Indicadores e impactos das alterações climáticas agravaram-se em 2020 e Covid-19 só piorou

  • Lusa
  • 19 Abril 2021

Indicadores e impactos das alterações climáticas agravaram-se em 2020 e a pandemia de Covid-19 abrandou a economia mas não as concentrações de gases, revela relatório da OMM.

Os indicadores e os impactos das alterações climáticas agravaram-se em 2020, um dos três anos mais quentes de sempre, e a pandemia de Covid-19 abrandou a economia mas não as concentrações de gases, alerta um relatório divulgado esta segunda-feira.

Da responsabilidade da Organização Meteorológica Mundial (OMM), uma agência das Nações Unidas com sede na Suíça, o relatório foi divulgado pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, e pelo secretário-geral da organização, Petteri Taalas, que deixou um aviso a todos os países.

A tendência negativa do clima continuará durante as próximas décadas, independentemente do nosso sucesso na mitigação. Por conseguinte, é importante investir na adaptação. Uma das formas mais poderosas de adaptação é investir em serviços de alerta precoce e em redes de observação meteorológica”, alertou.

De acordo com os dados compilados em relação a 2020, a pandemia de Covid-19 e o consequente abrandamento económico fez diminuir temporariamente as emissões de gases com efeito de estufa, mas tal não teve um impacto percetível nas concentrações atmosféricas.

Nos últimos dois anos, afirma-se no documento, as concentrações de gases com efeito de estufa continuaram a aumentar e a concentração de dióxido de carbono (CO2) seguiu os mesmos padrões de aumento também. E a covid-19 só fez piorar a situação de milhões de pessoas já a braços com os riscos climáticos, pelas recessões económicas, pelas perturbações no setor agrícola, pelo aumento da insegurança alimentar e o atraso na prestação de ajuda humanitária.

Em resumo, diz a OMM, além da covid-19, o ano 2020 foi marcado pelo aumento da temperatura da terra e dos oceanos, pela subida do nível do mar, pela continuação do derretimento do gelo permanente e recuo dos glaciares e pelas condições meteorológicas extremas. Tudo isso teve impacto no desenvolvimento económico, nas migrações (internas e externas), na segurança alimentar, e nos ecossistemas terrestres e marinhos.

E para que não restem dúvidas, diz a OMM, 2020 foi um dos três anos mais quentes de que há registo, com uma temperatura média global de 1,2° Celsius acima do nível pré-industrial (1850-1900). Os últimos seis anos (desde 2015) foram os mais quentes de que há registo. E a década 2011-2020 foi também a mais quente de que há registo.

Petteri Taalas lembrou que foi há 28 anos que a OMM fez o primeiro relatório sobre o estado do clima (1993) para dizer a seguir que, apesar dos avanços de informação e tecnológicos, a mensagem continua a mesma, de preocupação com as alterações climáticas. A diferença é que agora há “mais 28 anos de dados que mostram aumentos significativos da temperatura em terra e no mar, bem como outras alterações como a subida do nível do mar, o derretimento do gelo e dos glaciares e alterações nos padrões de precipitação”.

Todos os indicadores, sublinhou, “realçam uma mudança climática incessante e contínua, uma ocorrência e intensificação crescentes de eventos extremos, e perdas e danos severos, que afetam as pessoas, sociedades e economias”.

Para o secretário-geral da ONU, António Guterres, o relatório agora apresentado mostra que não há tempo a perder, que o clima está a mudar e que os impactos já são demasiado pesados para as pessoas e para o planeta.

“Este é o ano para a ação”, disse, instando os países a comprometerem-se a serem neutros em emissões de CO2 até 2050, apresentando antes da próxima cimeira sobre o clima (COP26), em Glasgow, planos “ambiciosos” para que as emissões globais sejam reduzidas em 45%, comparando com 2010, até 2030. “E precisam de agir agora para proteger as pessoas contra os efeitos desastrosos das alterações climáticas”, avisou António Guterres.

O relatório faz uma análise da situação em várias áreas, uma delas os oceanos, que absorvem cerca de 23% das emissões de CO2 emitidas pelos humanos, mas que devido a esse CO2 se acidificam e que também por isso perdem capacidade de absorção de CO2 da atmosfera. E esse processo continuou em 2020, afetando a vida marinha, os ecossistemas e a pesca.

“O oceano também absorve mais de 90% do excesso de calor das atividades humanas. Em 2019 registou-se o maior teor de calor dos oceanos, e esta tendência provavelmente continuou em 2020”, diz-se no documento.

Mais de 80% da área oceânica sofreu pelo menos uma onda de calor em 2020 e o nível médio global do mar continuou a subir no ano passado.

No Ártico as temperaturas aumentam duas vezes mais rápido do que a média global, com implicações nos ecossistemas árticos, mas também no clima global, com o descongelamento dos gelos permanentes (permafrost) a libertar metano para a atmosfera.

Em 2020 bateram-se recordes de diminuição do gelo, bateram-se recordes de altas temperaturas na Sibéria e a Gronelândia continuou a perder gelo. E se na Antártida há uma maior estabilidade diz o relatório que a região perde anualmente entre 175 e 225 gigatoneladas de gelo por ano.

Mas o ano passado deixou outras marcas, lembra-se no relatório. Chuvas anormalmente fortes e inundações em grandes partes de África e Ásia, seca severa na América do Sul (o Brasil teve perdas agrícolas estimadas em três mil milhões de dólares), temperaturas anormalmente altas na Sibéria (38ºC em Verkhoyansk, na Rússia, perto do círculo polar ártico), os maiores incêndios alguma vez registados nos Estados Unidos, e temperaturas altas nunca antes registadas, também nas Caraíbas ena Austrália. E a Europa também com ondas de calor. E recordes de temperaturas em Israel, no Kuwait e no Iraque.

E depois, também em 2020, os furacões, com o Atlântico Norte a ter o maior número de tempestades nomeadas de sempre, com os Estados Unidos a sofrerem 12 furacões (recorde anterior era nove), com a zona da Índia e do Bangladesh a sofrerem o ciclone mais destrutivo de sempre e as Filipinas um dos mais intensos. E 2020 foi também o ano que registou (03 de outubro) o dia mais chuvoso de sempre no Reino Unido, que registou uma tempestade de granizo na Líbia (Tripoli, a 27 de outubro) com um frio invulgar.

No ano passado mais de 50 milhões de pessoas foram duplamente atingidas por catástrofes relacionadas com o clima (inundações, secas e tempestades) e pela pandemia de Covid-19, com as tempestades a provocarem desalojados e deslocados e a ajuda a ser dificultada devido à pandemia (atrasos na assistência, as pessoas a não poderem ser transportadas em grande número, os centros de evacuação a funcionar pela metade).

Como consequência das alterações climáticas, da pandemia ou de conflitos aumentou a insegurança alimentar e foram quebradas cadeias de abastecimento. Na primeira metade do ano registaram-se quase 10 milhões de deslocações devido a acontecimentos climáticos (Ásia e Corno de África por exemplo). E se a isso se somarem os deslocados da segunda metade do ano, o número de deslocados de suas casas só em 2020 deverá aproximar-se da média da década, segundo a OMM.

O FMI, citado no documento, admite que a recessão global provocada pela pandemia de covid-19 pode afetar as políticas de mitigação das alterações climáticas. Mas fala de oportunidades para “colocar a economia numa trajetória mais verde”, que pode apoiar o PIB e o emprego e ao mesmo tempo limitar o impacto das alterações climáticas.

O relatório esta segunda-feira apresentado antecede uma cimeira virtual de líderes mundiais sobre o clima, organizada pelo Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, para juntar esforços das principais economias no sentido da redução de gases com efeito de estufa e do cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris – manter a temperatura mundial a um nível inferior a mais 02°C em relação aos níveis pré-industriais até ao final do século.

O relatório junta informação de muitos serviços meteorológicos e hidrológicos, centros climáticos, e parceiros da ONU.

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