PRR, saúde e salários da Função Pública marcam arranque da legislatura no Parlamento

A primeira iniciativa do Governo de Luís Montenegro será aprovar uma proposta de lei para desbloquear o pagamento do 5.º cheque dos fundos europeus. PCP apresenta moção de rejeição que será chumbada.

A nova legislatura arranca esta terça-feira com a instalação da Assembleia da República e a eleição de José Pedro Aguiar-Branco como presidente do Parlamento, por proposta da Aliança Democrática (AD), coligação liderada pelo PSD que venceu as legislativas de 10 de março.

PRR, plano de emergência para a saúde, aumentos salariais para a Função Pública, designadamente professores, com o descongelamento da carreira, e forças de segurança, com a atribuição do suplemento de risco, serão os temas quentes que vão marcar o início da atividade legislativa. Há ainda a moção de rejeição do PCP ao programa de Governo, que será chumbada com os 138 votos de toda a direita.

O presidente do PSD, Luís Montenegro, após ter sido indigitado para primeiro-ministro pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no Palácio de Belém, Lisboa, 20 de março de 2024. MIGUEL A. LOPES/LUSAMIGUEL A. LOPES/LUSA

Do lado do novo Governo, chefiado por Luís Montenegro, a prioridade será desbloquear o pagamento dos 3,19 mil milhões de euros relativo ao quinto cheque do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que está relacionado com a reforma da orgânica do Estado, que passa, nomeadamente, pela concentração de ministérios no novo edifício da Caixa Geral de Depósitos (CGD), extinção de dezenas de cargos dirigentes e fusão de vários serviços, com vista a gerar poupanças e ganhos de eficiência.

Num dos primeiros Conselhos de Ministros do novo elenco governativo, Montenegro deverá aprovar diplomas que acelerem o cumprimento das metas e marcos do PRR no que toca à reforma administrativa do Estado. A proposta de lei, que poderá ou não colher os contributos do Executivo de António Costa, terá depois de passar pelo crivo do Parlamento.

Ora, o último Conselho de Ministros da maioria absoluta socialista aprovou, esta segunda-feira, dois projetos de propostas de lei para ajudar o Governo de Montenegro a acelerar a sua execução dos fundos comunitários. Isto, depois das críticas do comentador Luís Marques Mendes, que acusou o Governo de atrasar o PRR, e o posterior desmentido do Executivo demissionário.

Resta saber se o novo primeiro-ministro vai aproveitar o trabalho de casa de António Costa e seguir com o planeado, fazendo apenas alguns ajustes, ou avançar noutra direção, apresentando alterações de fundo.

O certo é que o desbloqueio dos pagamentos do PRR é crucial. No seio da cúpula máxima do PSD há a plena noção da rapidez que será necessária, nos próximos tempos. Não foi por acaso que Luís Montenegro fez o “sacrifício”, como classificou Marcelo Rebelo de Sousa, de ser indigitado como primeiro-ministro de madrugada para poder apresentar-se nessa qualidade num encontro que teve logo a seguir, em Bruxelas, com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

Saúde, professores e forças de segurança

Paralelamente, o Governo de Montenegro vai avançar com o plano de emergência para a saúde, contratualizando com privados, para reduzir as listas de espera para consultas e cirurgias. O descongelamento da carreira dos professores e a valorização das forças de segurança são outras bandeiras, mas o Executivo ainda está a avaliar o que pode avançar por decreto e por proposta de lei, que, neste caso, teria de ser viabilizada pela maioria dos deputados.

Estas matérias também estão no elenco de prioridades do PS. Mas os socialistas não querem revelar já se apresentam ou não com iniciativas, porque estão à espera para ver qual a decisão do Governo de Montenegro em relação a um eventual Orçamento retificativo. Pedro Nuno Santos já avisou que aprova uma revisão orçamental se for para atribuir o subsídio de risco aos polícias e aumentar os salários dos professores, via descongelamento da carreira, e dos profissionais de saúde. Se Montenegro atirar estas medidas para o Orçamento do Estado para 2025, o PS chumba a proposta, ameaçou o líder da oposição.

Mas é ainda incerto se o PSD vai querer avançar com um retificativo, já que terá margem orçamental para implementar algumas das principais medidas do programa. A ideia que tem vindo a ganhar terreno é de que os benefícios reputacionais de uma revisão orçamental são diminutos e que será possível governar com o Orçamento de Costa.

O presidente do Chega, André Ventura, já sinalizou quais seriam as duas primeiras iniciativas legislativas do Chega: a equiparação do suplemento de missão a todas as forças e serviços de segurança, guardas prisionais e forças militares, e uma “reforma de luta contra a corrupção, ampliando largamente a capacidade de o Estado confiscar bens da corrupção e crimes económicos“.

A questão do subsídio das forças de segurança parece ser unânime entre os partidos, ainda que não seja obrigatório que passe pelo Parlamento, a não ser que faça parte de um Orçamento retificativo. Tanto PS como Chega já sinalizaram disponibilidade para viabilizar um retificativo que se foque em áreas onde há entendimentos, como os aumentos para alguns grupos da Função Pública.

Já a Iniciativa Liberal vai avançar com várias propostas legislativas no arranque da sessão legislativa, destacando cinco na área da habitação e da saúde. Na habitação, há um foco na reversão das “medidas lesivas” do pacote Mais Habitação, aprovado pelo Governo de António Costa, nomeadamente as alterações “desproporcionais e persecutórias ao regime do Alojamento Local”, segundo indica o partido no projeto de Lei a que o ECO teve acesso. Querem também revogar o direito de preferência do Estado em transações particulares de imóveis de habitação.

Já na saúde, a IL quer que seja assumido o compromisso de dar médico de família a todos os portugueses, nomeadamente com a contratualização da prestação de cuidados de saúde com os setores social e privado. Além disso, quer também o regresso das parcerias público-privadas na saúde, nos hospitais de Braga, Loures e Vila Franca de Xira.

A par destas propostas, vai avançar também com um pacote com várias medidas de descomplicação e desburocratização do Estado, coordenado por Carlos Guimarães Pinto.

Moção de rejeição e aumento do salário mínimo já em 2024

O Bloco de Esquerda “começará, desde o primeiro dia da legislatura, a cumprir os compromissos que assumiu nas eleições”, revela o partido de Mariana Mortágua em declarações ao ECO. “Isso passa, entre outros temas, pela valorização das carreiras dos trabalhadores do Estado, pelo aumento de rendimentos também no setor privado ou pelo reforço dos instrumentos de combate à pobreza“, indica, sem dar mais detalhes. Nestas áreas, o programa eleitoral dos bloquistas defende que o salário mínimo deve subir, já em 2024, para os 900 euros. De salientar que, este ano, o ordenado mínimo progrediu 60 euros, de 760 para 820 euros.

Entre as medidas de combate à pobreza, o BE propõe ainda “o alargamento do acesso ao Complemento Solidário para Idosos (CSI), elevando o seu valor de referência a ser calculado a partir do valor do limiar da pobreza, com 14 prestações por ano e eliminando a norma que contabiliza os rendimentos dos filhos e das filhas para acesso a esta prestação social”, lê-se no programa. Os primeiros projetos do BE serão anunciados esta terça-feira.

Nos primeiros dias de Parlamento, o PCP vai avançar com uma moção de rejeição ao programa de Governo de PSD/CDS que será chumbada com os 138 votos da da maioria de direita (80 da AD, 50 do Chega, e 8 da IL). Para ser aprovada, a iniciativa precisa de, pelo menos, 116 votos, isto é, de uma maioria absoluta em efetividade de funções.

Para além disso, o partido liderado por Paulo Raimundo vai propor iniciativas que visam “o aumento geral dos salários, incluindo do salário mínimo nacional para mil euros em 2024; o aumento extraordinário das reformas e pensões; a valorização e a garantia de condições de trabalho dos profissionais de saúde, bem como o reforço do SNS; a contabilização de todo o tempo de serviço dos professores; o controlo e fixação de preços de bens e serviços essenciais; a defesa do direito à habitação; o combate às privatizações, à corrupção e às injustiças; a defesa do cumprimento da Constituição da República Portuguesa”, indicou ao ECO a deputada do PCP, Paula Santos.

No que diz respeito ao descongelamento da carreira dos professores, poderá haver acolhimento tanto por parte do PSD/CDS como do PS, para além de BE, Livre e PAN. Esta será uma das matérias que deverá reunir maior consenso parlamentar.

O PAN vai avançar com iniciativas na área fiscal, sistema eleitoral, proteção animal, direitos das mulheres e ambiente. Segundo fonte oficial do partido, entre as primeiras iniciativas encontra-se “um programa de emergência fiscal, para proteger os rendimentos das famílias e devolver-lhes a receita fiscal gerada pela inflação”, onde se inclui uma “revisão intercalar de escalões de IRS; a reintrodução do IVA Zero até 31 de dezembro de 2024; o alargamento da duração do IRS Jovem por mais dois anos; a criação de um regime especial de isenção contributiva para os trabalhadores-estudantes e a redução para 6% do IVA dos cuidados médico-veterinários e da ração dos animais de companhia”.

Já para o sistema eleitoral há propostas para a “criação de um círculo nacional de compensação e a alteração dos círculos eleitorais, para garantir uma maior representação de todos os distritos, incluindo do interior e dos círculos da emigração”. Em matéria ambiental, vão propor “promover a criação de um Tratado do Mar e assegurar o cumprimento e regulamentação da Lei do Clima, garantindo a aprovação de uma moratória que impeça a mineração em mar profundo e a instalação e entrada em funções do Conselho para a Ação Climática”.

O Livre não respondeu às questões colocadas pelo ECO até ao fecho da edição deste artigo.

Lobby e revisão constitucional ficaram pendentes

Além das iniciativas que os partidos vão dar prioridade, existem também alguns dossiês que não ficaram fechados na última legislatura. É o caso da lei do lobby. Tudo indicava que iria avançar antes da dissolução, já que a Assembleia da República aprovou na generalidade os projetos de lei do PS, PSD, IL e PAN para regulamentar o lobbying, mas tal acabou por não se concretizar na especialidade já que o PSD pediu um adiamento e já não restava tempo antes da dissolução.

Esta lei previa a criação de um registo de transparência da representação de interesses junto do Parlamento e há vários partidos que voltaram a inscrever esta intenção nos programas.

Há ainda a revisão constitucional, para a qual tinha sido criada uma Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, em dezembro de 2022. “Foram apresentados 8 Projetos de Revisão Constitucional que no seu conjunto compreendem 393 propostas de alteração, revogação e aditamento de artigos da Constituição”, como indica um relatório do Parlamento.

No entanto, é de salientar que Bloco e PCP acordaram travar o processo de revisão constitucional, segundo sinalizaram após uma reunião esta segunda-feira. A revisão constitucional exige a aprovação por dois terços dos deputados.

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