Investimento no Serviço Nacional de Saúde permitiu retorno de 6,6 mil milhões para a economia em 2023
Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), avaliou o impacto da poupança por via dos salários e a relação entre produtividade e remuneração.
O investimento no Serviço Nacional de Saúde em 2023 permitiu um retorno de 6,6 mil milhões de euros, um valor inferior em 1,2 mil milhões de euros ao atingido no ano anterior, conclui um estudo que será hoje divulgado.
Segundo os dados do Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), quase metade dos portugueses (48%) faltou pelo menos um dia ao trabalho em 2023 por motivos de saúde e 6% faltaram mais de 20 dias. Contudo, a prestação de cuidados de saúde pelo SNS permitiu evitar uma ausência laboral de dois dias, representando uma poupança de mil milhões de euros.
Os cuidados prestados no SNS permitiram ainda evitar 7,1 dias de trabalho perdidos em produtividade, resultando numa poupança de 3,4 mil milhões de euros.
No total, somando o impacto no absentismo e na produtividade, o SNS permitiu uma poupança global de 4,4 mil milhões de euros por via dos salários.
Considerando o impacto da poupança por via dos salários e a relação entre produtividade/remuneração (valores referência do INE), o estudo conclui que os cuidados prestados pelo SNS permitiram um retorno para a economia de 6,6 mil milhões de euros.
Em declarações à Lusa, o coordenador do estudo, Pedro Simões Coelho, destacou a “alteração de padrão” relativamente ao impacto do SNS no absentismo, que passou a ser idêntico ao que era antes da pandemia de Covid-19.
“Subiu o impacto do SNS no absentismo e reduziu-se a perda de produtividade”, destacou o responsável, justificando: “nos anos imediatamente a seguir à Covid, como se implementou muito a estratégia do teletrabalho, as pessoas com certo tipo de doenças acabavam por não faltar ao trabalho porque estavam em casa e, portanto, continuavam a trabalhar. Tinham era perdas de produtividade”.
No ano de 2023 – acrescentou – “continua a existir teletrabalho, mas já se voltou um bocado para os escritórios e para a estratégia que tínhamos antes da Covid e, nesse sentido, é normal que estejamos num período de adaptação do impacto do SNS”.
Por isso, “não daria tanta importância [ao valor do retorno para a economia] tendo em conta este ajustamento”, disse o responsável, explicando: “estamos numa fase em que está a aumentar o impacto do SNS para reduzir o absentismo e a baixar o impacto do SNS na redução da produtividade”.
Questionado sobre o Plano de Emergência e Transição da Saúde, apresentado na semana passada pelo Governo, Pedro Simões Coelho disse que o documento tem “um conjunto de estratégias que correspondem exatamente àquilo que são as principais prioridades” do SNS, distinguindo medidas urgentes, prioritárias e de médio-longo prazo.
“Agora temos de analisar a sua operacionalização, mas saúdo como positiva a implementação das USF [Unidades de Saúde Familiares] modelo C”, disse o responsável, referindo-se às unidades que podem ser geridas pelos setores social e privado e até por cooperativas de médicos.
Sublinhando que o problema do SNS “não é de qualidade dos profissionais, mas de organização”, disse que a única forma de ajudar a resolver o problema é “dotar as unidades saúde de maior flexibilidade e autonomia, criando condições para premiar a produtividade e a excelência do trabalho dessas unidade e dos profissionais”.
O Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela NOVA-IMS em colaboração com a AbbVie, avalia não só a evolução da sustentabilidade do SNS, mas também o SNS do ponto de vista do utilizador.
Identifica pontos fracos e fortes, bem como possíveis áreas prioritárias de atuação, além de procurar compreender os contributos económicos e não económicos. Este ano, pela primeira vez, apresenta dados referentes à posição dos portugueses quanto aos ensaios clínicos.
Os resultados serão apresentados esta terça-feira no Centro Cultural de Belém (Lisboa), numa iniciativa que deverá contar com a presença da ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Sustentabilidade do SNS ao nível mais baixo da última década
Ainda segundo o mesmo estudo, a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde atingiu o nível mais baixo da última década, uma queda explicada pelo aumento da despesa, que não foi acompanhada por igual aumento da atividade.
O Índice de Saúde Sustentável, desenvolvido pela NOVA Information Management School (NOVA-IMS), indica que o valor (84,8 pontos) sofreu no ano passado a maior queda (menos sete pontos), com exceção do ano 2020, em que a sustentabilidade se ficou nos 83,9 pontos. No entanto, sem o efeito da pandemia, poderia ter alcançado o valor mais alto de sempre (103,6 pontos).
Em declarações à Lusa, o coordenador do estudo, Pedro Simões Coelho, lembrou que este valor “tem vindo a baixar sistematicamente”, o que significa que, “ao longo destes anos, tem custado mais tratar um doente no SNS [Serviço Nacional de Saúde]”.
“Quando nós dizemos que a nossa visão do SNS sustentável é um SNS que é produtivo, isto é, que consegue desenvolver a sua atividade com um custo razoável, que oferece serviços de qualidade e que tem acessibilidade, permitindo dar resposta às necessidades dos cidadãos, temos três vetores a contribuir para a sustentabilidade: a produtividade (…), a qualidade e a acessibilidade”, explicou.
Os dados justificam a queda na sustentabilidade do SNS com o aumento da despesa (7%), que não foi acompanhado por igual aumento da atividade (1,3%), resultando globalmente numa queda da produtividade.
Se caiu a produtividade, se a qualidade está estabilizada e se a acessibilidade teve também uma tendência de descida, era inevitável que o índice de sustentabilidade caísse de forma significativa.
A produtividade tem vindo a cair ao longo dos anos, registando em 2023 o valor mais baixo da última década. A “acessibilidade técnica e percecionada”, que avalia o acesso aos cuidados de saúde, também caíram em relação ao ano de 2022, o que é considerado “uma das maiores fragilidades do SNS”.
“O SNS (…) não consegue dar resposta à procura no tempo que devia e não consegue fazer crescer a sua atividade ao ritmo a que está a crescer a despesa”, lembra o coordenador do estudo, que ressalva que o contexto atual é de uma população “muito mais envelhecida e com uma esperança de vida maior, com muito menos mortalidade numa série de doenças”.
“Isto faz com que existam muito mais doentes crónicos, que são caros, e por isso é normal que um SNS que foi desenhado num contexto social completamente diferente, sem alterações organizativas, tenha dificuldade em dar resposta à dinâmica demográfica da sociedade atual”, concluiu.
Os dados indicam que a acessibilidade técnica caiu 1,9 pontos, apresentando um dos valores mais baixos do índice. Este item considera valores como as primeiras consultas em tempo adequado, inscritos em lista espera, episódios de urgência atendidos em tempo previsto e utilização da capacidade disponível de hospitalização domiciliária.
“A fotografia é inevitável: se caiu a produtividade, se a qualidade está estabilizada e se a acessibilidade teve também uma tendência de descida, era inevitável que o índice de sustentabilidade caísse de forma significativa”, concluiu Pedro Simões Coelho.
Olhando para as restantes dimensões que compõem o índice de sustentabilidade, na ótica dos utentes, a qualidade percecionada relativamente aos serviços (72,4 pontos) é superior ao acesso (64,3 pontos). Já a qualidade técnica, que em anos anteriores tinha registado uma evolução positiva, caiu para 66,5 pontos.
Como ponto positivo aparece a redução de 23% da dívida vencida, mantendo a tendência de anos anteriores. Os dados recolhidos registam ainda um decréscimo do défice (-59%). “O stock da dívida vencida tem vindo a diminuir ao longo dos últimos anos e isso é muito importante. Aliás, se não fosse esse facto, a queda do índice ainda era mais significativa”, disse Simões Coelho.
Na ótica do utente, a eficácia do SNS tem impacto no seu estado de saúde (79,3 pontos) e na qualidade de vida (78,8 pontos). Contudo, os utentes consideram a eficácia dos medicamentos superior à dos cuidados de saúde recebidos.
28% participava “sem hesitar” em ensaios clínicos
A maioria dos portugueses (79%) admite já ter ouvido falar de ensaios clínicos, dois em cada três têm opinião positiva sobre eles, mas apenas 28% participariam sem hesitação, conclui ainda o estudo desenvolvido pela Nova Information Management School (Nova IMS), que este ano recolheu, pela primeira vez, a opinião dos portugueses sobre os ensaios clínicos, nos quais 28% dizem que participariam sem hesitar e metade respondeu que “talvez” participasse.
“Isso também resulta do facto de só 36% das pessoas é que dizem que têm um bom conhecimento sobre o que são os ensaios clínicos. Naturalmente, essa falta de conhecimento também induz a alguma incerteza”, explicou à Lusa Pedro Simões Coelho, coordenador do estudo.
O especialista ressalva que Portugal “não é um país que tenha tido historicamente um grande desempenho em termos de ensaios clínicos” e, por isso, “há um certo défice de conhecimento”.
“O que nós vemos é uma predisposição positiva da população, porque, de facto, quase 80% [50,5% responderam talvez], em princípio, estaria disponível para participar e os 28% que dizem que sim, sem hesitação, estarão muito próximos dos que dizem também ter um bom conhecimento sobre ensaios clínicos”, explicou o responsável.
Os dados recolhidos indicam que o estado de saúde é o fator que mais influenciaria esta decisão. Os inquiridos disseram ainda que a internet (60,3%) seria a primeira fonte de informação a que recorreriam para saber mais sobre ensaios clínicos.
A decisão de participar ou não está principalmente relacionada com o estado de saúde (68,6%), com os riscos associados ao ensaio (56,5%) ou com uma eventual recomendação do médico assistente (47,1%).
Os riscos e benefícios e os potenciais efeitos secundários são considerados pelos inquiridos como as informações mais relevantes a que gostariam de ter acesso antes de decidir participar num ensaio clínico.
Quase um em cada quatro (23%) considera que os riscos são maiores do que os benefícios e um em cada três (33%) dizem que são idênticos.
Sobre as medidas para aumentar a confiança nos ensaios clínicos, apontam a divulgação de resultados de ensaios anteriores, as garantias de segurança e ética, o apoio pós-ensaio, a formação aos profissionais de saúde e a sensibilização pública.
“De facto, há uma perceção muito positiva da sociedade sobre a importância dos ensaios clínicos, sobre os seus benefícios e é um tema que deve interessar muito o país. (…) Há aqui uma grande oportunidade para um país da dimensão do nosso que importaria aproveitar”, considerou o coordenador do estudo.
A maioria dos portugueses revela confiança nas informações disponibilizadas pelos investigadores que conduzem os ensaios aclínicos e no processo de regulação que os supervisiona.
De acordo com um inquérito realizado pela APIFARMA – Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica às empresas suas associadas, os ensaios clínicos trouxeram para Portugal um investimento direto de 231,6 milhões de euros entre 2019 e 2022.
Os dados deste inquérito indicam ainda que se estima que nos últimos quatro anos as empresas tenham deixado de realizar 210 ensaios clínicos em Portugal, o que representa uma perda direta para o país estimada em 33 milhões de euros.
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