Fed mantém fechada porta das descidas de juros e poderá abrir só em julho

A descida lenta da inflação impede a Fed de descer já os juros. Economistas estimam o primeiro corte em junho, mas está a aumentar o risco de o alívio da política monetária surgir só em julho.

Quando subiu os juros pela 11.ª vez consecutiva, a 26 de julho de 2023, a Reserva Federal dos Estados Unidos (Fed) sugeriu que as taxas deveriam permanecer no nível mais elevado em 23 anos por um período prolongado, de modo a dar tempo para a inflação aliviar de forma sustentável para a meta dos 2%. Esta narrativa, conhecida nos mercados por higher for longer, dominou os mercados durante vários meses.

A tendência descendente da inflação deu confiança à Fed para, no final do ano passado, abrir pela primeira vez a porta a descidas de juros, levando os investidores e economistas a anteciparem múltiplos cortes ao longo de 2024. O início do ciclo de descidas chegou a estar previsto para março, depois passou para maio e agora está a crescer a incerteza se vai acontecer já em junho.

As dúvidas deverão diminuir após a reunião de política monetária da Fed desta quarta-feira. Mas, para já, o risco de os juros só descerem em julho (ou mesmo depois) é bem real, pelo que o custo do dinheiro na economia do mundo pode ficar pelo menos um ano no nível mais elevado desde o início de 2001.

A “culpa” é da inflação, que nos dois primeiros meses deste ano ficou acima do esperado pelos economistas, colocando em causa a narrativa de que o banco central estaria perto de declarar vitória sobre a pressão inflacionista mais forte em 40 anos. O índice de preços do consumidor dos Estados Unidos aumentou 3,1% em janeiro e 3,2% em fevereiro. A inflação subjacente, que exclui alimentos e energia, situa-se em 3,8%, quase o dobro da meta da Fed.

Estes números mostram porque os responsáveis da Fed têm repetido que necessitam de maior confiança sobre a trajetória da inflação antes de avançar com o primeiro corte de juros. Os indicadores de atividade económica ainda robustos e a resiliência notável do mercado de trabalho também dão força à Fed para adotar uma postura cautelosa sem colocar em causa o cenário de abrandamento suave da economia.

A reunião de março, que tinha potencial para ser marcada pela primeira descida de juros, ficará assim para a história como mais uma de manutenção das taxas. É certo que o Comité de Política Monetária da Fed (FOMC, na sigla em inglês) vai deixar as Fed Funds no intervalo de 5,25%-5,5%.

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Quantos cortes em 2024?

Apesar da garantia de que os juros vão ficar estáveis, a reunião desta quarta-feira não deixa por isso de ser muito relevante. A Fed vai atualizar as suas estimativas para a evolução do PIB, desemprego e inflação em 2024 e 2025 e os seus responsáveis divulgam as previsões para a evolução das taxas de juro, que serão fundamentais para guiar o mercado no rumo da política monetária ao longo do resto do ano.

No gráfico conhecido por dot plot que foi atualizado em dezembro, a média das estimativas de todos os responsáveis da Fed apontava para três cortes de juros em 2024. A grande dúvida está agora em saber se os membros do FOMC vão manter este cenário, ou, tendo em conta a persistência da inflação em níveis elevados, vão sinalizar apenas dois cortes este ano.

Investidores e economistas estão divididos. No mercado de futuros, a probabilidade de o primeiro corte de juros surgir em junho é pouco superior a 50% e estão a ser descontados três descidas de 25 pontos base este ano. No início do ano, o mercado chegou a descontar seis cortes de juros em 2024, o que demonstra como as expectativas têm sido ajustadas neste curto espaço de tempo. Se a Fed adotar um discurso cauteloso, é provável um novo ajustamento em baixa.

Nas habituais sondagens realizadas pelas agências Reuters e Bloomberg, o consenso dos economistas aponta para o primeiro corte de juros em junho e mais duas descidas até ao final do ano. Contudo, cada vez mais economistas alertam para o risco de a Fed adiar o início do alívio da política monetária e ser ainda mais lenta do que está previsto.

Na sondagem do Financial Times a economistas da academia o cenário é algo diferente, com dois terços dos inquiridos a apontar para duas ou menos descidas de juros este ano, com a primeira a surgir apenas em julho ou setembro. Depois de junho, ainda sobram quatro reuniões da Fed em 2024: 31 de julho, 18 de setembro, 7 de novembro e 18 de dezembro.

O Goldman Sachs reviu as suas previsões esta semana, reduzindo o número de subidas de juros em 2024 de quatro para três, “devido à trajetória da inflação ligeiramente mais elevada” do que o esperado, “mas pensamos que ainda está num caminho que possibilite a descida de juros em junho”. O banco de investimento espera mais quatro cortes de juros em 2025 e um final em 2026 até uma taxa terminal de 3,25%-3,5%.

A Capital Economics também aguarda o primeiro corte em junho, embora não espere que os responsáveis da Fed assumam um compromisso mais firme com as decisões a adotar nas próximas reuniões, mantendo por isso a expressão de que os juros não descem “até que ganhe maior confiança de que a inflação está a evoluir de forma sustentável em direção aos 2%”.

A média das projeções dos economistas inquiridos pela Bloomberg aponta para que a Fed efetue uma revisão em alta na estimativa de crescimento do PIB este ano, de 1,4% para 1,7%, bem como da inflação, de 2,4% para 2,5%.

“Os dados da atividade económica, mercado de trabalho e inflação permanecem demasiado quentes para que a Fed contemple um corte iminente das taxas de juro”, comentam os economistas do ING, destacando que o “risco de a Fed passar a sinalizar dois cortes de juros é mais elevado do que alterar a projeção para quatro”.

Franck Dixmier, diretor global de investimentos em obrigações da Allianz Global Investors, assinala que “os dados de inflação das próximas semanas serão decisivos para validar as expectativas do mercado, que tendem a adiar um primeiro corte das taxas de juro para a reunião de julho.” Ainda assim, estima “o primeiro corte nas taxas de juro em junho, quando o abrandamento da economia se refletir na descida dos preços”.

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