Três juízes do TdC votam vencidos no relatório que arrasa privatização da ANA

  • Ana Petronilho
  • 5 Janeiro 2024

Entre os nove juizes, incluindo o relator, há três que votaram vencidos, sobretudo por causa das receitas da concessão e aeroportuárias. Relator foi responsável por auditorias ao Novobanco e à TAP.

O relatório do Tribunal de Contas que aponta “deficiências graves” na privatização da ANA – Aeroportos de Portugal dividiu os juízes conselheiros na hora da votação, sobretudo na parte que aponta para a falta de controlo do Estado nas receitas da concessão e na recomendação ao Governo para, num prazo de seis meses, deixar de “omitir das contas públicas a receita das taxas aeroportuárias”.

Entre o elenco de nove juízes conselheiros do Tribunal de Contas, incluindo o relator José Manuel Quelhas, que a dia 21 de dezembro de 2023 votaram o relatório, houve três que votaram vencidos e que apresentaram declaração de voto.

É o caso de Ana Margarida Furtado, juíza conselheira desde 2017, que tem responsabilidades na área da despesa e dívida pública e na coordenação do parecer sobre a Conta Geral do Estado. De acordo com o currículo publicado no site do TdC, entre 2012 e 2014, ou seja, durante o Governo de Passos Coelho, Ana Margarida Furtado ocupou funções como subdiretora-geral do Gabinete de Planeamento, Estratégia e Relações Internacionais do Ministério das Finanças.

Na declaração de voto ao relatório, a juíza considera “não existir suficiente fundamentação” para o tribunal concluir que a privatização não garantiu o “reforço da posição competitiva, do crescimento e da eficiência da ANA, em benefício do setor da aviação civil portuguesa, da economia nacional e dos utilizadores e utentes das estruturas aeroportuárias geridas” pela concessionária.

Além disso, Ana Margarida Furtado entende que nas conclusões do relatório, “em prol da completude e equilíbrio” devia constar a referência sobre o mecanismo de partilha de receitas da concessão com o Estado, defendendo que, “por um lado, beneficia a receita pública no horizonte temporal negociado e contratualizado” e “por outro, a sua existência reforça a importância a dar ao respetivo controlo público eficaz”.

Também o juiz Luís Filipe Viana, conselheiro do TdC desde junho de 2021, apresentou declaração de voto considerando que as taxas aeroportuárias são receitas da concessionária não podendo ser consideradas como receitas públicas, tendo em conta que a ANA “está fora do perímetro das administrações públicas”, sendo uma “empresa com controlo acionista privado”. No entanto, o juiz salienta que a “partilha de receitas na concessão com o Estado, são, sem qualquer margem de dúvida, receita pública”.

Luís Filipe Viana tem como área de responsabilidade a Saúde, Segurança Social, Emprego, Formação Profissional, Demografia, Organização e Gestão de Recursos na Administração Pública. Antes de chegar ao TdC, entre 2019 e 2020, esteve no Conselho de Finanças Públicas depois de durante sete anos, entre 2013 e 2019, ter ocupado funções no Ministério das Finanças como subdiretor-geral do Orçamento e como coordenador da Unidade de Implementação da Lei de Enquadramento Orçamental.

Por fim, Maria da Conceição Antunes foi a terceira juíza a votar contra o relatório, ao apontar para a “inexistência” de “fundamentos sobre os quais se sustentam as apreciações” de incumprimento das normas legais necessárias para o processo de privatização, como é o caso da “falta de avaliação prévia” para fixar um valor mínimo para a venda da ANA e que era “legalmente exigível”, com a juíza a defender que as conclusões do tribunal revelam “insuficiente precisão”.

Além disso, Maria da Conceição Antunes, conselheira desde 2017, diz que é feita uma “apreciação de decisões políticas que não cabe ao tribunal apreciar”.

O juiz relator, José Manuel Quelhas, conselheiro desde 2017, já foi responsável por vários relatórios de fiscalização a dossiers quentes. Foi o relator das duas auditorias ao Novobanco que também teceram duras críticas ao Governo e ao Fundo de Resolução por considerar que não foi salvaguardado o interesse público na forma de lidar com a instituição bancária herdeira do BES.

No verão de 2023 foi ouvido pela comissão parlamentar de inquérito à tutela política de gestão da TAP, chamado pelo PCP, por ter sido o responsável pela auditoria à privatização e recompra da TAP, na qual o Tribunal de Contas não apontou irregularidades ao uso dos fundos Airbus por David Neeleman.

Dez anos depois da privatização, sem que o processo tenha sido fiscalizado pelo Tribunal de Contas, foi divulgado esta sexta-feira o relatório que analisa se o processo de privatização da ANA – que decorreu entre 7 de setembro de 2012 e 22 de outubro de 2013 – “salvaguardou o interesse público”. A fiscalização do TdC à venda da ANA ao grupo francês Vinci foi pedida pelo Parlamento em 2018, depois de ter sido aprovado um requerimento do PS.

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