Por que Costa tem de jurar amor à geringonça tantas vezes?

Rentabilizar o sucesso da geringonça, jogar nos dois tabuleiros políticos, retirar ao PS o ónus de uma possível rutura e aliviar tensões para o OE. Costa tem motivos para ser um pinga-amor.

O casamento começou em 2015 e, na altura, poucos acreditavam que durasse. PS, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes continuam juntos, apesar de já terem passado por algumas crises. Agora, a um ano e três meses da ida às urnas, as águas voltaram a agitar-se. Costa tem-se multiplicado em juras da amor à geringonça. Mas, por que o faz tantas vezes? O ECO foi ouvir politólogos.

Primeiro. O que tem dito o primeiro-ministro:

Estes são alguns dos exemplos de declarações feitas por António Costa onde o chefe do Governo elogia a solução governativa e mostra vontade de continuar.

“À medida que nos aproximamos do último ano de governação, da negociação do próximo Orçamento do Estado (OE) e da necessidade provável de alguma contenção orçamental, o primeiro-ministro está à vontade para elogiar esta solução”, explica o politólogo António Costa Pinto.

O investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa acrescenta que António Costa dá a “clara ideia de que, se algo acontecer, não será devido ao PS, mas eventualmente à incompreensão ou radicalidade” dos seus parceiros.

Carlos Jalali faz uma leitura idêntica. “Caso haja uma rutura, os diferentes partidos terão interesse em sair o melhor possível” na fotografia, nota Carlos Jalali. O politólogo da Universidade de Aveiro sustenta que, “ao fazer estas afirmações, Costa está também a sinalizar que não será por ele que a corda parte. O que atenua as tensões, facilita as negociações do OE e sinaliza aos eleitores que não será pelo PS que esta solução não vai continuar”.

Costa está também a sinalizar que não será por ele que a corda parte. O que atenua as tensões, facilita as negociações do OE e sinaliza aos eleitores que não será pelo PS que esta solução não vai continuar.

Carlos Jalali

Este elemento é importante já que existe uma perceção de que quem provocar uma crise que deite abaixo o Governo será penalizado nas urnas. E as eleições estão aí. Primeiro as europeias, em maio e depois, as legislativas, em setembro/outubro de 2019.

Esta estratégia não é apenas usada por Costa. No debate do Estado da Nação, o líder parlamentar do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares, quis saber se a geringonça também está “com coração do PS” e a deputada bloquista Mariana Mortágua avisou que o Governo ainda está a tempo de se concertar com o Bloco além dos Orçamentos e assinalou que “o BE nunca faltou a esta maioria parlamentar“, devolvendo esta questão ao PS.

Jalali — que vê na proximidade do final da legislatura um motivo para os partidos mostrarem mais distanciamento e na proximidade do próximo OE um foco de tensão — encontra outra razão para as juras de amor constantes. Para conseguir chegar a uma maioria absoluta, António Costa precisa de ganhar votos ao centro — e aí aposta nos temas da Europa e nos acordos com o PSD de Rui Rio. Mas esta é também uma “forma de não alienar eleitores à esquerda do PS“. Ou seja, joga em dois tabuleiros. “É um jogo de equilíbrio.”

E a proximidade aos partidos à esquerda do PS não pode condicionar a conquista de votos ao centro? Costa Pinto acredita que não. “O PS trabalha para ganhar eleições”, mas é muito difícil, tendo em conta o sistema político português, que o PS consiga ter maioria absoluta. Portanto, Costa trabalha para ser o “pivô” do sistema político.

“O tema das alianças vai estar muito presente no pré-eleições mas mais por causa do que acontecerá num cenário de o PS vencer mas sem maioria”, acrescenta Jalali. É que, em 2015, o PS não venceu e precisou de fazer um entendimento à cabeça para governar. “Se desta vez houver uma maioria relativa não há necessidade desse entendimento. E portanto a conversa antes das eleições vai ser sobre o que o PS está disposto a ceder para governar e o que BE e PCP exigem”, sustenta o professor de Aveiro. Jalali nota que “de certa forma foi esta a discussão lançada por Augusto Santos Silva quando impõe condições para uma nova geringonça”. Isto significa que a conversa sobre as alianças vai afunilar para o cenário de maioria relativa do PS.

"É fundamental capitalizar que a geringonça funcionou (…) e que no fundamental o PS não teve de mudar nada na estratégia orçamental e na política europeia.”

António Costa Pinto

Costa Pinto vê outras razões para Costa insistir na mensagem de que a geringonça funciona bem e por isso deve continuar. “O que é estranho é como é que os compromissos correram tão bem. Os portugueses estranharam” mas, agora, “é fundamental capitalizar” o facto de a geringonça ter funcionado. Além disso, o professor do ICS acrescenta que “no fundamental o PS não teve de mudar nada na estratégia orçamental e na política europeia” e, portanto, é natural que Costa tente evidenciar que foi possível fazer a quadratura do círculo.

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