Encontro APS Dia 1: Recessão é possível, mas bancos e seguros estão preparados

Nuvens negras no horizonte mas reguladores e empresas financeiras estão confiantes na sua capitalização e na sua experiência de vivências em tempos turbulentos.

O primeiro dia do 18º Encontro de Resseguros, organizado pela Associação Portuguesa de Seguradores, provocou sentimentos contraditórios. O cenário de recessão pairou sempre, mas a certeza dos oradores presentes no Hotel Palácio do Estoril foi de, ao contrário das últimas grandes crises, o setor financeiro estar bem preparado para enfrentar um próximo mau momento.

José Galamba de Oliveira, presidente da APS, que o futuro depende de “como os seguradores compreenderem os novos riscos”.APS

José Galamba de Oliveira, presidente da APS, em mensagem inicial lembrou que poderão acontecer eventos “imprevistos e improváveis”, nada de novo para a indústria seguradora. No entanto prevê que se desenha um contexto económico adverso e que dependerá dos seguradores “compreenderem atempadamente os novos riscos”.

Haegeli: “O cenário escureceu, o risco de recessão é real”

A propósito da construção de cenários económicos falou em seguida Jérôme Jean Haegeli, o Chief Group Economist da resseguradora Swiss Re, reconhecido pelos seus aprofundados estudos económicos. Três aspetos foram relevantes: uma fotografia da situação atual designada C-R-7, uma homenagem aos anfitriões, significando o C crises nos preços ao consumidor (inflação), clima e os seus riscos e crise no consumo. O R vem de resiliência, da capacidade do setor financeiro absorver os choques externos a si e o 7 surge como um valor percentual do atual nível de inflação em Portugal.

Jérôme Haegeli, chief economist da Swiss Re, atribui probabilidade relevante para uma recessão global.APS

Em relação aos cenários económicos possíveis Haegeli apresentou um que considerou 55% a 75% provável que é o estabelecido pela Swiss Re, não diferindo muito dos cenários que considerou “consensuais” entre as instituições económicas. A resseguradora suíça prevê menor crescimento económico mas com a inflação a voltar a alguma normalidade em 2023. No entanto não exclui (20 a 30% de possibilidade) uma recessão global ou um retrato, não tão negativo, de uma estagflação (crescimento económico anémico em ambiente inflacionário) semelhante à verificada no mundo nos setenta e oitenta do século XX que tem entre 5 e 10% de probabilidades de acontecer. Para o economista um cenário positivo apenas conta com 8% de hipótese de se tornar realidade.

Aconselhando um 3º Bretton Woods, depois de lembrar a data em que foi anunciado o Choque Nixon de 1971, com o cancelamento unilateral da convertibilidade internacional direta do USD em ouro e que precedeu um longo período de estagflação, referiu que o anúncio de subida das taxas de juro o deixa contente, mas que outras medidas como o aperto monetário (em contraste com quantitative easing hoje em vigor) ainda não começou, tal como ainda não começou a verdadeira volatilidade dos mercados financeiros. Para Haegeli os bancos centrais estão atrasados em relação ao combate à inflação e considera que “só com taxas reais de juro positivas os mercados financeiros poderão recuperar”.

APS, APB e APFIPP: Desta vez capitalizados e preparados

O painel “O setor financeiro na era da imprevisibilidade”, reuniu segurador, banqueiro e gestor de fundos de investimentos na vontade de situar as respetivas atividades nos cenários previsíveis no curto e médio prazo.

Confiantes: Galamba de Oliveira (APS), Vitor Bento (APB) e João Pratas (APFIPP), e o moderador Pedro Guerreiro.APS

José Galamba de Oliveira afirmou que “o setor segurador já demonstrou, na anterior crise financeira e durante a pandemia, capacidade de adaptação e resiliência”. Desta vez o presidente da APS, o desafio encontra os gestores bem capitalizados destacando o regime Solvência II como ter contribuído para o fortalecimento da robustez financeira das seguradoras. Lembrou outras crises financeiras em que os segurados reduziram coberturas para poder manter apólices e defende que o setor deve disponibilizar “seguros a preços acessíveis e com escala”.

“ A banca precisa de estar à altura”, referiu Vitor Bento, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), frisando que este setor já foi importante, durante a pandemia, no amortecimento dos impactos em outros setores de atividade. Considerou que a banca portuguesa está pouco exposta à guerra, mas não a uma crise mundial que daí decorra. Congratula-se pelo fim das taxas de juro negativas, “uma anormalidade” qualificou. Não acredita na estagflação mas coloca a possibilidade de uma recessão.

João Pratas, presidente da Associação de Associação Portuguesa De Fundos De Investimento Pensões E Património (APFIPP), revelou apreensão quanto ao futuro: “Não estou otimista em relação ao futuro próximo”, disse em relação ao seu setor, a instabilidade reforça “a aversão ao risco existente em Portugal, as pessoas preferem colocar o dinheiro debaixo do colchão, isto é nos bancos”.

Os oradores tocaram ainda O PEPP, os mecanismos complementares de reforma, o presidente da APS voltou a mostrar preocupação com o fundo de Catástrofes Naturais que devia começar pelo risco sísmico, lembrando que apenas 16% das casas em Lisboa têm cobertura para terramotos.

Reguladores: Mais que à guerra, atenção às criptomoedas, cibersegurança e clima

O último painel do dia juntou os reguladores. Filipe Aleman Serrano administrador da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF), Luis Laginha de Sousa, administrador do Banco de Portugal (BdP) e Rui Pinto, administrador da Comissão do Mercado de valores Mobiliários (CMVM) debateram “Os desafios da Supervisão Financeira.

Descansados: Luís Laginha de Sousa (Banco de Portugal), Filipe Serrano (ASF) e Rui Pinto (CMVM).APS

Laginha de Sousa referiu que todo o cenário existente no início deste ano foi bastante alterado, devido à guerra na Ucrânia e na inflação. No entanto já existiam desafios como a falta de crescimento económico “traz mais problemas que aqueles que resolve”, todas as questões da cibersegurança e as alterações climáticas em que colocou grande ênfase quer nos danos climáticos quer na diminuição da biodiversidade.

Filipe Serrano afirmou que os rácios de solvência das seguradoras estão bons e as empresas preparadas para subidas de taxas de juro e inflação. Lembrou o papel que, enquanto grande investidor, os seguros têm na canalização de investimentos na área ESG e louvou os esforços das companhias portuguesas na adoção das normas IFRS 17, que vão permitir às seguradoras portuguesas “ficar na linha da frente europeia quanto a transparência e comparabilidade das suas contas”.

O administrador da CMVM, Rui Pinto, focou a falta de investimento e de financiamento das empresas no mercado de capitais, a questão das criptomoedas, em crescimento significativo há cinco anos e a necessidade de lidar com o fenómeno. “Os valores em criptomoedas são comparáveis aos que existiam no mercado sub-prime antes da crise”, alertou, mas considera que a sua contribuição não afeta tanto a estabilidade financeira uma vez que “não há muitos canais de ligação entre os mercados de capitais e as criptomoedas”.

O 18º Encontro da APS prossegue esta sexta feira com painéis a abordar a Inteligência Artificial e os ciber riscos, sendo encerrado pelo Vice Presidente da Câmara Municipal de Cascais, Miguel Pinto Luz.

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