Costa pediu fiscalização urgente, mas Tribunal Constitucional não tem prazo limite para decidir
O pedido de urgência pode encurtar para metade os prazos processuais, mas para a decisão não existe um limite. O acórdão do Constitucional tanto pode chegar dentro de meses como daqui a anos.
O Governo vai pedir com urgência a fiscalização sucessiva dos três diplomas aprovados pela Assembleia da República e promulgados pelo Presidente da República que sobem alguns apoios sociais. Se aceite pelo Tribunal Constitucional, o caráter de urgência do pedido pode encurtar os prazos processuais para metade, mas não existe um prazo para a decisão final dos juízes do Palácio Ratton. O veredicto tanto pode chegar em meses como só daqui a anos.
O anúncio foi feito esta quarta-feira, após um período de reflexão: o primeiro-ministro decidiu pedir a fiscalização sucessiva dos três diplomas por considerar que violam a norma-travão prevista na Constituição da República Portuguesa. O recurso ao TC será acompanhado por um pedido de urgência, confirmou António Costa, mas, mesmo que seja aceite, os seus efeitos práticos podem ser reduzidos uma vez que não existe prazo para a decisão final.
Atualmente, o Tribunal Constitucional tem 17 pedidos de fiscalização sucessiva pendentes, de acordo com um artigo de fevereiro do Expresso, sendo que o pedido mais antigo é de julho de 2019, ou seja, está quase a fazer dois anos sem uma decisão. Em média, os processos demoram entre 18 meses a dois anos pelo que a decisão neste processo da subida dos apoios sociais pode só chegar no final de 2022, perto do fim da atual legislatura.
Para já, este pedido do Governo ainda não chegou ao Palácio Ratton. “O Tribunal Constitucional aguarda a entrada dos pedidos de fiscalização sucessiva a que se refere“, responde fonte oficial do TC ao ECO esta quinta-feira.
Relativamente à urgência que Costa disse que ia pedir, o Constitucional esclarece que “quando razões ponderosas o justifiquem, pode o Presidente [do TC], ouvido o Tribunal, encurtar até metade os prazos relativos à elaboração e discussão do projeto de acórdão, depois de fixada a orientação do Tribunal”. Isto é, não há prazo para a decisão final, mas é possível reduzir para metade os prazos dos passos intermédios do processo até ao acórdão.
Processo demora, no mínimo, 70 dias
O Tribunal Constitucional explica ao ECO que, apesar de não haver um prazo para a decisão final, existem muitos prazos para cada patamar do processo: “Os processos de fiscalização abstrata sucessiva obedecem aos prazos previstos na LTC (Secção III – Processos de fiscalização sucessiva), para apresentação do pedido ao Presidente (art. 62.º), admissão ou suprimento de deficiências (art. 62.º), eventual aperfeiçoamento do pedido (art. 62.º), audição do autor da norma fiscalizada (art. 54.º), elaboração do memorando do presidente (art. 63.º), distribuição do memorando e debate (art. 63.º), distribuição a um Juiz relator (art. 64.º), elaboração de um projeto de acórdão (art. 65.º), distribuição do projeto (art. 65.º) e sua discussão (art. 65.º)”.
Feitas as contas de todos estes prazos, há, no mínimo, um total de 70 dias, mesmo com os prazos encurtados para metade, caso o Constitucional aceite a urgência pedida pelo Governo. Se a urgência no pedido for rejeitada pelo TC, o número de dias passa para 140. Mas mesmo este número de dias não é exato. Por um lado, estes prazos são, em si, indicativos pelo que as tarefas podem ser executadas mais rapidamente. Por outro lado, há passos do processo que não definem um prazo na lei do TC para serem realizados, podendo demorar mais ou menos tempo. Também não é de excluir uma situação em que Portugal volte a entrar em confinamento, alturas em que os prazos judiciais têm sido congelados até ao regresso de uma certa normalidade.
Costa quer decisão do TC para eventuais futuros confinamentos
A pressa do primeiro-ministro está relacionada com o facto de, até haver decisão do TC, o Governo ser obrigado a cumprir as alterações à lei aprovadas pelos deputados, independentemente de as classificar de inconstitucionais. Até à decisão, as Finanças terão de acomodar o custo da subida dos apoios sociais no Orçamento do Estado para 2021 (OE 2021), tal como já assumiu o ministro das Finanças, mas não é claro de que forma tal acontecerá.
O chefe de Governo disse que os “cidadãos beneficiários têm o direito de saber com o que podem contar” e que não existe uma “forma justa” de executar as alterações aprovadas dentro dos “limites orçamentais”. “Como iríamos aplicar este limite? Dando apoios a uns e não a outros, até se esgotar o plafond? Ou reduzindo o montante do apoio a todos, violando assim a lei?”, questionou o primeiro-ministro.
Acresce que dado que estes apoios sociais extraordinários só vigoram durante o período de maior confinamento, a declaração de inconstitucionalidade por parte do Palácio Ratton pode não chegar em tempo útil. Por exemplo: as alterações do apoio excecional à família já nem vão ter aplicação prática no imediato uma vez que o apoio vai acabar assim que os alunos do 5.º e 6.º ano regressem à escola na próxima segunda-feira, 5 de abril, o que foi confirmado pelo Conselho de Ministros esta quinta-feira.
Questionado pelos jornalistas, Costa argumentou que a fiscalização sucessiva continua, no entanto, a ser “útil” uma vez que Portugal poderá entrar em confinamento noutro período ainda este ano. Nesse caso estes apoios sociais teriam de regressar no modelo aprovado pelo Parlamento e não no modelo original do OE. Nesse caso, o impacto orçamental seria maior porque acumularia mais meses (40,4 milhões de euros por mês).
Outra questão que se coloca é se, declarada a inconstitucionalidade, os beneficiários do aumento dos apoios sociais vão ter de devolver o “excesso” que receberam entre o momento da aplicação das alterações e o momento da decisão do TC. Na conferência de imprensa, o primeiro-ministro disse que é “provável” que os juízes restrinjam os efeitos da sua decisão ao momento a partir da divulgação do acórdão, sem uma ação retroativa que obrigue à devolução de apoios.
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