Operação “artificial” para baixar dívida? Medina critica “erro muito grave da equipa da UTAO”

Ex-ministro das Finanças reitera ainda que não foi dada nenhuma orientação política para que houvesse uma utilização de fundos adicionais da Segurança Social na compra da dívida pública.

Fernando Medina, ex-ministro das Finanças, lança duras críticas à equipa da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), acusando o organismo de fazer um “erro muito grave” ao reiterar que o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social tinha, no final de 2023, uma percentagem maior de dívida pública do que tinha em 2022. Quanto à aplicação dos fundos das empresas públicas em dívida pública, Medina defende que é uma estratégia positiva que espera que o atual Governo continue. E aplaude a decisão de não aprovar o aumento de capital da Águas de Portugal.

Respondendo às questões sobre o relatório da UTAO, aponta que o organismo “tem acesso aos dados do FEFSS: no dia 31 de dezembro de 2022, o FEFSS detinha 54% do fundo aplicado em títulos de dívida, no dia 31 de dezembro de 2023, a parte da carteira aplicada em dúvida era 54,55%, quase exatamente o mesmo valor e muito perto do valor mínimo determinado por portaria assinada por um ministro do CDS“, na audição na Comissão de Orçamento e Finanças e Administração Pública sobre a “operação especial” para baixar a dívida pública, que surgiu de um requerimento do CDS.

Em causa está o relatório da UTAO que indicou que a redução da dívida pública no final do ano passado tinha sido “artificial”, alertando que “a obrigação de servir a dívida detida por entidades públicas permanece para os contribuintes”.

O antigo ministro assegura, no entanto, que “não houve nenhuma orientação política, não houve nenhum despacho” para para que houvesse uma utilização de fundos adicionais da Segurança Social na compra da dívida pública.

Além disso, defendeu também que os valores nominais que o FEFSS detém aumentaram devido às “leis que o Parlamento aprova”. “A Lei de Bases da Segurança Social determina que todos os excedentes do sistema previdencial sejam canalizados para o FEFSS”, diz, pelo que “é falsa a afirmação que consta do documento da UTAO de que houve qualquer orientação política no recurso dos fundos”.

Reitera ainda que a justificação da UTAO para dizer que existiu uma orientação política é “absurda”, apontando que o Decreto-Lei de execução orçamental (DLEO) foi aprovado no dia 29 de janeiro e a dívida pública é aferida no dia 31 de dezembro de 2023″, pelo que “a norma constante do DLEO tem aplicação nula relativamente à dívida de 2023”. “Quem escreveu isto é de uma profunda ignorância”, atira.

Quanto à aplicação de fundos das empresas públicas na dívida pública – depois de ser noticiado que tal tinha acontecido nas Águas de Portugal, Nav e Casa da Moeda – Medina defende esta prática como positiva. “É um aspeto positivo do aprofundamento da gestão do IGCP”, defendeu o ex-ministro, sendo que “o que estava previsto este ano e estava no plano de atividades era fazer-se aplicação progressivamente maior em títulos de dívida pública, porque esses fundos estavam disponíveis dentro do Estado”.

A vantagem desta estratégia, argumenta, é que “o pagamento de juros que o Estado faz é a entidades dentro do setor Estado”. Desta forma, Medina diz esperar que o Governo em funções “continue” esta política. “Seria incompreensível que tivéssemos aqui no final do ano uma audição a questionar porque se reduziu aplicação das entidades públicas em títulos da dívida portuguesa, seria um péssimo sinal”.

Medina solicitou pagamento extraordinário de 130 milhões de euros de dividendos

Ainda dentro da questão das empresas públicas, Medina explica que “o que o Estado fez durante o ano foi proceder a injeções de capital perto de 3 mil milhões de euros a empresas publicas (2.965,4 mil milhões de euros) e solicitou às empresas o pagamento extraordinário de 130 milhões de euros de dividendos“, dos quais 100 milhões às Águas de Portugal, 20 milhões à Nav e 10 milhões a Casa da Moeda.

Para tal, existiram critérios, sendo que “o pagamento dos dividendos não poderia colocar em causa indicadores: rácio de endividamento não fosse superior a 4 vezes, rácio de liquidez geral não fosse inferior a 0,9 e capital próprio não fosse inferior a metade do capital social”.

O antigo governante assegura ainda que não houve outras entidades com pagamentos extraordinários, além das três mencionadas e da Caixa Geral de Depósitos (cujo dividendo extraordinário foi o edifício da sede).

No caso específico das Águas de Portugal (AdP) e o aumento de capital, Medina questiona “precisavam as Águas de ter estes recursos a mais ou não? Precisavam para que fim?” “A verdade é que a decisão que eu tomei é que não só estes recursos não eram necessários, como as AdP mantêm o rácio de endividamento de 4 vezes o EBIDTA, como tem situação financeira confortável, como não está aprovado pelo Ministério das Finanças nenhum plano de investimentos”.

“A opção que o atual Governo tomou sobre as AdP de não aprovar nenhum aumento de capital é a decisão correta, foi a decisão que tomei, não há justificação para a necessidade da empresa ter aumento de capital”, reitera Medina. “Era absurdo reduzir em dezembro e aumentar em janeiro”, acrescenta.

Paulo Núncio avançou, entretanto na audição, que vai entregar um requerimento para ter acesso aos documentos e troca de correspondência entre o Governo, a Parpública e as três empresas públicas que entregaram dividendos ao Estado.

Medina critica Governo pelo “dano” que está a fazer ao país

O ex-ministro acusa o Governo de estar a causar “dano” ao país com as afirmações e alegações relativamente à sustentabilidade das finanças públicas, defendendo que as motivações são políticas.

Para Medina, ficou clara a “motivação de quem pediu” esta audição – o CDS, partido que apoia o Governo – reiterando que “tudo se trata de uma operação de natureza política com o objetivo de diminuir as conquistas que o país teve, atacando o Governo anterior, nem que para isso tenham que prejudicar o país”.

“É claro o que têm feito desde que tomaram posse…estão a fazer sem olhar ao dano que estão a causar ao país”, acusa o atual deputado socialista. O ex-ministro comparou este episódio a um conto de Sherlock Holmes, em que no final “não havia morto”, e se chegou à conclusão quem esteve a olhar para os contornos do caso foi o “fiel escudeiro” dr. Watson, que não primava pela inteligência.

Acrescenta ainda que é “com algum constrangimento” que viu “as notícias que saíram do Eurogrupo e perplexidade com que alguns dos colegas assistiram ao que assistiram”, numa referência à reunião desta semana onde Joaquim Miranda Sarmento se estreou e onde os responsáveis da Comissão Europeia se mostraram confiantes nas finanças públicas portuguesas.

(Notícia atualizada pela última vez às 17h30)

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