Redução do IRC: Entre o Possível e o Necessário

  • Miguel Pinto
  • 24 Julho 2025

A meta de 17% em 2028 é um avanço, mas está longe de constituir o tão prometido "choque fiscal". Por que não ir mais longe fiscalmente? E por que não alargar o âmbito das medidas?

O recente anúncio do Governo sobre a descida gradual da taxa de IRC — para 19% em 2026, 18% em 2027 e 17% em 2028 — representa, sem dúvida, um passo na direção certa. Para as pequenas e médias empresas (PME), a redução para 15% sobre os primeiros 50 mil euros de lucro tributável, já a partir de 2026, é igualmente positiva. Num país onde a carga fiscal elevada continua a ser um dos principais entraves à competitividade e à atração de investimento, estas medidas devem ser encaradas como sinais encorajadores. Num tecido empresarial como o português, maioritariamente composto por PMEs, é legítimo esperar que esta decisão possa vir a ter um impacto relevante.

Contudo, trata-se ainda de avanços tímidos face à ambição que Portugal precisa de assumir para se afirmar como um destino competitivo e atrativo no panorama internacional. Neste contexto, impõem-se duas questões fundamentais: por que não ir mais longe fiscalmente? E por que não alargar o âmbito das medidas, criando um verdadeiro “pacote” de ações que promova de forma mais expressiva a competitividade?

A meta de 17% em 2028 é um avanço, mas está longe de constituir o tão prometido “choque fiscal”. Alguns dos países com os quais Portugal compete diretamente na captação de investimento estrangeiro apresentam cargas fiscais mais reduzidas, políticas de incentivo mais robustas e menores custos de contexto. O Governo estima que esta medida terá um custo orçamental de cerca de mil milhões de euros, a ser compensado através do crescimento económico e da contenção da despesa corrente primária. Esta estimativa é plausível, mas apenas se for acompanhada por reformas estruturais profundas e por um compromisso efetivo com a melhoria do ambiente de negócios.

A urgência de agir de forma mais decidida é também confirmada pelos próprios empresários. No mais recente inquérito da AEP (Associação Empresarial de Portugal), 94% dos inquiridos consideraram que a redução da carga fiscal sobre as empresas deve ser uma das principais prioridades do Governo. É um sinal claro de que o tecido empresarial está alinhado quanto à necessidade de criar um quadro fiscal mais favorável ao investimento, à competitividade e ao crescimento económico.

Contudo, a redução do IRC, por si só, não é suficiente. Os desafios enfrentados pelas empresas portuguesas vão muito além da fiscalidade. É imperativo simplificar a burocracia, promover ganhos de escala, apoiar a internacionalização — especialmente num contexto geoeconómico cada vez mais adverso — e eliminar os múltiplos custos de contexto que afetam o dia-a-dia das empresas.

A escassez de mão-de-obra é outro problema crítico, que exige respostas estruturadas ao nível das políticas de imigração e uma maior flexibilidade no mercado laboral — sem com isso confundirmos flexibilidade com precariedade.

O atual contexto internacional, marcado pela instabilidade geopolítica, volatilidade dos mercados, exigências de sustentabilidade da União Europeia e crescente incerteza política, trava decisões de investimento e dificulta a internacionalização. Neste cenário, parece-me evidente que uma redução da carga fiscal — naturalmente ajustada à sua dimensão — pode ser decisiva para inverter esta tendência, tornando Portugal mais atrativo e competitivo.

Por isso, esta descida do IRC deve ser encarada como parte de um esforço mais amplo para reposicionar Portugal na economia global. É essencial que o país transmita uma mensagem clara: queremos apoiar as nossas empresas, permitindo que reinvistam os seus ganhos para se tornarem mais competitivas. Ao mesmo tempo, devemos afirmar que estamos abertos ao investimento, preparados para crescer e verdadeiramente empenhados nas reformas estruturais que a nossa economia exige. Um país que valoriza as suas empresas e lhes oferece condições reais para competir — dentro e fora de portas.

No entanto, esta aposta poderia, e deveria, ser mais ambiciosa. Não por impulso ideológico, mas por uma necessidade estratégica inadiável. A meta dos 15% no IRC não deveria aplicar-se apenas às PMEs, nem apenas a uma fração dos lucros. Esse deveria ser o objetivo para todas as empresas, num horizonte temporal mais curto. Isso sim, seria um verdadeiro choque fiscal, com impacto duradouro no crescimento económico, na criação de emprego qualificado e na transformação estrutural da economia portuguesa.

Aceitar menos do que isso é resignar-se à gestão do possível, quando o que realmente precisamos é de audácia, visão e coragem para acelerar a nossa economia e alcançar uma verdadeira convergência com os países mais desenvolvidos da Europa.

Ainda assim, termino como comecei: embora tímida, esta medida é um sinal positivo. É encorajador perceber que começamos, mesmo que de forma gradual, a trilhar o caminho certo — rumo a um ambiente mais favorável ao crescimento económico e à valorização do nosso tecido empresarial. Resta agora garantir que este seja apenas o início de um esforço mais amplo, consistente e, sobretudo, transformador.

  • Miguel Pinto
  • Engenheiro e Gestor

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