Like & Dislike: Tirar a Viktor Orbán para dar a António Costa

O Financial Times escreve que a Comissão Europeia quer tirar fundos comunitários a países como a Hungria e dar aos países mais fustigados pela crise. É uma Europa de coesão, mas também de valores.

A Comissão Europeia vai apresentar, em maio, o esboço daquilo que será o pacote dos fundos comunitários para o período de 2021-2027. O cheque dos 350 mil milhões de euros da política de coesão vai diminuir, por várias razões:

  1. O Brexit vai provocar um rombo de 12 a 15 mil milhões por ano no orçamento comunitário;
  2. A Comissão Europeia também quer desviar mais dinheiro para as políticas comuns de defesa e imigração;
  3. Existe igualmente uma maior vontade de aumentar o dinheiro para as políticas setoriais europeias, como o Horizonte 2020 de Carlos Moedas, em detrimento de uma política transversal como a da Coesão:
  4. Além disso, há algumas regiões espanholas, como a Andaluzia, que voltaram a ser elegíveis para apoios mais avultados.

Resumindo: vai haver menos dinheiro a distribuir por mais regiões e por mais programas. Para Portugal é uma má notícia. Para se ter uma ideia da importância que os Fundos de Coesão desempenham na nossa economia, basta pensar que o peso dos fundos no investimento público em Portugal aumentou de 52% no QREN 1994-99 até aos 80% no ciclo de programação 2007 a 2013.

No mês passado em Bruxelas, a propósito dos 30 anos da Política de Coesão, António Costa dizia que, “neste momento, 85% do investimento público em Portugal é financiado por fundos comunitários”. Dinheiro que tem sido fundamental para transformar o país e permitido conquistas desde a descida a pique da mortalidade infantil, às infraestruturas, passando pelas qualificações.

Não é à toa que PSD e Governo fecharam na semana passada um acordo para terem uma posição comum naquela que será provavelmente a negociação dos fundos comunitários mais difícil dos últimos 30 anos, e na qual Portugal vai tentar um cheque de, pelo menos, 25 mil milhões de euros.

De Visegrado para Lisboa

É neste contexto difícil que surge agora uma boa notícia, dada pelo Financial Times, que dá conta que Bruxelas poderá canalizar mais dinheiro para os países do sul mais afetados pela crise, retirando dinheiro a países como a Hungria, Polónia ou República Checa que estão a entrar numa deriva para regimes autocráticos de que Viktor Orbán, com a sua retórica xenófoba e anti-imigração, talvez seja o expoente máximo. Como escrevia há dias uma jornalista húngara no The Guardian, Viktor Orbán “quer que sejamos todos brancos, heterossexuais e cristãos ou, pelo menos, não muçulmanos”.

De acordo com o FT, a intenção da Comissão é que o PIB per capita deixe de ser o único critério na atribuição do dinheiro da Política de Coesão, passando a usar-se outros critérios complementares como os “valores”, o ambiente para as imigrações, o desemprego jovem ou a educação.

Até agora, a Comissão tem usado uma abordagem tecnocrata e convencional para tentar lidar com regimes autocráticos e iliberais levando, por exemplo, a Hungria ao Tribunal de Justiça Europeu ou acionando o artigo 7º do Tratado de Nice (que apareceu quando a extrema-direita de Jörg Haider chegou ao Governo austríaco) contra a Polónia que queria colocar o sistema judicial nas mãos do Governo.

Reduzir o dinheiro dado a países como a Polónia, que é o maior beneficiário líquido das políticas de coesão, com 77 mil milhões de euros, ou encolher o cheque de 22 mil milhões da Hungria, é talvez a forma mais eficiente de colocar estes países a respeitarem valores europeus como a tolerância, a solidariedade, a liberdade de imprensa ou a separação de poderes. Se não respeitarem os valores europeus por convicção, que os respeitem pela necessidade do dinheiro.

Para Portugal, que mesmo quando estava no fundo da crise nunca abdicou dos seus ideais democráticos, esta nova política proposta pela Comissão de Jean-Claude Juncker pode significar eventualmente mais dinheiro mas, mais importante, a garantia de que vivemos numa União em que coesão não significa só dinheiro para os mais pobres, mas significa menos dinheiro para quem não partilha dos nossos valores de tolerância.

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