Numa das maiores cidades indianas, a principal tecnológica europeia e um dos grandes bancos portugueses uniram-se numa aliança improvável. Objetivo: ajudar a mitigar as alterações climáticas.
O Novobanco era um nome inesperado de se ouvir pronunciar na Índia. Mas é em Bangalore que a SAP, a maior tecnológica europeia, trabalha numa aplicação capaz de medir a pegada carbónica dos clientes da instituição bancária, com a ajuda da mesma tecnologia que permite funcionar a popular plataforma ChatGPT, testemunhou o ECO esta terça-feira.
A ideia começou a ganhar forma no ano passado e a primeira prova de conceito foi apresentada pela SAP ao Novobanco em maio deste ano. Desde então, os programadores da SAP Labs India, que é o segundo maior polo de inovação da tecnológica, desenharam uma solução que utiliza as transações bancárias para mostrar aos utilizadores o seu nível de emissões de dióxido de carbono (CO2), um dos gases responsáveis pelo aquecimento global.
Aos 24 anos, Vedant Gupta ajuda a desenvolver aplicações de inteligência artificial (IA) a partir desta cidade indiana. E revela, para surpresa do ECO, que o Smart CO2 Converter é “um projeto de co-inovação” da SAP e do Novobanco. “Há sempre algum desenvolvimento da parte deles e algumas melhorias do nosso lado. Por isso, é o típico projeto em que há duas partes envolvidas”, afirma o jovem programador num dos muitos espaços para conversar que existem neste campus, um conjunto de modernos edifícios onde a organização contrasta com o trânsito caótico e com o som incessante das buzinadelas fora das instalações.
Contactada, a SAP Portugal disse ao ECO que, neste momento, a tecnológica “aguarda aprovação superior da administração do Novobanco” para poder avançar para a próxima fase, lançando, possivelmente, esta app no mercado português. Mas não foi possível obteve resposta do Novobanco até ao fecho deste artigo.
“Esta vai ser uma aplicação fornecida pelo banco que os utilizadores finais vão poder descarregar e instalar a partir da Play Store”, explica Uma Anbazhagan, arquiteta de cloud da SAP Labs India, referindo-se à loja de aplicações do sistema operativo móvel Android. O objetivo é que os clientes do Novobanco, ou de qualquer outro banco que decida adotar o conceito, possam medir a quantidade de emissões de CO2 num determinado período, sem que, para isso, tenham de fornecer mais dados do que aqueles que já estão no sistema do próprio banco, pela natureza do que é o setor bancário.
Smart CO2 Converter usa inteligência artificial generativa para dar sugestões aos utilizadores:
Mudar hábitos com tecnologia
A intenção é que, ao visualizarem este tipo de estatísticas, os utilizadores decidam alterar os seus hábitos de vida, reduzindo o respetivo impacte ambiental e ajudando no combate às alterações climáticas, uma ameaça à escala global. A aplicação, desenvolvida na plataforma da SAP, alavanca os dados das transações financeiras dos clientes e usa IA generativa para fornecer pequenos relatórios que podem ser úteis na hora de tomar essas decisões.
“O que a app é capaz de fazer é olhar para as transações em particular – pagamentos com cartão de crédito, pagamentos online e outras atividades – e mapear essa atividade em particular para calcular as emissões de carbono. Depois, a IA generativa dá alguns sumários e estatísticas que o utilizador pode usar para mitigar a sua pegada de CO2. É uma aplicação de lifestyle“, detalha Vedant Gupta, que é graduado em engenharia aeronáutica pela Universidade Técnica de Rajastão e em engenharia aeroespacial pelo Instituto Indiano de Ciências, uma das melhores instituições académicas do país.
Ambos os responsáveis garantem que a solução é segura e mantém em privado os dados pessoais dos utilizadores. Não só a informação é “anonimizada” – isto é, apenas os números são fornecidos ao algoritmo, sem qualquer informação que permita identificar o titular, explicam – como “não se usam dados dos consumidores para treinar o modelo”, promete ao ECO a profissional da SAP, que soma 21 anos de experiência a desenvolver tecnologia na Índia.
Uma Anbazhagan espera que a “simplicidade” desta inovação permita chegar a “muita gente”. “Eu não sei quantas pessoas realmente sabem a sua pegada carbónica e de que forma estamos a ter impacto. Estas coisas são positivas até de uma perspetiva educacional: se as pessoas usarem aplicações como esta, vão, provavelmente, habituar-se e começar a aprender mais”, afirma a arquiteta de software.
O que acontece é que o banco já tem estes dados, com todas as transações que forem feitas, independentemente da aplicação. Há uma camada de anonimização. Os meus dados pessoais, como o número da conta e até o nome, não são fornecidos ao modelo.
Num comunicado divulgado em maio, a SAP explica que o Smart CO2 Converter foi desenvolvido a pensar em clientes entre os 18 e 30 anos, “porque a geração mais nova está bem consciente da situação climática global, mas não necessariamente da sua própria pegada carbónica”.
“Tendo em conta que os movimentos de dinheiro e pagamentos podem dar uma boa indicação da pegada carbónica de um indivíduo, a aplicação está direcionada para melhorar a literacia carbónica dos clientes ao analisar e usar as transações da conta bancária e os comportamentos de despesa numa forma transparente e com significância”, acrescenta a mesma nota.
O conceito desta aplicação foi um dos apresentados aos jornalistas na semana em que a SAP promove em Bangalore, o principal hub tecnológico da Índia, uma conferência para apresentar novidades e estar mais próxima dos clientes, que são negócios e empresas. A TechEd vai decorrer esta quinta e sexta-feira no Bangalore International Exhibition Center, na zona sul deste país que acaba de ultrapassar a China como o mais populoso do mundo, com 1,4 mil milhões de habitantes.
Depois do polo alemão, onde tem sede, a SAP Labs India é o segundo maior centro de inovação da SAP em todo o mundo, empregando mais de 13 mil pessoas. Este é um dos vários campus espalhados pela Índia, inserido numa cidade onde vive mais gente do que a população de Portugal inteiro, quase 14 milhões. Os responsáveis da tecnológica acreditam que a presença da SAP ajuda a dinamizar a cidade a dar oportunidades de emprego e formação aos indianos. A somar a isso, a SAP India, no seu todo, é também a unidade de maior crescimento da empresa alemã, numa altura em que a economia indiana é já a quinta maior do planeta.
Neste polo da empresa, muitos jovens indianos, como Vedant Gupta, metem mãos à obra e desenvolvem tecnologia de ponta para todo o mundo, incluindo soluções com inteligência artificial e assentes na cloud. De acordo com o jornal financeiro local The Economic Times, um quarto de todas as patentes da SAP são produzidas em Bangalore e, apesar de pouco conhecida do público em geral, a SAP é uma das maiores fornecedoras de software para as empresas.
É também por isso que se espera que a SAP apresente esta semana novas formas de aplicar IA nos negócios, numa altura em que o setor da tecnologia compete para singrar nesta nova vaga de inovação, cujo potencial ficou à vista de todos depois do lançamento do ChatGPT há quase um ano. Assim, ao longo dos próximos dias, para o ecossistema SAP, Bangalore não será só o hub tecnológico da Índia, mas também o centro tecnológico do mundo.
O ECO viajou para Bangalore a convite da SAP Portugal.
(Notícia corrigida às 6h00 de dia 2 de novembro. Uma versão anterior referia que a SAP Labs India empregava 14 mil pessoas em Bangalore. Na verdade, o polo de inovação da SAP na Índia emprega mais de 13 mil nas várias localizações que tem espalhadas pelo país, das quais Bangalore é a principal.)
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SAP e Novobanco desenvolvem na Índia aplicação que mede pegada de carbono com inteligência artificial
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