BRANDS' TRABALHO “A sociedade está mais atenta ao tema da igualdade e da inclusão”

  • Trabalho + CIP
  • 22 Março 2023

Rosa Mimoso, IT Strategy Lead na Fidelidade, é a nona convidada do Promova Talks. O papel das mulheres em áreas de tecnologia e as mudanças no setor foram alguns dos temas abordados.

O tema da igualdade de género é o mote da série “Promova Talks”. Trata-se do espaço de debate do Projeto Promova, uma iniciativa da CIP – Confederação Empresarial de Portugal, que visa sensibilizar para o tema e alargar o acesso das mulheres a cargos de liderança nas empresas portuguesas.

Rosa Mimoso, IT Strategy Lead na Fidelidade, foi a convidada deste nono episódio da II temporada do “Promova Talks”. Neste podcast, a responsável da Fidelidade apresentou os desafios sentidos pelas mulheres aquando da entrada no mercado de trabalho no setor tecnológico, mas talvez destacou as mudanças positivas que já têm vindo a acontecer dentro deste tema. Veja abaixo a entrevista completa.

Rosa, terminou uma licenciatura em Computação e Matemática Aplicada há 30 anos. Sendo esta uma área tipicamente masculina, que dificuldades encontrou?

Curiosamente, na minha licenciatura o número de mulheres e de homens era bastante equilibrado. Não refletia de todo a realidade da minha faculdade, o Instituto Superior Técnico, nem as áreas de tecnologia onde trabalho.

Se não me engano, foi no meu segundo ano do Técnico que foi criada a licenciatura em Engenharia Informática, na qual a situação era completamente diferente e completamente desequilibrada. Isto é, havia muito mais homens do que mulheres. Havia e há! No ano passado, 15% dos candidatos que entraram no curso eram mulheres.

Tipicamente as áreas de tecnologia são mais desequilibradas a este nível e, logo à partida, se entram menos mulheres nestas áreas de formação, é natural que depois as entradas no mercado de trabalho também sejam desiguais.

Também há uma tendência, segundo aquilo que temos analisado na tecnologia, para as mulheres desistirem nestes cursos, o que também nos faz refletir um bocadinho sobre quais são os sintomas e quais são as causas para essa desistência. Isto porque, embora as mulheres saiam do liceu com condições e com notas para poderem escolher estas licenciaturas e estes mestrados, a verdade é que as oportunidades de carreira que existem continuam a ser mais atrativas noutras áreas do que propriamente na tecnologia. Há aqui um longo caminho a percorrer.

Quando comecei a trabalhar, estive num grupo que era claramente conhecido no mercado por só empregar homens. Era mesmo muito comum eu estar em várias iniciativas e reuniões em que era a única mulher, mas não era algo que me preocupasse. Fez-me criar e adotar um conjunto de formas de liderar iniciativas diferentes e tornou-me, eventualmente, mais completa enquanto líder. Na verdade, mesmo sendo poucas as mulheres, todas tinham a mesma oportunidade para liderar algumas equipas. Enquanto estive nesse grupo, houve até um caso de uma mulher que chegou à administração, o que na época, não era mesmo nada normal.

Mas acha que agora, após 30 anos, caminhamos mesmo para uma igualdade de género em todos os setores?

Acho que a sociedade está mais atenta ao tema da igualdade e da inclusão. Aquilo que é a minha experiência não é a experiência de todos. Este é um tema no qual, nos últimos tempos, temos todos dinamizado uma série de iniciativas, desde os governos às organizações e a sociedade em geral. Todos nós, enquanto indivíduos, percebemos que temos de ter consciência dessa diferença e temos um papel importante para combater essa desigualdade.

Em relação à igualdade em todos os setores, considero que não. Acho que há diversos desequilíbrios nos vários setores e há, até, setores de atividade que são muito menos atrativos para as mulheres logo à partida e aos quais estas, na sua generalidade, não concorrem.

Além disso, assistimos, infelizmente, a algumas organizações e alguns setores que escolhem a sua força de trabalho apoiadas em variáveis que estão baseadas no género. Eu acho que essas organizações, se não pensaram já no assunto, vão pagar caro no futuro, principalmente porque as novas gerações vão escolher outro tipo de empresas, com outro tipo de valores, para trabalhar.

O Projeto Promova é um programa de liderança feminina. Mas não acha que falar de liderança feminina, por si só, já é discriminatório?

Acho que sim. Confesso que, quando a minha empresa me desafiou a participar nesta iniciativa, pensei se faria sentido face ao meu contexto profissional e ao meu contexto pessoal. Na minha família, eu sou a sexta irmã. Somos três mulheres e três homens, e foram-nos incutidas as mesmas oportunidades.

Acho que a nossa geração atua de uma forma completamente diferente com os nossos filhos (para quem tem). É o meu caso, que tenho uma filha e um filho e, por exemplo, em minha casa quem cozinha é o meu filho e não a minha filha ou eu própria.

Também há aqui sinais que vão mudar pela forma como trabalhamos. O trabalho remoto ou o trabalho híbrido também vão ajudar muito nesse processo. Estigmas como “as mulheres faltam mais ao trabalho” ou “faltam porque têm de dar suporte à família” vão acabar por se esbater com as oportunidades do trabalho remoto.

Para reforçar isto, também assisto muitíssimo mais os homens a desenvolverem atividades de família e a ficarem em casa quando os filhos estão doentes, etc, do que assistia no início da minha vida profissional. De qualquer maneira, mesmo achando que pudesse ser um tema com um nome mais discriminatório, decidi aderir e participar no Promova e perceber se era eu que estava a ignorar alguns sinais. Devo dizer que aprendi imenso.

Que inputs tirou desta participação no Promova?

Eu gostava de destacar vários, desde logo o tema do autoconhecimento, que é trabalhado não só na parte docente, mas também no coaching. A reserva de um espaço do dia para refletir sobre estes temas (que mudou a forma como reflito sobre como estou a contribuir para esta transformação), a forma como pensamos e abordamos os temas das oportunidades dos homens e das mulheres e perceber como estas diferenças se manifestam em pequenas coisas, tais como o preenchimento do grau de eficiência de um CV ou a candidatura a um cargo, mesmo sem ter todas as competências que o mesmo requer. Tudo casos em que homens e mulheres agem de forma diferente.

Acabei por incorporar esta atenção nos processos da minha própria empresa e muni-me de um conjunto de ferramentas para o meu dia-a-dia. Algumas já conhecia, mas é sempre bom refletir sobre os assuntos para perceber que, mesmo conhecendo, não as praticamos. Tudo isto permitiu-me um processo de transformação mais consciente e refletido sobre estas dimensões.

De acordo com os números divulgados pela Fidelidade, a empresa é composta maioritariamente por mulheres - de 3467 colaboradores, 2066 são mulheres - mas, ainda assim, o último relatório de sustentabilidade partilhado pela empresa mostra que, em 2021, havia mais homens do que mulheres em cargos executivos, nomeadamente 21 homens e 15 mulheres. Porque é que isto acontece?

A Fidelidade é, de facto, um grupo diferenciador neste e noutros valores da organização. Resulta da fusão de várias empresas e, por curiosidade, resultou numa organização bem diferente na igualdade de género.

O setor segurador é, por razões históricas, um setor mais feminino. A percentagem de mulheres nesta área é relativamente grande desde há vários anos e, por isso mesmo, talvez eu, como já trabalho no setor segurador há uns anos, não estivesse tão desperta para o tema.

Na Fidelidade sinto que há oportunidades iguais para homens e para mulheres e não sinto que este seja, de todo, um fator na génese de uma promoção ou de uma seleção de novas pessoas para a comunidade da Fidelidade. E dou-lhe até exemplos da minha área em particular, de IT, onde não só o management é bastante equilibrado entre mulheres e homens, como a direção geral do IT é liderada por uma mulher. Isto é completamente distinto do mercado porque temos no IT cerca de 44% de mulheres.

Por isso, acho que é circunstancial o facto de os casos executivos não serem equilibrados. Há, ainda, um caminho a percorrer focado no c-level da Fidelidade, que eu acho que vai acontecer. Já há alguns sinais de que está a acontecer, como no caso da Multicare, que tem hoje duas mulheres administradores executivas e uma, curiosamente, foi uma antiga aluna do Promova.

Acha, por isso, que a igualdade de género é, então, um dos pilares da Fidelidade?

Acho. E acho que, como qualquer organização que se pretende atrativa e competitiva no mercado de trabalho, este é um tema no qual pensa e atua. Como sabemos, é na diversidade de opiniões e na forma que encontramos de partilhar ideias que se fazem melhorias transformacionais na própria organização. A Fidelidade está numa transformação bastante grande, como é visível até na forma como projetamos a nossa imagem. Isto é fruto deste trabalho, feito a pensar internamente nas opiniões distintas, de pessoas com diversas formações e de diversas culturas.

Mas, na prática, que tipo de ações a empresa tem desenvolvido e tem promovido neste sentido?

Estamos preocupados com o tema da diversidade, da equidade e da inclusão porque temos noção da importância que o mesmo tem. Temos, inclusive, pessoas dedicadas e a dinamizar diversas iniciativas, com o intuito de gerar a consciência destes temas na organização.

Nós temos uma série de preconceitos que são construídos ao longo do tempo e estas ações que estamos a dinamizar têm o objetivo de desmontar esses conceitos. É a consciência deste tema que é o fator importante de mudança.

Nós costumamos dizer que se a Fidelidade fosse uma pessoa, era uma boa pessoa. Isto porque desenvolve uma atividade bastante ativa nessa área. Analisamos os resultados, os dados e, em cada momento, olhamos para estas várias dimensões na organização como um todo, de forma a perceber como estamos a evoluir e o que é que isso está a trazer de transformação à organização. Dinamizamos casos concretos dentro de cada área porque elas não são todas iguais. Além disso, promovemos a participação das mulheres em programas como o Promova e falamos bastante em eventos sobre esta temática.

Que mensagem gostaria de deixar às futuras participantes do Projeto Promova?

A mensagem principal que eu queria partilhar é para que aproveitem ao máximo. O programa é muito completo ao nível dos conteúdos, tem um corpo docente fantástico e um espaço lindíssimo que potencia a partilha.

Sugeria que interagissem com as colegas porque aprendemos imenso umas com as outras. Com os seus exemplos, com as suas realidades, que às vezes são distintas das nossas e por outro lado mais parecidas do que pensamos. Isso resulta em ações que depois podemos pôr em prática. O facto de sermos um conjunto de mulheres que partilham os mesmos desafios de liderança e que estão, mais ou menos, nos mesmos desafios nas suas organizações, torna esta partilha muito rica.

Nesta segunda edição do Promova, na qual participei, tive a oportunidade de conhecer um grupo de mulheres fantástico. Continuamos a manter o contacto quase diário e partilhamos muito para além de temas do Promova. Ganhamos, na prática, uma comunidade de mulheres com quem debatemos uma série de temas com o distanciamento das nossas organizações. Por isso, o que eu sugiro é que partilhem, entreguem-se e aprendam. Invistam o tempo e o espaço mental no programa, vão ver que será bem empregue.

Ouça aqui o episódio:

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O Projeto Promova conta com o apoio da ANA Aeroportos, da EDP, da Randstad e da SONAE.

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