Jubilação do Professor Luciano Lourenço: Fogos florestais, Geografia e Pedagogia

  • António Ferreira
  • 16 Setembro 2021

Investigador de reconhecido mérito científico e firmeza de convicções, em particular na temática dos incêndios florestais, deu última aula em cerimónia de jubilação, na Universidade de Coimbra.

Doutorado em Geografia Física pela Universidade de Coimbra (UC), o professor catedrático Luciano Lourenço ponderou hipóteses para a última aula, a 8 de setembro de 2021, dia em que completou 70 anos de idade. Inevitavelmente, a escolha recaiu sobre o tema “Incêndios florestais em Portugal. Uma fatalidade ou um problema com solução?, resumo de décadas de serviço público prestado à proteção civil e prevenção dos fogos em Portugal.

Fátima Velez de Castro, docente do Departamento de Geografia e Turismo da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra (DEPGEOTUR – FLUC) e membro da comissão organizadora da cerimónia de jubilação referiu-se, nessa qualidade, ao Professor Luciano Lourenço, afirmando: “É um dos grandes nomes da academia na área da Geografia e Riscos. O seu vasto legado está associado ao tema dos incêndios florestais. Homem de Ciência, exigente, rigoroso, metódico, de grande honestidade intelectual e competência, com um enorme espírito de missão, firmeza de convicções, capacidade de trabalho e espírito de liderança a quem a Geografia nacional e a Universidade de Coimbra muito devem,” escreveu em nota enviada a ECO Seguros.

Na aula de despedida da docência permanente, o professor afirmou convicto: “Os incêndios florestais não são uma fatalidade.” Há solução para os incêndios, frisou. O desafio não é acabar com os fogos, pois estes “são parte do ecossistema.” O objetivo deve ser “acabar com os grandes incêndios,” enunciou o catedrático jubilado.

Educador e pedagogo que, enquanto investigador e académico, contribuiu para elevar a Universidade de Coimbra no ensino da Geografia, o profissional assume ter “grande respeito pelos territórios, físico e geohumano, bem como pelos patrimónios (natural, edificado, cultural)”, áreas em que o conhecimento enquanto geógrafo foi “particularmente útil nas funções de gestão que desempenhei, quer na Direção da Escola Nacional de Bombeiros (ENB), quer, depois, na Coordenação da Agência para a Prevenção de Incêndios Florestais” (APIF), lê-se em entrevista biográfica publicada em 2019 pela Associação Portuguesa de Geógrafos (APGEO), de que é membro.

Além das direções da ENB e APIF, coordenou grupos de trabalho no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (Cegot). Na última lição, proferida no dia de aniversário, o professor jubilado revisitou experiências e conhecimento em torno da problemática nacional dos fogos.

Lembrou a APIF e os fracassos legislativos (Plano Nacional para Defesa da Floresta contra Incêndios) e ainda as dificuldades de aplicação concreta dos planos municipais (de Ordenamento do Território), recordando também que, na sua visão, os incêndios florestais são um “risco social,” não tecnológico. Na abordagem do fenómeno, considera indispensável contar com o envolvimento da população, um “pilar” fundamental, insistiu.

Sobre o potencial interesse para a indústria de Seguros das dezenas de trabalhos científicos reunidos em 2 volumes – agora editados em obra de homenagem ao jubilado -, Fátima Velez de Castro, coordenadora (com o professor) do trabalho “Catástrofes Antrópicas – Uma Aproximação Integral,” (2019, Imprensa da Universidade de Coimbra) explica: “Transversalmente, todos os trabalhos podem ter interesse para as seguradoras, uma vez que implicam dinâmicas de risco em territórios, cujas populações e os seus bens podem ser afetados por ocorrências naturais, antrópicas e mistas”.

Presidente e, durante anos, coordenador da Riscos – Associação Portuguesa de Riscos, Prevenção e Segurança, o celebrado académico recebeu inúmeras mensagens de louvor e reconhecimento. Em determinado elogio refere-se: “Num país onde os incêndios florestais configuram um dos principais riscos, Luciano Lourenço foi pioneiro e o maior impulsionador do estudo geográfico dos incêndios florestais (…),” assinam António Bento-Gonçalves e António Vieira, ambos do Departamento de Geografia (Universidade do Minho), em texto integrado num dos volumes publicados por ocasião da jubilação.

Entre cargos e projetos de interesse cívico que enriqueceram percurso ilustre, Luciano Lourenço foi coordenador nacional do PROSEPE (Projeto de Sensibilização e Educação Florestal da População Escolar), sobre o qual, Cristina Maria Rodrigues Ferreira, coordenadora distrital dos Clubes da Floresta de Viseu, escreveu: “Por detrás deste grandioso projeto, esteve o trabalho incansável de alguém que, desde muito jovem, compreendeu a importância de lançar um novo olhar sobre a Floresta e de a tornar objeto de investigação científica. Esse alguém é o Professor Doutor Luciano Lourenço, que nunca escolheu o caminho fácil da fama ou do protagonismo, mas antes agiu com retidão e entusiasmo, realizando um extraordinário trabalho de base científico-pedagógica, nem sempre compreendido por todos, talvez invejado por alguns, mas sem nunca desistir, apesar dos obstáculos e caminhos tantas vezes tortuosos”.

Perfil académico, científico e técnico indissociável da investigação Florestal e Prevenção Civil, privilegiando a temática dos incêndios, por isso também se assume estudioso da dentrocaustologia e da cindínica.

Nos anais da Geografia fica vasto acervo ligado ao académico jubilado. Luciano Lourenço é referência bibliográfica em centenas de artigos publicados em revistas especializadas, 80 capítulos de livros e mais de 50 livros publicados. Organizou mais de uma centena de eventos científico-pedagógicos e proferiu mais de 350 comunicações. Participa, neste momento, como investigador, em 2 projetos e foi investigador responsável em mais de 40 projetos, nacionais e internacionais. Nas atividades profissionais, Luciano Lourenço interagiu com 300 colaboradores em coautorias de trabalhos científicos. Na Riscos, associação a que ainda preside: “Temos sempre imenso gosto e interesse em aproximar a academia da indústria de seguros, através de parcerias e do envolvimento em muitas das nossas atividades,” acrescentou ainda Fátima Velez.

Da passagem pela ENB, em resultado da dedicação e perseverança de Luciano Lourenço e da equipa que o acompanhou na operacionalização do centro de validação de competências, milhares bombeiros alcançaram a escolaridade obrigatória, testemunhou António Amaro, também docente. Nas incursões fora da academia, Luciano mostrou-se “inquebrantável” perante os caprichos da política, rematou o colega, igualmente serrano, na breve intervenção no anfiteatro onde decorreu a celebração.

O geógrafo e cidadão – que tem o clássico “Scouting for the Boys”, livro de Baden Powel (fundador do escutismo) como cartilha que o inspirou na relação com a Natureza, humanismo e práticas de observação no terreno – não contornou, durante a última lição, referências a outro objeto de estudo que o distingue: as serras de Xisto (Açor, Lousã, Estrela), aliás, tema do doutoramento (Geografia Física), na Universidade de Coimbra (1997), onde concluiu licenciatura (1979).

Luciano Lourenço “foi e continuará a ser, um geógrafo de campo”, afirmou, no elogio académico, Adélia Nunes, diretora do Departamento de Geografia e Turismo da Faculdade de Letras da UC, docente que também integrou a comissão organizadora da jubilação e foi moderadora da cerimónia, antes de fazer entrega dos dois volumes da obra “Geografia Riscos e Proteção Civil”, publicada pela Riscos, como tributo ao homenageado.

A edição de 1200 páginas reúne dezenas de contribuições, testemunhos e trabalhos científicos de mais de 170 autores de inúmeros países e organizações, que conviveram ou com ele trabalharam.

Os dois volumes em homenagem ao professor Luciano Lourenço estão acessíveis aqui.

Pode aceder aqui ao vídeo da última lição do professor jubilado.

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