Santa Casa está a rever todos os apoios para 2024 para cortar custos

  • ECO e Lusa
  • 16 Agosto 2023

Santa Casa informou federações que está a rever o plano de patrocínios aos eventos desportivos, preparando-se para cortar apoios. Secretário de Estado do Desporto pediu reunião urgente com Ana Jorge.

A Santa Casa da Misericórdia está a analisar todos os apoios que a instituição concede, no âmbito de uma avaliação dos apoios para o próximo ano, avançou ao ECO uma fonte governamental. É neste exercício que se insere o anúncio feito a várias federações desportivas da necessidade de rever o plano de patrocínios, e que surge a menos de um ano dos Jogos Olímpicos Paris2024. No entanto, a instituição liderada por Ana Jorge deverá respeitar todos os compromissos existentes, ainda que seja mesmo necessário racionalizar, acrescenta a mesma fonte.

Para já, o secretário de Estado da Juventude e do Desporto, João Paulo Correia, quer reunir urgentemente com a provedora da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) devido aos cortes anunciados para o desporto. “A SCML informou as federações que se encontra a rever o plano de patrocínios aos eventos desportivos, preparando-se para cortar no apoio aos referidos eventos”, escreveu João Paulo Correia na sua página no Twitter. Por isso o responsável anunciou o pedido de reunião com Ana Jorge: “Tendo presente a preocupante decisão da SCML, pedirei ainda esta manhã uma reunião urgente com a senhora provedora“.

As federações desportivas foram avisadas através de cartas assinadas pela provedora Ana Jorge, que assumiu funções na SCML em 2 de maio último. Em causa, de acordo com várias das missivas a que a Lusa teve acesso, está a revisão do “plano de patrocínios delineado para 2023“, advertindo, ainda, que o patrocínio, em nome dos Jogos Santa Casa, na sua maioria, além dos contratos em vigor não está assegurado.

“Trata-se de uma política de apoio que cumpre na íntegra a missão da SCML, assente no relevante papel social do desporto. Por outro lado, esta decisão é anunciada a menos de um ano dos jogos Olímpicos e Paralímpicos, provocando maiores impactos ao setor”, prosseguiu João Paulo Correia.

A justificação para este corte prende-se com “a conjuntura económico-social que se vive”, que conferiu “novas exigências sociais e financeiras à SCML no que diz respeito ao apoio das populações mais vulneráveis”.

Esta manhã, a Santa Casa já emitiu um comunicado no qual garante que “no processo de revisão da política de apoio financeiro a diferentes instituições e entidades”, a revisão do modelo de parceria “não coloca em causa o projeto olímpico para 2024”.

“O impacto financeiro associado a esta nova realidade obrigou a SCML a reequacionar projetos e reforçar respostas face a uma procura crescente dos serviços que a Misericórdia de Lisboa presta. Acompanhada por uma significativa perda das receitas provenientes dos jogos sociais do Estado, a atual situação orçamental que a instituição atravessa não pode ser ignorada”, lê-se numa das cartas enviadas a várias federações olímpicas.

Ana Jorge assume-se certa de que estas entidades desportivas “compreenderão” a “difícil decisão pelas razões evidenciadas”, sem excluir “uma eventual reavaliação futura desta situação caso as premissas se alterem“.

O impacto financeiro associado a esta nova realidade obrigou a SCML a reequacionar projetos e reforçar respostas face a uma procura crescente dos serviços que a Misericórdia de Lisboa presta.

Carta enviada a várias federações olímpicas pela SCML

“O apoio ao desporto nacional, ao talento desportivo e aos grandes eventos nacionais mantém-se como um dos principais desígnios dos Jogos Santa Casa, que têm vindo a prosseguir uma estratégia de patrocínios que transforma parcerias em concretas ferramentas de integração e coesão social”, lê-se, por seu lado, na página oficial na Internet dos Jogos Santa Casa.

Entre as entidades apoiadas pelos Jogos Santa Casa, de acordo com a lista publicada no seu site, constam o Comité Olímpico de Portugal (COP), o Comité Paralímpico de Portugal (CPP), a Confederação do Desporto de Portugal (CDP), as federações de equestre, motociclismo, andebol, atletismo, canoagem, ciclismo, futebol, ginástica, judo, natação, patinagem, remo, râguebi, surf, ténis de mesa, triatlo, voleibol e de desporto para pessoas com deficiência.

Comité Olímpico receia que corte seja apenas no desporto

O presidente do Comité Olímpico de Portugal (COP) já veio a público dizer que receia que a SCML se limite a cortar nas verbas atribuídas a várias federações desportivas, a menos de um ano de Paris2024. “Não tenho exata noção da dimensão do corte que estamos a falar, mas, salvo melhor opinião, estamos a falar, tão só e apenas, dos patrocínios que o departamento de jogos da Santa Casa tem tido junto de algumas federações desportivas, numa parte significativa federações com participação olímpica”, começou por dizer José Manuel Constantino, em declarações à agência Lusa.

“Por um lado, compreendo que a nova direção da SCML queira proceder a uma reavaliação dos critérios de apoio às diferentes entidades atendendo à situação de profunda crise que foi detetada nas auditorias já realizadas e pela intervenção do Ministério Público relativamente a investimentos feitos no Brasil”, afirmou Constantino. Mais, reiterou: “Acho perfeitamente natural e compreensível que a nova administração pretenda olhar para a realidade com que está confrontada e queira reavaliá-la”.

Por um lado, compreendo que a nova direção da SCML queira proceder a uma reavaliação dos critérios de apoio às diferentes entidades atendendo à situação de profunda crise que foi detetada nas auditorias já realizadas e pela intervenção do Ministério Público relativamente a investimentos feitos no Brasil.

José Manuel Constantino

Presidente do Comité Olímpico de Portugal

No entanto, o presidente do organismo federativo advertiu que não terá uma atitude tão compreensiva se os cortes forem feitos apenas no setor desportivo, num valor, que segundo José Manuel Constantino, não é relevante para os cofres da SCML.

“Já não terei uma opinião tão positiva, se esse olhar for circunscrito a meia dúzia de organizações desportivas, junto das quais o departamento de comunicação e marketing da Santa Casa estabelecem protocolos de cooperação. Porque, se há um problema transversal a toda a despesa, não é um montante irrisório face ao que proporciona aos Jogos Santa Casa que põe em casa o seu equilíbrio financeiro”, vincou.

Apesar desta ameaça, Constantino assumiu disponibilidade para uma eventual reunião com a nova provedora da SCML.

Federação de canoagem com “muita preocupação” pelos cortes

Também a Federação Portuguesa de Canoagem (FPC) vê com “muita preocupação” o anúncio da SCML de cortes nos patrocínios a partir de 2024, que deixa as federações em “situação ainda mais difícil”.

“Vemos esta medida com muita preocupação, uma vez que se trata do único patrocinador que investia na nossa modalidade, com um retorno. Muita preocupação também, porque a situação financeira da federação não é a mais saudável e este valor combatia o subfinanciamento por parte da administração pública desportiva”, lamentou o presidente da FPC, Vítor Félix.

Em declarações à Lusa, o dirigente falou de uma verba anual “entre os 60 e 70 mil euros”, que, entre outras coisas, “permitia aumentar e elevar” a participação da canoagem em competições internacionais nos mais diversos escalões, dar “maior qualidade” aos campeonatos nacionais e provas internacionais que a federação organiza, além de “mexer com a preparação olímpica”, para a qual o apoio tem sido vital.

Vemos esta medida com muita preocupação, uma vez que se trata do único patrocinador que investia na nossa modalidade, com um retorno. Muita preocupação também, porque a situação financeira da federação não é a mais saudável e este valor combatia o subfinanciamento por parte da administração pública desportiva.

Vítor Félix

Federação Portuguesa de Canoagem (FPC)

Apesar de a notícia não ser boa para as federações em qualquer circunstância, Vítor Félix entende que este “não é o timing correto” para a SCML tomar e comunicar esta decisão, tendo em conta que a maioria das federações estão em fase decisiva de apuramentos para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos. “Temo que vá mexer, prejudicar a preparação dos nossos atletas”, assumiu, recordando que na próxima semana a canoagem vai ter o seu mundial de qualificação para Paris2024, que terá uma segunda fase, continental, em abril-maio de 2024.

Vítor Félix manifestou ainda uma apreensão adicional, a de que as debilidades financeiras da SCML atinjam um nível superior, nomeadamente o financiamento ao próprio IPDJ, através do qual o Estado apoia diretamente as federações, que provém igualmente dos jogos da Santa Casa.

“A nossa preocupação aumenta, porque grande parte do financiamento ao desporto provém indiretamente dos jogos sociais e online. Se a instituição passa graves problemas financeiros, temo pelo que pode ser o apoio às federações através do IPDJ no próximo ano, uma vez que a receita deste organismo também provém dos jogos sociais da SCML”, completou.

(Notícia atualizada às 12h44 com novas informações)

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Santa Casa está a rever todos os apoios para 2024 para cortar custos

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião