. Várias dessas negociatas envolviam o ex-presidente do Benfica. Aliás, ao longo dos últimos anos criou-se uma espécie de triângulo entre LFV, o Novo Banco e o empresário José António dos Santos, conhecido como o “Rei dos Frangos”, um triângulo por onde passou muito dinheiro e negócios suspeitos.

  1. Em março de 2017, o Novo Banco e a Somague venderam ações da SAD do Benfica ao “Rei dos Frangos” por 1 euro cada. Dois anos mais tarde, LFV decide que o Benfica deveria lançar uma OPA sobre a SAD, o que permitiria ao “Rei dos Frangos” revender as ações com uma mais-valia de 400%.
  2. Outra negociata neste triangulo é a da Imosteps, um negócio que o Ministério Público classificou de “ardiloso” e em que o Novo Banco vende dívida de LFV com um desconto brutal de 90% a um fundo americano, sendo que mais tarde essa dívida de LFV é recomprada pelo “Rei dos Frangos”.
  3. Outro negócio esquisito a envolver este triângulo tem a ver com a Promovalor. A empresa Capital Criativo, da qual chegaram a ser acionistas LFV e o filho, foi bater à porta do Novo Banco para propor a criação de um fundo que ficasse com a dívida da imobiliária Promovalor de LFV. O Novo Banco ficou com 96% deste fundo e LFV com o remanescente. E quem financiou Vieira na aquisição de unidades de participação deste fundo? O “Rei dos Frangos” claro está, para completar o triângulo.

À medida que estes negócios foram sendo conhecidos, começaram a rolar cabeças no Novo Banco.

No despacho de indiciação da operação Cartão Vermelho, conta a revista Sábado, há dois ex-diretores do Novo Banco referidos: Álvaro Neves (suspeito de “relacionamento privilegiado” com os empresários referidos no processo) e Pedro Pereira (referido em escutas como contacto de um consultor de uma entidade ligada à compra de créditos do Novo Banco a LFV). O Novo Banco disse à Sábado que Álvaro Neves foi despedido e que Pedro Pereira está suspenso de funções com processo disciplinar em curso.

Depois surgiu outro nome, o de Vítor Fernandes, ex-administrador do Novo Banco suspeito de ter estado a ajudar LFV nos negócios com o banco. Também foi alvo de buscas no âmbito da operação Cartão Vermelho. Na altura das buscas, questionado sobre a sua alegada relação privilegiada com Luís Filipe Vieira, Vítor Fernandes deu a entender que se caísse, não cairia sozinho: “Nunca almocei, nem jantei sozinho com o sr. Vieira. A única vez que isso aconteceu foi no Estádio da Luz e acompanhei o dr. António Ramalho no encontro com o sr. Vieira. Foi o dr. Ramalho quem tratou disso”.

Sabe-se agora que António Ramalho reuniu-se com Luís Filipe Vieira sete dias antes do ex-presidente do Benfica ter ido à Comissão de Inquérito ao Novo Banco no Parlamento. Ramalho nega ter estado a fazer coaching ao presidente do Benfica e a concertar posições.

Conta o Público que Ramalho terá dito nas escutas que contratou a agência de comunicação Cunha Vaz para “treinar” o seu administrador financeiro, Rui Fontes, antes deste ir falar à Comissão com os deputados. Rui Fontes apresentar-se-á na Assembleia da República com um discurso “monocórdico e chato, porque os gajos não vão perceber nada do que ele vai dizer”, terá dito Ramalho.

Ramalho reconhece ter estado com LFV nas vésperas do inquérito ao BES, assume ter-lhe dado conselhos, mas continua a negar ter estado a fazer coaching ao presidente do Benfica e a concertar posições, como suspeita a inspeção tributária. Fez-me lembrar as palavras de ontem do primeiro-ministro inglês Boris Johnson que reconheceu ter estado numa festa em pleno confinamento, mas que não se apercebeu que aquilo era uma festa.

Agora cabe ao Banco Central Europeu, que está a reavaliar a idoneidade de António Ramalho, acabar com esta festa no Novo Banco à custa do dinheiro dos contribuintes.

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