Alentejo cresce acima da média nacional, mas falta oferta de emprego qualificado

Modernização, falta de mão-de-obra e de salários "qualificados", assim como gestão dos recursos hídricos, são os desafios que o Alentejo enfrenta, uma região que está a crescer mais do que o país.

A evolução tem sido lenta, mas constante. De 2009 a 2017, o PIB per capita no Alentejo cresceu 20%, salto que compara com a subida de 13,8% registada na média nacional ou de 4,6% na Área Metropolitana de Lisboa. E apesar de continuar atrás da média do país, o produto gerado pela região neste período passou de equivaler a 89% da média para 95%, uma evolução apenas superada pelo Algarve, cujo PIB per capita passou de 101% para 108% do valor do país. O Alentejo está a crescer e foi essa a mensagem que os convidados do Fórum Desafios e Oportunidades – Alentejo, uma parceria ECO/EuroBic, quiseram transmitir esta quinta-feira, 21 de março.

Contando no painel com Ana Costa Freitas, reitora da Universidade de Évora, José Pedro Salema, presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA) e José Mateus Ginó, presidente da Fundação Eugénio de Almeida, a sessão reuniu dezenas de empresários e investidores em Évora, com a reitora da Universidade de Évora a dar o mote que marcaria o debate neste fórum: “Já há futuro [na região], mas ainda há muito a fazer”, sintetizou. Ou seja, muito já foi feito para reanimar a região, mas ainda falta muito por fazer.

“O que faz mais falta é oferta de emprego qualificado. Há emprego, mas pouco qualificado”, começou por apontar Ana Costa Freitas, recordando o histórico da região, mas também de todo o interior de Portugal. “Deixou-se atrasar muito o interior do país nas últimas décadas, o que levou as pessoas a fugir para o Litoral, e essa situação vai demorar a mudar.”

No Alentejo, esta mudança já está em curso, como mostram os números do PIB per capita, e tal deve-se, em parte, ao Alqueva, que veio apoiar os empresários e agricultores a lidar com o fator mais limitador da região: a falta de água. “É preciso ter agricultura rentável na região e o Alqueva veio eliminar o fator limitador. O clima é muito favorável para várias espécies, mas há o problema de que a água não cai no verão. Temos de ter regadio, pois só assim conseguimos ter produções vegetais interessantes e o Alqueva veio fazer isso”, explicou o presidente da EDIA. Mas este é um sucesso que deve ser gerido com cautela, já que a água é um recurso escasso, acrescentou.

Fórum Desafios e Oportunidades EUROBIC, Évora - 21MAR19
Fórum “Desafios e Oportunidades – Alentejo” EuroBic, com Ana Costa Freitas, reitora da Universidade de Évora, José Pedro Salema, presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA) e José Mateus Ginó, presidente da Fundação Eugénio de Almeida. António Costa, publisher do ECO, moderou o debate.Hugo Amaral/ECO

Segundo José Pedro Salema, a EDIA já conta com 82% de taxa de adesão, valor que compara com “o objetivo de cruzeiro de 80%, que apenas pensávamos atingir em 2025/26, ou seja, aconteceu seis anos antes e ainda vamos ter mais: as intenções de investimento não param”, disse. Mas este recurso exige enormes cuidados na sua alocação e este é um tema que tem estado no centro das reflexões internas da EDIA.

“Não queremos ter o problema de excesso de sucesso. A mensagem foi de promoção nos últimos anos — ‘venham que temos água’ — e o investimento apareceu”, afirmou o presidente da EDIA. “Mas hoje começamos a pensar que não podemos permitir este crescimento infinitamente. Temos tido ganhos de eficiência muito significativos, é certo, pois hoje a rega recorre a imensa ciência, mas precisamos de algum controlo e cautela de modo a orientar o investimento no sentido certo.”

Alqueva tem 25 mil hectares à espera de pequenos produtores

Contudo, e apesar dos cuidados da gestão dos recursos providenciados pelo Alqueva, José Pedro Salema aproveitou a presença no Fórum para lançar um convite aos pequenos empresários. É que se os grandes investidores já vieram em força para a região, neste momento há uma enorme oferta de parcelas pequenas por aproveitar no Alqueva.

“Ouvimos muitas vezes notícias sobre grandes investidores e fundos de investimento que investem em milhares de hectares… mas já começa a ser difícil encontrar áreas dessas no Alqueva. Por outro lado, as áreas pequenas são muitas: temos 25 mil hectares de parcelas com menos de cinco hectares. Se toda esta área estivesse a produzir, então haveria um impulso brutal na economia regional“, disse o presidente da EDIA.

Um dos grupos que beneficiou com o Alqueva foi precisamente a Fundação Eugénio de Almeida, conforme explicou José Mateus Ginó. “Tivemos oportunidade de ir diversificando graças ao Alqueva. A partir do momento em que a água deixou de ser um fator limitador, aproveitámos.” A Fundação não só alargou a área de vinha, como apostou em olivicultura e em 140 hectares de amêndoa. “O Alqueva trouxe um leque de oportunidades que a fundação tem tentado aproveitar.”

Fórum Desafios e Oportunidades EUROBIC, Évora - 21MAR19
José Pedro Salema, presidente da Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA) e José Mateus Ginó, presidente da Fundação Eugénio de Almeida falam das novas oportunidades de negócio no Alentejo no Fórum Desafios e Oportunidades.Hugo Amaral/ECO

Desafios: Modernização e ensino médio

Na leitura de José Mateus Ginó, os desafios que o Alentejo enfrenta estão hoje bem diagnosticados. “A mão-de-obra é um fator limitador do crescimento da atividade industrial e empresarial no Alentejo, ou seja, encontrar pessoas capazes de se adaptar à modernização. Ser agricultor hoje não é o mesmo que ser agricultor há 20 anos, as técnicas e os métodos são outros“, defendeu.

Para a reitora da Universidade de Évora, o problema da mão-de-obra qualificada também reside no menosprezo a que a sociedade “condenou” o ensino médio, e também na resistência de alguns empresários e engenheiros agrícolas em lidar com tarefas ditas menores. “Menosprezámos o ensino médio, até do ponto de vista da valorização social, e isso é um problema. E falta mão-de-obra, é certo, qualificada, mas não há oferta de salários ‘qualificados'” lembrou Ana Costa Freitas. “Temos de pensar muito na educação média e valorizar profissional e socialmente esse tipo de educação, que reduzimos muito e faz falta”, acrescentou.

Aproveitando esta questão, o presidente da Eugénio de Almeida detalhou que “o mais gritante na falta de mão-de-obra atual” não está na “pessoa que vai vindimar ou podar”, mas sim “na pessoa que, por exemplo, vai guiar um trator por exemplo… quem guiava antes, não percebe hoje como o trator funciona… e não saberá usar um GPS, ou acompanhar a monitorização dos níveis de água no solo, dos tratamentos a aplicar…”. Mas neste ponto a reitora da Universidade de Évora lembrou uma diferença de Portugal para outros países europeus: “Na maior parte dos países, o engenheiro agrícola também limpa os estábulos, guia o trator, etc… mas por cá chega-se a determinado patamar, e já não se faz essas tarefas. Temos de transmitir a ideia de que é preciso estar apto e ter vontade para fazer tudo”, rematou.

Regressando a um ponto já antes focado, o da sustentabilidade, o presidente da EDIA terminou apontando como grande desafio da região, país e do mundo, a gestão do consumo de energia, recomendando um avanço decidido pela energia fotovoltaica. “O investimento agrícola obriga a um maior consumo de energia e no Alentejo temos um recurso altamente disponível, o sol. Logo, há que compatibilizar o crescimento económico com a sustentabilidade e o fotovoltaico é a forma mais barata de produzir energia”, explicou José Pedro Salema.

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